São Paulo, domingo, 17 de fevereiro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ELEIÇÕES-2002

Provável novo líder do partido na Câmara, João Paulo diz que "franjas" dissidentes da base governista são alvo de Lula

PT investe em "feudos" de Jader, ACM e Tasso

FÁBIO ZANINI
DA REPORTAGEM LOCAL

Um dos responsáveis pela estratégia eleitoral do PT, o deputado federal João Paulo Cunha (SP), 43, diz que o partido vai investir em dissidências regionais da base governista para tentar alavancar a candidatura presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva, hoje estacionada na casa dos 30%.
O petista cita como meta preferencial do partido conquistar as bases eleitorais do governador Tasso Jereissati (PSDB-CE) e dos ex-senadores Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) e Jader Barbalho (PMDB-PA), entre outros.
Todos são lideranças regionais da coalizão governista que, por um motivo ou outro, se afastaram do núcleo do governo FHC.
"No momento em que o governo precisou deles, usou bem. No momento em que não precisou mais, jogou fora. Esse pessoal e seus respectivos eleitorados vão poder optar na eleição", diz João Paulo, que deve ser eleito nesta semana o novo líder da bancada, de 59 deputados, do PT na Câmara.
A estratégia não passa por fazer acordos com os governistas descontentes, mas poderá ser facilitada pelo fato de parte dos eleitores de ACM e Tasso já votar em Lula, segundo pesquisas feitas pelo PT.
Integrante da ala moderada do partido, o deputado diz que há "franjas" dentro do próprio PSDB descontentes com a forma de atuação do governo federal, que já sinalizaram apoio ao petista.
João Paulo é um dos principais encarregados pelo PT de formular a tática eleitoral do partido. Na eleição de 2000, coordenou o grupo de trabalho sobre o tema montado pela direção petista.
Segundo João Paulo, a quarta tentativa de Lula de chegar ao Planalto trará um tom de apelo pessoal ao eleitor. O slogan da campanha deverá ser algo na linha "Dê uma chance ao Lula".
"Vamos dizer à população que ela já deu chance para o Collor, deu chance duas vezes para o Fernando Henrique. Os militares ficaram tantos anos. Por que não dar chance ao Lula?"
 

Folha - Que agenda buscará o PT na Câmara em 2002?
João Paulo Cunha -
A prioridade é tentar introduzir na pauta projetos que incidam sobre o problema da segurança pública. Precisa ser enfrentada a reestruturação da polícia, que vai do debate sobre salário à sua integração. Outro ponto é a CPMF. Vamos nos colocar favoravelmente à prorrogação até o final de 2003, mas estamos vinculando essa questão a uma reforma tributária, na qual queremos aprovar uma alíquota menor, que servirá mais como base de combate à sonegação.

Folha - Com qual cenário vocês trabalham na eleição presidencial?
João Paulo -
Acho que, do ponto de vista do governo, a tendência é PMDB, PSDB e PFL terem um candidato só, que deve ser José Serra. A candidatura da Roseana Sarney peca por vários problemas que a impedirão de vingar. A nova elite, produzida pelos neoliberais que se beneficiaram das privatizações, não admite uma oligarca regional. O novo capital precisa de alguém integrado a essa face mais moderna.
O segundo aspecto é que o PFL tem dificuldade em se estabelecer pelos Estados. Dos oito principais, tem palanque sólido em um ou dois. Não tem em São Paulo, Minas, Rio, Ceará e Rio Grande do Sul. A terceira razão é que o PFL tem instinto de sobrevivência muito grande. Bastará uma pequena queda da Roseana e uma pequena subida do Serra para dizerem que "um dispara e outro despenca". O comando do PFL é pragmático. No momento certo, vão aderir a Serra.

Folha - E do lado da oposição?
João Paulo -
O ideal -e que acho possível- é que a gente chegue até junho num denominador comum. O governador Anthony Garotinho sabe da responsabilidade que tem de não permitir que este modelo continue imperando no país. Assim como o Ciro Gomes seria bem-vindo. E continuamos dialogando com o Itamar Franco. Uma parte do PMDB -e não é pequena- não vai apoiar o candidato do governo. Você tem uns 25 deputados federais nesse caso, que podem apoiar o Lula.

Folha - Por que o Lula não consegue avançar além dos 30%? Enquanto Roseana e Garotinho subiram, Lula ficou parado.
João Paulo -
Por que a pergunta não é feita ao contrário? Por que o Lula não cai de 30 mesmo apanhando do jeito que apanha? Não começou a campanha. Se Itamar declarar apoio a Lula, se José Alencar, Requião, Garotinho, Maguito declararem, você vai formar uma base. Quando esse time for para a rua, o Lula vai crescer.

Folha - O caminho para subir então é buscar alianças com dissidentes da base governista?
João Paulo -
Vamos convocar as lideranças regionais para integrar um projeto nacional. Não estamos buscando aliança sem critério, fisiológica. É com base num programa. Tem gente no PMDB, PL e PTB. O tratamento é caso a caso. Ser oposição ao governo FHC é um dos critérios, mas não é o único. Precisa compactuar com nosso programa, ser oposição ao FHC e ao modelo neoliberal.

