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JANIO DE FREITAS
Efeito do poder
À idéia de que o poder corrompe, parece preferível a
conclusão de que o poder cega,
ensurdece e, portanto, emburrece. O corrupto já chega pronto
ao poder. O mal que o poder faz
à inteligência e à sensibilidade
pode ser observado como uma
espécie de trilha da história, que
as exceções não chegam a desviar.
Essa observação vem a propósito do fuzilamento, em Cuba,
dos três sequestradores de uma
embarcação de passageiros. Talvez com exceção do Canadá, em
todos os países das Américas o
fuzilamento é praticado, mas,
em tempos de paz, só dois o autorizam nas leis, para determinados casos: Cuba e Estados Unidos.
Em nenhum dos dois se encontram justificativas lúcidas para
a permanência da punição medieval, apenas adaptada sua
monstruosidade aos recursos
contemporâneos mais práticos.
Nos Estados Unidos, a punição
legal por morte confunde-se com
a própria história nacional. No
caso de Cuba, a história heróica
da derrubada da ditadura e da
expulsão do capital mafioso tem
um lapso costumeiro: omite a
prática do fuzilamento, pelos rebeldes de Fidel Castro, para punir a delação às tropas ditatoriais, por camponeses, da localização de guerrilheiros. Isso se
deu com a coluna de Guevara.
De então para cá, a punição
por fuzilamento ficou inscrita
doutrina do regime comunista.
Mas o tempo e a ação da CIA em
Cuba, persistente até hoje, não
tornaram a pena de morte justificável. Nem a fizeram produzir
algum resultado positivo para o
governo ou para o país. Tornou-se ferocidade cada vez mais pura. E, no poder, nem a inteligência incomum de Fidel Castro é
capaz de vê-la como é. Os três sequestradores não chegaram aos
Estados Unidos, mas o repúdio
internacional ao fuzilamento
bárbaro lhes deu a vitória sobre
o governo cubano.
Pela tortura
Do governador Geraldo Alckmin não era esperada uma saída própria dos cínicos. Defender
a nomeação, para alto cargo no
seu governo, de um notório torturador dos piores tempos da ditadura, acusado até de mortes,
já seria injustificável. Mas fazê-lo com a alegação de que "ele
não foi punido" é não se dar ao
mínimo respeito. Alckmin sabe
que o tira Aparecido Laertes Calandra, vulgo capitão Ubirajara,
não escapou à punição por ser
inocente dos crimes de que foi e
é acusado, mas justamente por
não o ser -ou não seria, como
diz Alckmin, anistiado.
Lúcido e honesto seria admitir
a impropriedade da nomeação,
talvez justificável pelo desconhecimento de quem é de fato o nomeado, e entregar o cargo público a um funcionário respeitável.
Mas Alckmin prefere mostrar-se
imbuído do poder e seus efeitos.
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