São Paulo, domingo, 17 de agosto de 1997.



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SOB INVESTIGAÇÃO
Inversora Rineos, uma empresa de fachada, investiu US$ 7 milhões na empresa do cunhado de Maluf
Frangogate tem conexão no Uruguai

MARCIO AITH
enviado especial ao Uruguai

IGOR GIELOW
da Reportagem Local


A Inversora Rineos S/A, companhia uruguaia que investiu US$ 7 milhões na distribuidora de frango A D'Oro Alimentícia entre 1991 e 1996 sem obter retorno financeiro, é uma empresa de fachada.
A Folha apurou que a Rineos uruguaia não existe fisicamente e foi fundada por um escritório de contabilidade especializado em criar e vender empresas por cerca de US$ 1.500.
Durante quase sete anos, ela teve um presidente que nega ter ocupado o cargo e um capital declarado insuficiente (US$ 300 mil) para investir o que investiu no Brasil.
Em 10 de julho passado, quando o Frangogate já ocupava o noticiário brasileiro, mudou seu capital para US$ 5 milhões.
A A D'Oro é a empresa de Fuad Lutfalla, cunhado de Paulo Maluf, que está sendo acusada de favorecimento na venda de frangos à Prefeitura de São Paulo entre agosto de 1996 e fevereiro deste ano.
O Ministério Público também investiga a A D'Oro por ter comprado frangos vivos da Obelisco, empresa da mulher do então prefeito paulistano, Sylvia Maluf.
A Inversora Rineos detém 46% do capital da A D'Oro. Segundo Caio Lutfalla, filho de Fuad, diretor da A D'Oro e da subsidiária brasileira da Rineos, a Inversora Rineos pertence a "investidores uruguaios". Há outras versões para isso (leia texto nesta página).
Receptora
Durante cinco dias, a reportagem conversou com pessoas envolvidas em sua criação e constatou indícios de que ela é receptora de dinheiro vindo do exterior.
Constatou também que, diferentemente do que disse Caio Lutfalla à Folha na semana retrasada, há ligações entre os envolvidos com a criação da Rineos uruguaia e a família da mulher de Paulo Maluf.
A Rineos foi fundada em 1985 por um escritório de contabilidade, não operando até 1990. Em seu endereço declarado, plaza Independencia, 811-térreo, Montevidéu, funciona o escritório de advocacia especializado em clientes estrangeiros Guyer & Regules.
O advogado brasileiro Oscar Martin Renaux Niemeyer assumiu a presidência no fim de 1990. Niemeyer nega conhecer os Lutfalla. "Conheço só de nome", disse à Folha na sexta-feira retrasada.
Em 13 de dezembro de 1989, porém, o escritório de Niemeyer assessorou a criação da Quimicorp Indústria e Comércio -primeira razão social da futura A D'Oro Alimentícia. "Só dei vistas no processo", alegou, ao ser questionado sobre o fato na quinta-feira passada.
Em 17 de dezembro de 1990, Niemeyer passou uma procuração ampla para seu então sócio André de Vivo -amigo e colega de escola de Caio Lutfalla, segundo o próprio. Niemeyer dividiu o escritório de advocacia com de Vivo e seu pai, Livio de Vivo, até 1991.
Essa procuração foi registrada no Uruguai e no 6º Cartório de Notas de São Paulo, por se tratar de uma empresa que atua no país. Nela, Niemeyer aparece como "presidente da diretoria".
Em 26 de dezembro de 90, a procuradora da Rineos, María Sara Pérez, afirma ao Registro Público uruguaio que o Niemeyer é o presidente da empresa.
Negativa
"Saí da empresa em fevereiro de 1991. A ata que me desligou saiu um pouco depois, em 21 de junho de 1991, e me sucedeu André de Vivo", afirmou Niemeyer.
Não existe registro público da saída de Niemeyer da empresa. O nome de André de Vivo também não aparece nos documentos públicos uruguaios.
A única alteração do contrato social da Rineos ocorreu no mês passado, quando o escândalo do Frangogate já ocupava as páginas dos jornais brasileiros.
No dia 10 de julho, Nicolas Juan -justamente do escritório Guyer & Regules, que fica no endereço oficial da Rineos desde 1990- aparece como sócio em registro de aumento no capital da empresa.
Em 1990, a Rineos foi fundada com US$ 300 mil. No dia 10 de julho, aumentou para US$ 5 milhões -exatamente o valor que Caio Lutfalla afirmou à Folha ter entrado na A D'Oro nos últimos anos via Uruguai.
Um favor
A Folha visitou Juan na terça-feira passada. "Podem escrever o que quiserem", disse, antes de expulsar a reportagem do prédio.
Em janeiro de 1991, quando a A D'Oro ainda se chamava Alicorp (sua segunda razão social), a Rineos assumiu 20% do capital da empresa -que somava o equivalente a R$ 14.083, segundo tabela de conversão do Tribunal de Justiça de São Paulo para pagamento de precatórios (dívidas judiciais).
Quatro anos depois, esse capital somava R$ 5,5 milhões -sendo 46% da Rineos. Em 12 de dezembro de 1995, a Rineos uruguaia criou a Rineos Empreendimentos Ltda. Sócio minoritário com 20% das ações, Caio Lutfalla passou a assinar pela empresa.
"Foi só um favor que fiz a eles", disse Lutfalla. Dezesseis dias depois, a Rineos uruguaia transferiu suas cotas na A D'Oro para a Rineos brasileira. Caio Lutfalla passou a controlar 66% das ações (20% seus na A D'Oro mais os 46% da Rineos).




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