Folha - O PT vai procurar Paulo Maluf (ex-prefeito de São Paulo, do PPB), os ex-senadores Antonio Carlos Magalhães e Jader Barbalho, políticos que hoje se colocam como de oposição ao governo?
João Paulo -
Não. Representam outro projeto. É oposição que não combina com a nossa. Têm seus caminhos. Nós temos os nossos.

Folha - Por que (o ex-governador de São Paulo, do PMDB, Orestes) Quércia pode e Jader não pode?
João Paulo -
Primeiro não é só o Quércia, é com o PMDB. Já estivemos junto a figuras históricas do PMDB, o que acabou facilitando o diálogo, diferentemente do Jader, do ACM e do Maluf. Nossa mensagem vai ser para o povo brasileiro. Se ela atingir o eleitorado que vota em Maluf, ACM, não vamos negar, porque não tem como separar. Não vamos abandonar nossas posições históricas. O que vamos adotar é uma forma diferente de propugnar esses mesmos compromissos históricos. Porque é inaceitável que a população mais pobre, a que mais se beneficia com nossos programas, deixe de votar em nós.

Folha - Tudo indica que Serra não terá o apoio entusiástico de figuras importantes do PSDB, como Tasso Jereissati (governador do Ceará). O PT pode se aproveitar desses pontos vulneráveis?
João Paulo -
ACM, Jader e Tasso estão sofrendo com um modo de fazer política que é o de chupar a laranja e jogar fora o bagaço. No momento em que o governo precisou, usou bem. No momento em que não precisou mais, jogou fora. Esse pessoal e seus respectivos eleitores vão poder optar na eleição. O Tasso, se quiser manter esse método, apóia o Serra.

Folha - Se não quiser, faz um acordo com o PT?
João Paulo -
Não tem acordo com o Tasso. Mas o eleitorado do Tasso precisa saber que o nosso método de fazer política é diferente. Mesma coisa na Bahia, com o eleitorado do ACM. Muita gente vota no Lula e no ACM.

Folha - Quando for à Bahia, Lula então vai poupar ACM?
João Paulo -
Não. Somos oposição ao carlismo. Agora, o eleitorado baiano pode votar eventualmente no Lula e no ACM. O que nós achamos é que o ACM experimentou um método de governar, que é o método de FHC e Serra, que o eleitorado dele vai julgar. Não vai nenhum acordo aí. Isso se repete no Ceará. Muita gente vota no Tasso e no Lula.

Folha - Lula tem altas taxas de rejeição em cidades governadas pelo PT, como Porto Alegre e São Paulo. Como resolver isso?
João Paulo -
Nós estamos preferindo trabalhar no sentido afirmativo, de pedir uma chance ao povo brasileiro. Que o Brasil dê uma chance para o Lula.

Folha - Será este o slogan da campanha, "Dê uma chance ao Lula"?
João Paulo -
Não sei se será exatamente esse, mas o tom será esse. Certamente vamos fazer um apelo forte à população brasileira. Por que não dar uma chance para o Lula, para a gente aplicar os nossos programas? Vamos por exemplo apresentar um projeto de reforma agrária para o Brasil. E vamos dizer: "Dê uma chance para a gente aplicar esse programa".

Folha - Isso não dá um tom de súplica, um tom emocional demais?
João Paulo -
Nós não estamos pedindo por favor. Não é um tom emocional, é um tom adequado. O povo já sabe que o PT tem proposta, em todas as áreas. O povo experimentou oito anos de FHC. Será que não é o caso agora de dar oportunidade para um outro grupo, alternância de poder?

Folha - O PSDB tem uma chamada "ala esquerda", seções críticas ao governo do FHC. É o caso de investir nessas "franjas" do tucanato?
João Paulo -
Existem deputados em todos os partidos que têm idéias boas. E o Lula vai defender idéias boas. Individualmente, "franjas", pessoas do PSDB e de outros partidos, vão apoiar Lula. Na campanha e no governo.

Folha - Pessoas do PSDB vão apoiar Lula na campanha?
João Paulo -
Certamente. Deputados individualmente em alguns lugares, como Minas Gerais, Ceará, Paraíba. Deputados, vereadores. Não vou dar nomes porque seria indelicado, mas tem deputados da base do governo, do PSDB, que não estão satisfeitos com a forma que o presidente tem adotado na condução do governo.

Folha - Mas vocês vão procurar o PSDB ou esperar pelo apoio deles?
João Paulo -
É uma via de mão dupla. Tem muitos lugares em que você pode atuar ativamente. Se você sabe que tem um lugar em crise, procura as pessoas e conversa. No curso deste ano, vamos dialogar com as pessoas. Se você vê a entrevista melancólica do Paulo Renato, você vê que é um poço de rancor. Se ele, ministro, da cozinha do palácio, é tratado daquele jeito, imagina neste país afora. Pega o exemplo do PSDB-MA. Como o governo está dando tudo para o grupo da Roseana, tem um setor do PSDB de lá completamente descontente. Para nós, é uma oportunidade.



Texto Anterior: Presidenciável reforça publicidade no Rio
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.