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QUESTÃO AGRÁRIA
Polícia mineira se desloca para a área após os sem-terra deixarem a porteira da propriedade dos filhos de FHC
PM inicia treinamentos perto da fazenda
WILLIAM FRANÇA
SOLANO NASCIMENTO
ENVIADOS ESPECIAIS A BURITIS
Um dia depois de os sem-terra
terem deixado a porteira da fazenda dos filhos do presidente
Fernando Henrique Cardoso, em
Buritis, a Polícia Militar de Minas
Gerais começou a montar o teatro
de operações que será usado para
"o treinamento" dos policiais
-conforme anúncio do governador do Estado, Itamar Franco
(sem partido). A área fica a 6 km
da fazenda Córrego da Ponte.
Os sem-terra, no entanto, estão
em Serra Bonita, que fica 16 quilômetros depois da propriedade da
família do presidente. Ou seja, o
governo mineiro deslocou a tropa
da PM para as proximidades da
fazenda, mas deixou livre o caminho entre a propriedade e o atual
acampamento dos sem-terra.
O acampamento dos agricultores foi montado às 12h de quinta-feira. Ontem, parte deles deixou a
área, mas os coordenadores do
grupo afirmaram que eles seriam
substituídos por outros sem-terra
para que o número de acampados, cerca de 300, fosse mantido.
Às 9h20 de ontem, a PM começou o deslocamento em direção à
fazenda, que fica distante 70 km
do município. Cerca de 80 policiais das cidades mineiras de
Unaí, de Buritis e de Patos de Minas foram deslocados em dois
ônibus, cinco carros de polícia,
uma UTI móvel e um helicóptero.
Por volta das 11h30, policiais
ocuparam uma antena desativada
da Telebrasília e instalaram um
sistema de radiocomunicação para a PM. A antena fica na sede da
Associação Ecológica de Serra Bonita, ao lado do local de operações
e próximo à fazenda.
O administrador da Córrego da
Ponte, Wander Gontijo, demonstrou preocupação ao saber do uso
da antena de telefonia pela PM.
"Será que eles vão copiar ou interferir nas ligações daqui da fazenda?", questionou Gontijo à Folha.
A comunicação da fazenda dos filhos de FHC é feita via celular.
Um dos líderes dos sem-terra,
Jorge Augusto Xavier, esteve no
"teatro de operações" para tentar
saber dos PMs se eles assumiriam
a segurança da fazenda. A resposta dos oficiais: "Informação, por
enquanto, não temos nenhuma".
Segundo a assessoria de comunicação de Itamar, o posicionamento da tropa distante da fazenda e do acampamento tem uma
explicação simples. Os policiais só
vão assumir o patrulhamento da
região depois da saída do Exército. Seria uma forma de demonstrar que a PM está pronta para
substituir as tropas federais e por
isso a corporação foi deslocada.
Os soldados ficaram boa parte
do dia sob eucaliptos, ao lado da
estrada. Não havia nenhuma infra-estrutura montada, como barracas, alimentação, água ou banheiros. Embora os PMs estivessem proibidos de falar com a imprensa, foi possível ouvir reclamações, feitas em alto e bom som,
a respeito da falta de estrutura.
O silêncio dos oficiais acabou
gerando especulações e medo entre os moradores. "Será que nós
vamos ter uma guerra aqui, entre
a PM e o Exército?", questionou a
agricultora Anice Koch.
Coincidentemente, enquanto a
PM começava a se instalar próximo à fazenda, 20 soldados do Batalhão da Guarda Presidencial,
dentre os 300 homens do Exército
que estão na área, faziam exercícios táticos na porteira principal.
No início da tarde, mais de cem
integrantes do Batalhão de Missões Especiais da PM chegaram a
Buritis, vindos em sua maioria de
Belo Horizonte. Eles aguardavam
ordens de deslocamento para a
área próxima à fazenda.
Enquanto isso, no acampamento improvisado numa escola, os
dirigentes dos sem-terra passaram o dia discutindo o rumo da
manifestação.
Eles têm até domingo para deixar a área -as aulas voltam ao
normal na segunda- e demonstraram preocupação com as repercussões de suas decisões.
"É uma guerra de desgastes. O
momento político exige cautela e
ir para casa, agora, será o terceiro
recuo", afirmou Lucídio Ravanello, da direção nacional do MST,
que, no entanto, não descarta desistir da idéia de invasão da fazenda. "Nós temos de manter a cabeça fria e estamos avaliando a situação do ponto de vista político,
pois não podemos correr riscos,
cair no isolamento e perder o
apoio da opinião pública."
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