São Paulo, Quinta-feira, 16 de Dezembro de 1999


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CELSO PINTO
A montanha-russa do câmbio

Desde o início da livre flutuação do câmbio, a cotação do dólar subiu a R$ 2,20, caiu para R$ 1,65, voltou a subir para R$ 2,00 e está agora em R$ 1,85, com perspectivas de cair ainda mais. Faz algum sentido?
Câmbio flutuante, por definição, flutua, mas é possível ouvir, em Brasília, uma indicação sobre onde o governo enxerga alguma racionalidade nesta montanha-russa de cotações.
O ponto de partida é uma conta comum no mercado financeiro. O cálculo é que na crise cambial, em janeiro, o câmbio de R$ 1,21 por dólar estava subvalorizado em cerca de 20%.
É preciso considerar, contudo, que houve também uma forte deterioração nos termos de troca: uma queda nos preços de bens exportados pelo Brasil e um aumento nos preços de bens importados. A perda estava em 15% nos 12 meses encerrados em outubro.
Supondo que metade desta perda seja compensável por ganhos de produtividade, seria razoável adicionar uns 7,5% na necessidade de ajuste do câmbio. Somando, ainda, uma inflação de uns 9% neste ano, o reajuste "correto" do câmbio ficaria em torno de 40%, ou R$ 1,70 por dólar. É claro que são cálculos apenas aproximados, que dependem da base que utilizada.
Mesmo assim, imaginando uma taxa "razoável" em R$ 1,70, qual seria uma flutuação também "razoável"? Algo entre R$ 1,50 a R$ 1,90 não seria despropositado, ouve-se em Brasília.
Isso não quer dizer que o governo trabalhe com esta banda, nem que considere desejável ver o câmbio oscilar tanto. É apenas um exercício sobre onde poderiam estar os limites do câmbio, com exageros, mas com algum sentido.
Nos últimos meses, a grande preocupação foi com o teto, já que o câmbio teimou em oscilar entre R$ 1,90 e R$ 2,00. Para frente, a expectativa do mercado é que haja uma maior apreciação do real em relação ao dólar.
Se, num cenário muito otimista, esta apreciação for maior do que o esperado, haveria um regulador natural do piso do câmbio: a taxa de juros. Com menor desvalorização, haveria um alívio na inflação, o que abriria espaço para uma redução mais agressiva das taxas de juros. A redução dos juros, a certo nível, reverteria a apreciação do câmbio.

A armadilha do FMI
Dez entre dez bancos esperam problemas para o Brasil cumprir a meta de reduzir a inflação anual para 7%, no segundo trimestre do próximo ano, como prometido ao FMI. No segundo trimestre deste ano, a inflação foi de apenas 1,05%. Portanto, qualquer taxa acima desta vai elevar a inflação anual.
O IGP-DI vai fechar este ano em torno de 20%. Mesmo que desacelere bastante, dificilmente cairia abaixo de uns 16% ao ano, em julho do próximo ano. Neste caso, calcula o banco CSFB-Garantia, os reajustes de alguns preços administrados terão que ficar neste nível, razão pela qual o banco projeta um reajuste médio de 17,3% nos preços administrados em 2000 (e, ainda assim, o IPCA fecharia o ano em 6,3%).
É muito provável que o IPCA fique acima de 8% ao final do segundo trimestre do próximo ano, o que exigiria um acerto com o "staff" do FMI. Ou até de 9%, o que exigiria um pedido de "waiver" e negociações com o "board", mesmo que o salto fosse apenas transitório.
Uma das vantagens do sistema de metas inflacionárias é trabalhar com um horizonte de mais longo prazo, diz o professor Ilan Goldfajn, da PUC do Rio. O BC leva em consideração não só a inflação, mas também o impacto sobre o PIB e ajusta seus instrumentos olhando o médio prazo.
Neste sentido, trocar metas monetárias trimestrais, como critério de desempenho, por metas inflacionárias, pode ter sido um mau negócio, diz. Se é difícil atingir metas monetárias a curto prazo, é ainda mais complicado atingir metas inflacionárias. Pode-se gerar uma rigidez desnecessária na reação do BC a desvios de curto prazo da inflação.
O presidente do BC, Armínio Fraga, minimiza este problema. Argumenta que mesmo choques teoricamente transitórios de oferta e de preços administrados, se forem grandes demais, devem gerar reações do BC. "A linha divisória entre o transitório e o mais permanente tem que ser administrada com cuidado", diz.
As metas trimestrais de inflação ainda não foram oficializadas como metas de desempenho: dependem de decisões do "board" do FMI e de negociações com o Brasil, em janeiro. Goldfajn imagina que, por esta razão, talvez seja possível renegociar a trajetória trimestral da meta inflacionária de uma forma mais razoável do que a simples fixação da taxa anual, a cada trimestre, 0,5 ponto percentual abaixo do trimestre anterior, como foi feito.
Para o mercado, seria um alívio, já que todo mundo espera confusão se as metas trimestrais de inflação continuarem como estão.


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