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São Paulo, domingo, 16 de novembro de 2003

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JUDICIÁRIO EM DEBATE

Controle externo da Justiça opõe especialistas na Folha


Debate promovido pelo jornal aponta que reforma do Judiciário é tida como necessária, mas não traria benefícios imediatos; lentidão dos processos, excesso de recursos e sobrecarga do Supremo são criticados


SILVANA DE FREITAS
EM SÃO PAULO
JULIA DUAILIBI
DA REPORTAGEM LOCAL

Defendido pelo governo federal, o controle externo do Poder Judiciário divide os profissionais ligados à área e tende a se tornar o ponto mais controverso e explosivo do debate já em curso sobre a reforma da Justiça brasileira.
A Folha convidou quatro especialistas -um magistrado, um especialista do governo, um integrante do Ministério Público e um advogado- para debater, na última terça-feira, as medidas para aperfeiçoar o Judiciário. O encontro, que durou cerca de duas horas e meia, foi mediado pela advogada Taís Gasparian, mestre em direito pela USP e chefe de gabinete do ex-ministro da Justiça Paulo de Tarso Ramos Ribeiro.
Carlos Velloso, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Sérgio Renault, secretário de Reforma do Poder Judiciário do Ministério da Justiça, Luiz Antonio Guimarães Marrey, procurador-geral de Justiça do Estado de São Paulo, e Ives Gandra Martins, advogado, foram unânimes em afirmar que, embora necessária, a reforma constitucional não solucionará o problema mais sentido pela população: a lentidão dos processos.
A convergência termina aí. De um lado, Velloso e Ives Gandra fizeram restrições ao modelo de Conselho Nacional de Justiça previsto na proposta de reforma aprovada pela Câmara dos Deputados e sob exame do Senado.
"Seria tratar câncer com aspirina", disse Velloso, citando que há mais policiais federais do que juízes presos na operação Anaconda, o que indicaria o mau funcionamento também do Executivo. Ives Gandra disse que, se o conselho for criado, também deveriam ser instituídos órgãos de controle de carreiras do Executivo hoje livres de fiscalização, como militares, diplomatas, fiscais e policiais.
Do outro lado, Renault e Marrey disseram que o órgão de fiscalização é fundamental para dar maior "transparência" à Justiça. "São servidores públicos, que têm de prestar contas à sociedade. E por que não, se todos nós que estamos a serviço da administração pública temos de fazer isso?", indagou o representante do governo.
Para Marrey, "um órgão federal, com composição equilibrada e atribuições razoáveis, é um mecanismo de transparência e de luz, o qual só terá a temer quem estiver prevaricando, agindo ao contrário da lei". Ele defendeu um conselho integrado por juízes, advogados e pessoas da sociedade civil. O secretário de Reforma do Judiciário disse que o governo apóia a proposta em tramitação no Senado, que prevê a participação de advogados, cidadãos e membros do Ministério Público.
Já Velloso sugeriu um conselho comandado pelo presidente do STF e integrado basicamente por juízes. Para ele, representantes da sociedade deveriam ser indicados pelo Supremo e não pelo Congresso, como prevê o projeto. Disse ainda que o STF dará a palavra final sobre a eventual inconstitucionalidade da indicação de cidadãos pela Câmara e pelo Senado, sugerindo violação do princípio da independência dos Poderes.
Todos disseram que, além da reforma constitucional, é preciso tornar a Justiça mais rápida por meio de mudanças na legislação processual que reduzam o número de recursos hoje existentes. A esse respeito, Ives Gandra afirmou que "qualquer bom advogado leva uma causa ao STF".
A súmula vinculante, mecanismo pelo qual os juízes das instâncias inferiores teriam de seguir a orientação firmada pelo STF sobre determinadas matérias, também dividiu as opiniões.
Sua adoção está prevista na proposta de emenda da reforma do Judiciário. A finalidade seria desafogar os tribunais superiores, submetidos anualmente ao julgamento de milhares de processos, mas seus críticos dizem que ela irá limitar a atuação do Judiciário às orientações dadas pela cúpula.
O governo é contrário à medida. Renault comparou-a a "um remédio que mata o doente". Já Velloso, que se definiu como "ardoroso defensor", disse que ela garante o tratamento isonômico.
"Se um ganha, o outro deve ganhar também, e as decisões judiciais não devem refletir um jogo de azar, um ganha e o outro perde", afirmou ele.
Leia a seguir trechos do debate.


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