São Paulo, quinta, 16 de abril de 1998

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CELSO PINTO
Brasil continua vulnerável

O Brasil ainda está vulnerável a um choque externo, porque os passivos financeiros que podem deixar o país a curto prazo, em torno de US$ 160 bilhões, são muito maiores do que o nível recorde de reservas de US$ 70 bilhões.
O cálculo foi feito pelo economista Daniel Dantas, diretor do Banco Opportunity e interlocutor privilegiado de alguns líderes do PFL. Ele foi um dos conferencistas, ontem, do "World Economy Laboratory", organizado pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), como um evento restrito e paralelo à reunião do FMI e do Banco Mundial em Washington.
Entre os conferencistas estavam o chefe do Conselho de Assessores Econômicos do governo americano, Jeffrey Frankel, o diretor-gerente adjunto do FMI, Stanley Fischer, o presidente do Banco Central de Israel, Jacob Frenkel, e o vice-presidente do banco central russo, Sergey Alexashenko.
O argumento central de Dantas é que o Brasil tem boas perspectivas a médio e longo prazos, mas está sujeito a vulnerabilidades a curto prazo. Pelo caráter de curto prazo do capital financeiro absorvido pelo Brasil nos últimos anos, através dos enormes déficits em conta corrente e da acumulação de reservas.
Esses são dólares que entraram no país e continuam aqui. Ou seja, é um dinheiro que vem sendo remunerado pelas altas taxas de juros internas. Um dólar que tivesse sido convertido em reais no primeiro dia do Plano Real hoje teria acumulado uma remuneração de 272%, devido às altas taxas de juros.
Somando os dólares que entraram e aplicando a taxa de remuneração interna, chega-se, grosso modo, aos US$ 160 bilhões. Frente a esse número, os US$ 70 bilhões de reservas são pequenos. É claro que, se todo esse capital quiser sair do país, isso acabará provocando um racionamento, de alguma forma, na oferta de dólares, observa Dantas.
Por esta razão, embora um alto nível de reservas faça uma boa "impressão psicológica", não é antídoto para uma crise. O que não quer dizer, enfatiza Dantas, que ele esteja prevendo que uma crise é inevitável.
Seu ponto é que existe uma vulnerabilidade externa financeira, diferente e mais complicada do que a questão da valorização cambial. Na verdade, mesmo que o Brasil deixasse flutuar o câmbio, diz ele, não estaria seguro contra uma instabilidade gerada por capitais de curto prazo.
Ao mesmo tempo, contudo, ele acha que esse é um risco transitório e que poderia ser eliminado com a combinação de um ajuste fiscal mais agressivo e uma privatização mais rápida. Há chances de isso acontecer num eventual segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso?
Dantas está convencido de que o presidente está consciente do risco e vai tentar minimizá-lo, ainda que, por uma questão de estilo, tenda a operar de forma cautelosa. Ele confia que a reforma fiscal será feita no segundo mandato, assim como uma flexibilização do mercado de trabalho. A privatização deve ser aprofundada e persistirá a melhora institucional em várias áreas.
Ele acha também que tem havido uma melhora microeconômica, que tem tido pouca atenção, mas que é crucial. As empresas têm sido empurradas a fazer uma "revolução" na administração, ou diretamente, ou transferindo o controle para capitais externos.
A transição exige dois anos e ele acha que é possível ser bem sucedida, via aumento da produtividade da economia e implementação das reformas. O problema é atravessar o curto prazo.
O que mais o preocupa é a possibilidade de uma queda na Bolsa americana. "Poderia reinventar o medo no mercado, levar a uma cautela geral", disse. Numa situação desse tipo, o governo teria de operar corretamente em várias áreas ao mesmo tempo e governos não são bons nesse tipo de operação.
Outro risco que ele vê deriva do sistema político brasileiro, em que o presidente concentra muito poder. Ele não tem dúvidas de que o presidente deve ser reeleito, mas essa característica embute um certo risco futuro. Sobre o qual, contudo, não há nada a fazer.




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