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São Paulo, domingo, 16 de novembro de 2003

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O Judiciário precisa de um controle externo? Qual?


Carlos Velloso- Concordo com a afirmação de que os conselhos na Europa não são uma "pomada maravilha".
Em um debate recente, do qual participei, um professor sustentou a tese de que esse órgão seria a panacéia, mas alguém complementou que a primeira iniciativa dele seria construir um prédio, nomear dois assessores para cada membro, comprar um carro e contratar uma secretária.
Sou favorável a que o Judiciário preste contas, mas ele faz isso aos tribunais de contas e ao Ministério Público.
Neste momento, um juiz está preso e outros dois sob investigação [na Operação Anaconda]. Em contrapartida, há vários elementos do Ministério da Justiça [acusados de envolvimento]. Para resolver esse tipo de problema, precisaríamos de um conselho com integrantes da sociedade? Seria tratar câncer com aspirina.
Sou adepto de um conselho que controle a qualidade dos serviços da Justiça. Um Conselho Nacional de Justiça, presidido pelo presidente do STF e integrado por representantes dos tribunais superiores, dos tribunais de Justiça e até por juiz de primeiro grau, um ou dois membros da OAB.

Sérgio Renault - Entendemos que o controle externo é necessário para a maior transparência. O Poder Judiciário é bastante inacessível. Na medida em que ele presta um serviço público à população, deve prestar contas e estar sujeito a algum controle.
Na nossa avaliação, ele pode ser criado nos termos do que foi aprovado na Câmara, a partir do relatório da deputada Zulaiê Cobra (PSDB-SP), com 15 membros: 9 da magistratura, 2 advogados, 2 membros do Ministério Público e 2 cidadãos, um eleito pela Câmara e o outro pelo Senado.
Também não podemos estabelecer uma comparação entre os controles que existem nos demais Poderes. O Executivo e o Legislativo já estão submetidos a uma série de controles da sociedade.
Não temos a menor expectativa de que esse órgão vá resolver todos os problemas do Judiciário no país. Para o governo, essa também não é uma questão conjuntural em razão de problemas recentes sobre o comportamento de certos juízes.
Não é verdade que hoje haja uma transparência total da Justiça. Os exemplos de punição que vivenciamos são esparsos. Não temos uma avaliação negativa do comportamento dos juízes. O problema é que são seres humanos, servidores públicos que têm de prestar contas à sociedade. E por que não se todos nós que estamos a serviço da administração pública do país temos de fazer isso?

Luiz Antonio Marrey -O texto aprovado na Câmara traz soluções muito razoáveis, como os conselhos nacionais de Justiça e do Ministério Público. Ambos têm maioria das respectivas categorias. Ao mesmo tempo, a presença de advogados e de representantes da sociedade permite que outras pessoas vejam o que está acontecendo.
O Brasil é um país muito grande e díspare. Temos o sincero risco de, aqui e acolá, termos poderes oligárquicos que se fecham e que não resolvam o problema.
Um órgão federal com uma composição mista e equilibrada e com atribuições razoáveis é um mecanismo de transparência e de luz, o qual só terá a temer quem estiver prevaricando, agindo ao contrário da lei. Não vejo como esse órgão possa interferir na independência da magistratura e do Ministério Público.

Ives Gandra- Tenho a impressão de que é pacífico que as corregedorias que atuam tanto no Executivo quanto no Judiciário e no Ministério Público não representam a forma ideal de controle interno. Sou favorável à melhoria. Ou nós temos o controle externo na magistratura e em todas as carreiras de Estado ou nós devemos melhorar os conselhos internos.
Não é verdade que há um controle da sociedade sobre o Executivo e o Legislativo. O Poder é constituído dos políticos e dos burocratas. Os burocratas permanecem, enquanto os políticos se afastam. Temos burocracias profissionalizadas.
Se tivéssemos de admitir controle externo, não seria justo que a sociedade, por uma questão de transparência, não se fizesse representar nesses controles internos das carreiras de Estado.
Nós podemos ter mais transparência, mas poderemos estar inibindo o exercício correto do Poder por meio dessas carreiras. Eu entendo que teríamos de ter um controle só de magistrados, como também não gostaria de ter na Ordem dos Advogados, que é uma função essencial à Justiça, um controle externo.

Velloso - Eu faço um apelo: Temos como cláusula pétrea a separação dos Poderes. Eu concordo pessoalmente com a inclusão dos dois elementos [cidadãos] no conselho. Agora, se forem incluídos, devem passar pelo STF. Sem dúvida nenhuma nós vamos ter depois um embate constitucional no STF. Por que não evitar isto?

Renault - A escolha dos membros do STF não passa pelo Judiciário. São pessoas que são escolhidas pelo Executivo. Nem há requisitos de que sejam integrantes do Judiciário.

Velloso - Isso é outra questão. Mudar [a forma de indicação de ministro do STF] a esta altura não valeria a pena.

Ives Gandra - A Constituição fala em separação dos Poderes. O artigo 102 declara que o guardião da Constituição é o Supremo. Se em um determinado momento se entender que essa separação não permite o controle porque estará violando uma cláusula pétrea, quem vai julgar é o próprio Supremo, que poderá declarar a inconstitucionalidade.

Velloso - Temos no Ministério da Justiça um eminentíssimo advogado, respeitado por todos. Por que não evitar o embate?


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