São Paulo, sábado, 16 de julho de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ ANO BRASILEIRO

Presidente da França diz a jornalistas que não é habitual falar sobre problemas internos durante uma reunião internacional

Chirac protege Lula de pergunta sobre crise

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A PARIS

O presidente francês Jacques Chirac estendeu o carinho com que recebeu seu colega brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva ao "point de presse" (o jargão francês para breve contato com os jornalistas) que os dois mantiveram ontem no início da tarde, ao evitar que o presidente brasileiro respondesse a uma pergunta sobre a crise política no Brasil.
A pergunta buscava uma "reflexão" dos dois governantes sobre o mau momento que ambos vivem. Chirac, pela derrota do "sim" no recente referendo sobre a Constituição européia, reflexo de sua baixa popularidade. Lula, pelos motivos arqui-conhecidos por todos no Brasil. Mas Chirac, entre irritado e mordaz, disse que notava como o tema das relações Brasil/França "eletrizava" os jornalistas e despachou a pergunta:
"Não tenho o hábito, e creio que o presidente Lula também não, de comentar problemas políticos internos quando de uma reunião internacional".
Não é bem verdade: em todas as cúpulas da União Européia e do G8 (os sete países mais ricos do mundo e a Rússia), Chirac e os demais mandatários comentam, sim, assuntos internos, em meio às discussões internacionais.
Mas Lula aproveitou a deixa para também descartar a pergunta. "O presidente Chirac tem razão", disse ele. "Penso que os três dias que passamos aqui foram demasiadamente fortes para que vocês tenham perguntas a fazer sobre a relação Brasil-França. Os problemas do Brasil, tratarei com muito prazer quando chegar ao Brasil".
O "point de presse" foi o único momento, nos três dias da viagem à França, em que os jornalistas teriam a chance de fazer perguntas sobre a crise que monopoliza a atenção no Brasil, já que Lula, em nenhum outro momento, conversou com os repórteres.
O único membro da comitiva que concordou em tratar desse assunto foi o ministro demissionário da Educação e novo presidente do PT, Tarso Genro.
Ontem, Tarso aproveitou para criticar duramente a afirmação do líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio, que em discurso anteontem disse que "o presidente Lula ou é idiota ou é corrupto".
Enquanto Lula subia em um banquinho para ver o interior de uma réplica do 14-Bis, o primeiro avião a voar no mundo (1906), projetado pelo brasileiro Santos Dumont, no Museu do Ar e do Espaço, Tarso atacava a declaração de Virgílio como "irresponsável e inaceitável". Deu até um conselho ao senador tucano: "As pessoas maduras e inteligentes põem a cabeça no freezer antes de fazer esse tipo de declaração".
Mesmo duro, o novo presidente petista conseguiu ser conciliador, ao dizer que tinha a certeza de que o líder tucano no Senado "vai revisar a sua afirmação, que atinge um homem honrado como o presidente da República, que tem se portado com muito respeito pela oposição". Genro acha que esse tipo de declaração prejudica mais a própria oposição que o governo. "Ela é que se desgasta."
Sobre as informações de que líderes do PT ou pessoas próximas a eles foram detectadas no Banco Rural, em Brasília (em um levantamento do deputado do PFL fluminense Rodrigo Maia), a famosa agência em que o empresário Marcos Valério sacava dinheiro em abundantes quantias, Tarso limitou-se ao que parece ser a frase padrão do PT doravante:
"Defendo a apuração de todas as denúncias, seja quem for a pessoa denunciada, seja qual for o partido, seja qual for o motivo da eventual irregularidade".

Relato aos socialistas
Antes, a crise brasileira já havia sido discutida entre Lula, parte de sua comitiva e o secretário-geral do Partido Socialista (PS) francês, François Hollande, que os visitou na Residence Marigny, a casa de hóspedes do governo da França.
Lula fez ao líder socialista um relato sobre a situação, que o seu assessor para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, definiu como "jornalístico". Ou seja, puramente factual, sem maiores comentários.
Hollande não se mostrou particularmente espantado, até porque o PS da França teve problemas de irregularidades vinculadas a financiamento eleitoral.
Ele lembrou que um de seus antecessores, Henri Emmanueli, chegou a ser declarado inelegível por dois anos, como conseqüência desse tipo de irregularidade.
Lula, ao menos na reconstituição de Garcia, é que foi menos condescendente, ao dizer que o PT já estava tomando as devidas providências e que elas têm mesmo que ser tomadas.
Pelo menos na versão de diferentes auxiliares de Lula, a crise brasileira só surgiu, nas reuniões mantidas na França, durante a conversa com o socialista Hollande, assim mesmo por iniciativa do próprio presidente.


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