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São Paulo, domingo, 16 de novembro de 2003

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PF crê que dinheiro foi expatriado e que também pode estar em bancos na Áustria, nos EUA e no Uruguai

Brasil pede à Suíça apoio a investigação

JOSIAS DE SOUZA
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Ministério da Justiça já requisitou ao governo da Suíça informações sobre a existência de depósitos da suposta quadrilha desbaratada pela chamada Operação Anaconda em bancos daquele país. O pedido foi feito em caráter informal. Aguarda-se uma resposta para os próximos dias.
Entre os nomes repassados às autoridades suíças estão o do juiz João Carlos da Rocha Mattos e o de sua ex-mulher, Norma Regina Emílio Cunha. Estão presos em São Paulo, com outros integrantes do grupo que supostamente extorquia dinheiro de empresários e comercializava sentenças judiciais, entre outros crimes.
A Folha apurou que, simultaneamente, a secretária Nacional de Justiça, Cláudia Chagas, recolhe documentos para formular pedido formal de informações à Suíça. Conterá dados extraídos da investigação policial.
A Polícia Federal (PF) parece convencida de que o grupo enviou dinheiro ilegalmente para fora do país. A convicção dos investigadores foi tonificada a partir da apreensão de extratos bancários em escritórios e residências de integrantes da suposta quadrilha.
Além da Suíça, suspeita-se que o dinheiro expatriado esteja na Áustria, no Uruguai e nos EUA. Investigadores estão concluindo a análise do que foi apreendido. Esperam obter na próxima semana a totalização, ainda que precária, do que chamam de "caixa internacional" da suposta quadrilha.
Além de extratos e documentos, os agentes da PF trabalham na análise do conteúdo extraído de computadores, também apreendidos nas operações. Peritos tentam quebrar senhas de documentos eletrônicos protegidos.
A Folha falou na semana passada com integrantes da cúpula do governo que acompanham a Operação Anaconda. Além da intenção de recuperar o dinheiro enviado para o exterior, o jornal coletou as seguintes informações.

Luiz Carlos Zubcov
Esse delegado aposentado da PF seria homenageado na semana que vem. A cerimônia foi abortada. Ele aparece em situação suspeita nos grampos telefônicos.
Ao saber do envolvimento de Zubcov, a PF cancelou a homenagem. Como o assunto era sigiloso, não era possível explicar publicamente a razão do cancelamento.
Depois que o assunto surgiu na edição da última sexta-feira da Folha, houve alívio no alto escalão da PF. Quase que imediatamente foi jogado no lixo um vídeo feito com o ex-delegado Zubcov.
A gravação, de 3 minutos e 37 segundos, mostrava um Zubcov heróico. Era uma reconstituição de um caso antigo, semelhante ao que faz o programa "Linha Direta", da TV Globo.
Em 94, Zubcov foi assaltado ao sacar dinheiro numa agência bancária. Atracou-se com o assaltante e levou um tiro no peito. O criminoso foi preso. Por sorte do então delegado, a bala alojou-se no emblema de metal da PF guardado dentro do bolso da camisa do policial. Quase um milagre visto apenas em filmes de faroeste como "O Dólar Furado" (1965).
Zubcov dá um depoimento no vídeo. Sua saga seria apresentada na Academia Nacional de Polícia.

Jornalistas
Nas dezenas de grampos telefônicos realizados pela PF com autorização judicial, há mais de um jornalista gravado. O governo trata o tema com cuidado.
A primeira impressão de quem ouviu os trechos é de que seriam repórteres telefonando à busca de informações com acusados de integrar a suposta quadrilha.

Extensão do caso
O governo não pretende "abrir o leque" da Operação Anaconda. A idéia é focar ações nos atuais acusados e garantir a coleta de evidências para condená-los.
Todas as informações referentes a outros Estados serão repassadas a unidades de investigação autônomas. Devem resultar em processos separados do que recebe atenção da mídia no momento.
A Folha ouviu no governo que dificilmente será possível replicar com rapidez em outros Estados o que se fez em relação ao grupo investigado na polícia e no Judiciário paulistas. Trata-se de um trabalho para os próximos anos.
O governo considera que o material obtido pela Operação Anaconda é de extrema relevância. Há satisfação no Executivo com o trabalho da Polícia Federal, sobretudo com a condução do diretor da PF, delegado Paulo Lacerda.

Apreensões
Não preocupam o governo, até o momento, as críticas de advogados dos acusados sobre a suposta ilegalidade das apreensões realizadas pela Operação Anaconda.
"É claro que, quando os advogados não têm mais para onde correr, vão para o aspecto processual. As apreensões foram perfeitamente legais, dentro do espírito da lei e com bom senso", ouviu a Folha de integrante do governo que acompanha todo o processo.
Na avaliação das pessoas que comandam a operação, não seria possível fazer a listagem dos cerca de 1.500 itens apreendidos em uma das casas. O espírito da lei que rege esse tipo de situação é que nada pode ser acrescentado nem subtraído do que é apreendido -daí a necessidade de fazer uma lista detalhada.
Sem condições de relatar item a item no local, os agentes decidiram colocar o material em sacos plásticos, lacrados e assinados pelos policiais que estavam no local. Em Brasília, foram deslacrados na presença de outras testemunhas.

Desavenças na PF
Para a cúpula da administração petista, os policiais sindicalistas seriam a origem da insatisfação interna de parte dos integrantes da PF com a Operação Anaconda.
Em muitas oportunidades, quando um agente ou delegado é preso ou interpelado, há manifestação de insatisfação de sindicatos ou associação de policiais.
A direção da PF está tranquila porque um sindicalista que tem sido grande crítico da corporação foi flagrado nos grampos da Operação Anaconda numa conversa de conteúdo ambíguo com um dos acusados já conhecidos -o delegado José Augusto Bellini. O nome desse policial ainda não foi divulgado, pois não está claro qual é o seu envolvimento.
Quanto ao superintendente da PF em São Paulo, Francisco Baltazar, a Folha apurou que não foi bem recebida sua reação contrária à Operação Anaconda. Baltazar foi segurança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na campanha de 2002. É difícil que ele recupere o prestígio que teve no início do ano dentro do Planalto.


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