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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/A QUEDA
Ministro, que foi presidente do PT por sete anos, foi o artífice da política de alianças e o articulador da campanha vitoriosa de Lula em 2002
Dirceu cai vítima de seu próprio veneno
PLÍNIO FRAGA
DA SUCURSAL DO RIO
Articulador da aproximação do
PT com os partidos de centro-direita, José Dirceu cai vítima do veneno que ele próprio criou.
Símbolo do "tarefismo" petista,
centralizador e pragmático, gosta
de lembrar que entrou na política
para "matar ou morrer". Morreu
politicamente para o governo Lula bem antes do que supôs há dez
anos, quando, ao assumir pela
primeira vez a presidência do PT,
iniciou seu projeto mais ambicioso de chegada ao poder.
Abriu mão da revolução pelas
armas, para a qual treinou em Cuba entre 1969 e 1975, para comandar a conversão petista à ortodoxia política, na qual a maioria é
construída menos pelas idéias do
que pela distribuição de cargos.
Depois de ter sufocado a oposição interna no PT, Dirceu negociou pessoalmente adesões ao governo Lula de adversários do passado como José Sarney, Orestes
Quércia, Valdemar Costa Neto e
-por último, mas não menos
perturbante- Roberto Jefferson.
Dirceu apostou todo o poder
que conquistou no PT e com Lula
como fiador da construção da
maioria parlamentar que assegurasse ao presidente a governabilidade. Sua saída do governo mostra que perdeu a aposta, em derrota comemorada por setor próximo do presidente da República.
Tutores
Certa vez, Lula leu em um texto
a seu próprio respeito que apontava como característica sua rejeitar tutores desde os tempos de
sindicalista. Relembrou disso ao
ver, após sua eleição em 2002,
uma capa de revista que definia
Dirceu como o "homem que faz a
cabeça de Lula". O futuro ex-ministro da Casa Civil apressou-se
em tentar corrigir: "Quem faz a
minha cabeça é o Lula".
Já era tarde. Lula passou lenta,
mas continuamente, a emitir sinais para tentar dizer que, no governo, manda quem recebeu os
votos. Presidente eleito não tem
tutor, repetia.
O primeiro indício veio nas negociações para a composição do
ministério. No dia 19 de dezembro de 2002, Dirceu havia acordado com o presidente do PMDB,
Michel Temer, a indicação dos
nomes para os ministérios de Minas e Energia e da Integração Nacional. Às 12h do dia seguinte,
Dirceu ligou para Temer para dizer que não tinha condições de
cumprir o acertado na véspera.
Lula rejeitara o acordo.
Era mais um dos atritos que
Dirceu acumulou com Lula em 25
anos de militância conjunta. Em
1994, Lula não queria que Dirceu
fosse candidato ao governo de
São Paulo, porque preferia apoiar
Mário Covas no Estado para que
tivesse o apoio tucano à sua candidatura presidencial. Dirceu ligou para Lula para dizer que as relações entre os dois nunca mais
seriam as mesmas.
Voltaram a divergir em 1997,
quando o economista Paulo de
Tarso Venceslau acusou Lula de
pressionar prefeituras petistas a
contratar empresa com ligações
com Roberto Teixeira -compadre do hoje presidente e dono do
apartamento onde morava de
graça à época. Dirceu, presidente
do PT, montou uma comissão para apurar o caso. Para Lula, a denúncia não era séria o suficiente
para ser apurada.
Amigo de piadas
Vencida a eleição de 2002, o secretário de Comunicação e Gestão da Presidência, Luiz Gushiken, passou a ser o principal estimulador de Lula na contenção do
poder de Dirceu.
O futuro ex-ministro nunca foi
amigo de Lula na proporção em
que é Gushiken. Mantinha distância física de Lula quando presidia
o PT. Dirceu permanecia na sede
do partido, no centro. Lula ficava
no Instituto Cidadania, no Ipiranga. Desde 1998, companheiro diário de Lula era Gushiken, com
quem discutia política, fazia piadas e saía para almoçar.
Sem paciência para as arrastadas reuniões petistas, Lula preferia agendas políticas externas.
Dirceu, os conchavos internos,
que o levaram a ser reeleito presidente do PT em 97, 99 e 2001.
Ao ser beneficiado pela Lei da
Anistia em 1979 -havia sido banido do país dez anos- Dirceu
foi trabalhar na Assembléia Legislativa de São Paulo. Lá, foi assistente jurídico, auxiliar parlamentar e assessor técnico, entre 1981 e
1986, quando encarnou o símbolo
do "tarefismo" petista. Ou seja,
militante empenhado em encontrar deslizes e negociatas públicas,
levá-las à imprensa e torná-las
bandeira eleitoral do partido.
Nada tão distante do político
hoje alvejado por acusações de
envolvimento em escândalos de
corrupção, como no caso de seu
ex-assessor Waldomiro Diniz e
do "mensalão" tornado público
por Roberto Jefferson.
As acusações do petebista contra o tesoureiro do PT, Delúbio
Soares, e o secretário-geral do
partido, Sílvio Pereira, minaram
Dirceu. Soares e Pereira eram notórios operadores políticos do ex-ministro. Ontem, ao deixar o cargo, disse que saía do Planalto, sem
que deixasse lá sua alma. Vai precisar dela para cuidar dos fantasmas que atuavam em seu nome.
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