São Paulo, Domingo, 17 de Outubro de 1999
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CELSO PINTO
A recuperação da balança

Antes da desvalorização cambial, havia um certo consenso de que o real estava sobrevalorizado em algo entre 15% e 25%. Desde janeiro, a desvalorização real, acima da inflação, já chegou em torno de 50%, e a balança comercial continua no vermelho.
Será preciso uma desvalorização ainda maior para que os resultados melhorem?
Tudo indica que não. Apesar da impressão de que a balança comercial não tem melhorado, os resultados têm sido cada vez mais animadores.
Os argumentos que justificam as dificuldades na exportação são conhecidos. Os preços dos principais produtos de exportação do país caíram muito neste ano, enquanto o preço das importações subiu.
Os termos de relação de troca, que é a soma desses dois efeitos, caíram 18,6% nos 12 meses encerrados em setembro, segundo a Funcex. É o choque externo adverso mais violento desde o início dos anos 80. Se os preços de exportação e importação tivessem ficado nos níveis que estavam em dezembro do ano passado, a balança comercial teria acumulado, até setembro, um superávit de US$ 6,5 bilhões e não um déficit de US$ 767 milhões.
Do lado da quantidade exportada, contudo, as exportações têm melhorado consistentemente. Comparando trimestres deste ano com os mesmos trimestres de 98, o quantum exportado saiu de negativo em 3,5% no primeiro trimestre para positivo em 2,1% no segundo e 5,8% no terceiro.
Os preços tiveram um comportamento menos regular: as quedas foram de 12,2% no primeiro trimestre, 13,5% no segundo e 11,7% no terceiro. Graças à reação do quantum, contudo, a queda no valor exportado desacelerou: de 15,6% no primeiro trimestre para 11,8% no segundo e 6,8% no terceiro.
Nesse período, o quantum subiu muito fortemente no caso dos semimanufaturados: 9,5%; 19,3% e 12,5%. E reagiu muito no caso dos manufaturados: passou de uma queda de 14,2% no primeiro trimestre e de 1,5% no segundo para um aumento de 4,7% no terceiro.
A queda no preço de venda dos manufaturados cresceu (5,4%; 9,9% e 11,3%). A Funcex explica pelo repasse de parte dos ganhos dos exportadores com a desvalorização para os importadores.
No caso dos básicos, o aumento do quantum se concentrou no primeiro trimestre (13,1%), seguido por aumento de 0,2% no segundo e 3,1% no terceiro. A boa notícia é a nítida redução no ritmo de queda dos preços: 20,1% no primeiro trimestre, 16,5% no segundo e 12,1% no terceiro.
Também do lado das importações existe uma boa notícia. No segundo trimestre, parecia que a tendência era de aumento no quantum, em função de a economia estar crescendo mais do que o esperado.
No terceiro trimestre, isso não se confirmou. No primeiro trimestre a queda foi de 24,3%, no segundo de 18,3% e no terceiro de 22,8%. Isso fez com que a queda no valor das importações aumentasse de 13,2% no segundo trimestre para 16,6% no terceiro.
Uma análise do banco JP Morgan adiciona outros argumentos. A tese é que as exportações brasileiras estão seguindo o padrão "J", onde há queda no valor, nos meses pós-desvalorização (até por descontos em dólares), mas seguida de uma forte recuperação na frente.
O banco prevê uma recuperação nos preços das commodities. Olhando os ciclos econômicos dos países da OCDE, em sete períodos desde os anos 70, em média, a queda dos preços, em estágios comparáveis ao atual, foi de 4,4% (dessa vez é de 3,4%), mas seguida por aumentos de 8,5% no ano seguinte e 26,5% ao final de dois anos.
A experiência de outras desvalorizações mostra que a quantidade exportada tende a crescer muito nos dois anos seguintes ao reajuste. Isso ajudará as exportações, mesmo que os preços se recuperem com mais lentidão. Além disso, os parceiros brasileiros, tanto na América Latina quanto na Europa e na Ásia, vão estar em melhor situação econômica no próximo ano.
Do lado das importações, embora o banco espere um aumento de 3% na demanda doméstica (de indivíduos e empresas) no próximo ano, comparado a zero neste ano, o padrão histórico mostra que o volume importado é muito sensível ao câmbio. Portanto não se deve esperar nada explosivo.
O banco estima um déficit na balança comercial de US$ 1,8 bilhão este ano, seguido por um superávit de US$ 4,1 bilhões no próximo. Não vê nenhuma necessidade de maior desvalorização do real. Ao contrário, imagina alguma valorização na medida em que as contas externas melhorarem.


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