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JANIO DE FREITAS
Fatos sequestrados
Além dos aspectos judiciais
e morais postos em discussão,
o indulto dos sequestradores
de Abílio Diniz, sob o mau
disfarce de extradição por
Fernando Henrique Cardoso,
vem a ser um componente a
mais no mistério que ainda
envolve esse crime e seus autores.
Foi aceita com facilidade
pela polícia, e logo assimilada
pelo jornalismo, a versão de
que os sequestradores pretendiam destinar o resgate, fixado de início em R$ 30 milhões,
para financiamento de organizações rebeldes na América
Central. Não houve prova
nesse ou em outro sentido,
nem é certo que alguma fosse
procurada mesmo. Anos depois do sequestro, foi achada,
em um remoto centro-americano, uma lista com nomes de
sequestráveis, entre os quais o
de Diniz. O que nada provou.
Nem foi preciso provar, no
entanto, que o sequestro foi
feito na hora mesma da votação entre um candidato que
se apresentava como nacionalista, defensor das causas populares, proponente da distribuição da renda e da adoção
de controles sobre a manipulação da economia por capitais estrangeiros, e seu adversário, um arrivista que se
apresentava como reformador, porém fartamente financiado pela riqueza mais conservadora.
Que inimagináveis razões
táticas levariam um grupo revolucionário a criar, precisamente no momento mais delicado para o candidato à esquerda, a comoção temerosa
contra tudo identificável com
esquerda? A generosidade revolucionária dos sequestradores não incluiu a bondade de
explicar aquela esquisitice.
Não é o caso, a esta altura,
de esmiuçar as circunstâncias
em que o sequestro de repente
fracassou, em hora tão oportuna para os desdobramentos
eleitorais que ali mesmo começaram logo. Dessas circunstâncias é bastante lembrar que vários sequestradores vestiam, ao serem presos e
fotografados, camisetas com
propaganda eleitoral de Lula.
Um prestimoso delegado
propagou prontamente que o
sequestro estava ligado à candidatura de Lula, enquanto
Collor reforçava a matéria-prima dos meios de comunicação com um tal plano de
Lula contra os possuidores de
apartamento próprio. Logo
depois, a votação.
Os grandes empresários foram a força propulsora de
Collor. Mas não estiveram sozinhos nessa tarefa. A participação de fatores estrangeiros
em eleições e em outros momentos decisivos na América
Latina está torrencialmente
documentada. Inclusive, é
claro, a participação no Brasil. E não só em golpes militares, mas em eleições mesmo,
como se acabou descobrindo
que aconteceu na campanha
de Fernando Henrique, agraciada pela ação de um emissário de Bill Clinton.
O que estava por trás daquele sequestro continua sendo
interrogação irrespondida. A
versão vigente não merece o
menor crédito. Há muito mais
motivos para acreditar que o
empresário Abílio Diniz foi
forçado a dar, sem ao menos
saber que o fazia, uma contribuição muito além, e sofrida,
da que deram seus pares para
derrotar Lula e eleger Collor.
Também não se sabe por
que Collor, tão logo eleito, foi
a uma brevíssima "conversa
social" com George Bush, que
presidia os Estados Unidos.
"Conversa social", como os
americanos disseram na época, pode ser um bom nome,
por exemplo, para uma visita
de agradecimento. Se foi isso,
a visita teve alguma finalidade, porque de outra não se
soube antes ou depois.
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