São Paulo, domingo, 16 de outubro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ OFENSIVA GOVERNISTA

Presidente avalia que não houve abalo à sua imagem, decide-se por candidatura e exige "enquadramento" do PT à política econômica

Lula vê crise no fim e já prepara campanha

KENNEDY ALENCAR
ENVIADO ESPECIAL AO PORTO

Baseado em pesquisas recentes encomendadas pela Presidência para mensurar a extensão do dano do escândalo do "mensalão" à sua imagem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já decidiu ser candidato à reeleição, segundo admitiu diretamente a auxiliares que relataram sua tomada de posição à Folha.
Por ora, ele manterá o discurso de que ainda não decidiu, mas concluiu que sobreviverá à crise política com força e começou a preparar detalhes operacionais da campanha. Por exemplo, o "enquadramento" do PT à política econômica e a avaliação de que deverá ter três coordenadores principais, o ministro Jaques Wagner (Relações Institucionais), o presidente eleito do PT, Ricardo Berzoini (SP), e o ex-ministro Luiz Gushiken.
Lula confidenciou a auxiliares que avalia que ganhará a eleição de outubro do ano que vem. Julga que os números de seu governo nas áreas econômica e social são melhores do que os dados das duas gestões do tucano Fernando Henrique Cardoso, o que lhe daria discurso para bombardear qualquer candidato do PSDB, partido visto como o principal adversário. Crê que, na campanha, poderá vender essas realizações e obter o segundo mandato.
Outra linha de campanha deverá ser o discurso de que saiu ileso pessoalmente de três CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito) do Congresso. As pesquisas em poder do Planalto mostram que Lula sofreu desgaste, mas que não é visto como "corrupto" nem envolvido diretamente nas acusações de corrupção.
Política econômica (baixa inflação e crescimento do Produto Interno Bruto), política social (Bolsa-Família para mais de 11 milhões de famílias de baixa renda em 2006) e preservação ética pessoal em meio a casos de corrupção que atingiram "o PT, mas também outros partidos", formarão tripé do discurso de campanha eleitoral de Lula.
"A oposição está investigando e batendo duro no governo há cinco meses. E não pode dizer nada do presidente. Ele não foi comprometido em nada. Sua imagem pessoal é de integridade, o que é fundamental para ele vencer a eleição", disse à Folha o embaixador do Brasil em Portugal, Paes de Andrade, ex-deputado e peemedebista que apoiou Lula em 2002. Paes acompanhou Lula na viagem de quinta ao Porto para a 8ª Cimeira (cúpula) Brasil-Portugal.
De acordo com as pesquisas do governo, o PT foi mais duramente atingido pelo "mensalão" do que Lula. O partido perdeu o "monopólio ético", segundo descrição de um auxiliar presidencial, e passou a ser visto como outra legenda qualquer. Perdeu um diferencial positivo e que abrirá um inédito flanco de críticas na campanha. Em outros pleitos, o PT sofreu acusações de corrupção, mas elas nunca foram tão verossímeis aos entrevistados como as de agora.
Lula sofreu um desgaste, mas considerado administrável e reversível. Nos levantamentos, a maioria o julga "honesto" e identifica a crise como um problema mais geral da classe política do que do presidente.
"As pesquisas mostram que o presidente Lula manteve muita força se levarmos em conta o bombardeio que sofreu, com acusações infundadas e um clima de exacerbação política criado artificialmente pela oposição", diz o ministro Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência), ao qual ficou subordinada a Secom (Secretaria de Comunicação de Governo) desde que Gushiken deixou de ser ministro. Dulci faz parte da comitiva de Lula que visitou Portugal e que se encontra em Roma, onde o presidente deveria chegar na noite de ontem.

Domar o PT
A exemplo do que fez em 2001, quando exigiu da cúpula petista uma série de concessões para ser um candidato competitivo, o presidente já desencadeou operação para enquadrar o PT.
Dias antes de Berzoini ser eleito presidente do partido, Lula lhe disse que não aceitaria críticas da legenda ao governo nos próximos meses e sobretudo na campanha eleitoral, principalmente à política econômica do ministro Antonio Palocci (Fazenda). O presidente tem pedido que o governo e o PT se unam, por avaliar que a campanha será muito dura, pois a oposição ganhou força neste ano e está com expectativa de poder.
O problema é que a ala moderada do PT, à qual Lula pertence, encolheu nas últimas eleições internas do partido e perdeu a maioria no Diretório Nacional. O presidente já pediu a Berzoini que faça composições com a tendência Movimento PT para formar uma maioria que evite que o seu partido seja um crítico duro do próprio governo. Essa tendência é a mesma do líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (SP), que já foi cobrado por Lula a articular apoio ao governo.

Os homens do presidente
O presidente tem dito a membros do governo que Wagner tem se saído bem como articulador político. Ele é forte cotado para ser o coordenador-geral da campanha, papel desempenhado em 2002 pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. "É jeitoso esse galego", diz Lula. "Galego" é como o chama na intimidade.
Gushilken estaria subaproveitado desde quando deixou a Secom, em julho. Hoje chefe do NAE (Núcleo de Assuntos Estratégicos) e assessor especial do presidente, ele foi coordenador-geral da campanha de Lula em 1998 e coordenador de comunicação da campanha de 2002. Lula quer aproveitar essa experiência e vai convidá-lo a trabalhar na eleição.
Berzoini, recém-eleito presidente do PT, seria o coordenador "para cuidar só do PT", fazendo a ligação da campanha de Lula com outros candidatos petistas nos Estados. Candidato a deputado federal, teria uma campanha fácil e poderia assumir compromissos na do presidente.
Nomes aventados para cuidar do programa de governo de Lula são Tarso Genro, presidente interino do PT, e Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência para assuntos internacionais.


Texto Anterior: Mídia: Jornalista Josias de Souza estréia hoje blog na Folha Online
Próximo Texto: Contas de Duda Mendonça: Promotor de Nova York rejeita pedido de CPI
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.