São Paulo, sábado, 17 de novembro de 2007

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Venezuelano cria tensão, afirmam analistas

RICARDO BONALUME NETO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

As "espetaculares" compras de armas pela Venezuela de Hugo Chávez não chegaram a criar uma "corrida armamentista" na América do Sul, mas criaram tensão no continente, concordaram especialistas em assuntos estratégicos durante conferência ontem no Rio.
O problema "não é a compra das armas, mas sim a incerteza da política venezuelana", disse o brasileiro Alfredo Valladão, diretor da Cátedra Mercosul de Ciências Políticas, de Paris, na quarta edição da Conferência do Forte de Copacabana.
A modernização do arsenal venezuelano tem sido usada como pretexto para os militares brasileiros defenderem o reequipamento das Forças Armadas com material moderno.
Valladão cita as "declarações provocantes" do venezuelano que trazem "problema de credibilidade e incerteza": sua possível cooperação nuclear com o Irã, a compra desejada de submarinos russos, uma intervenção na Bolívia em caso de ações contra Evo Morales, e a produção de munição em grande escala para fuzis russos.
"Não há uma corrida armamentista do ponto de vista convencional", diz Clóvis Brigagão, diretor do Centro de Estudos das Américas, do Rio. Para isso seria preciso que dois ou mais países acompanhassem o ritmo das compras venezuelanas.
O item mais vistoso das aquisições de Chávez são os 24 caças russos Sukhoi-30, dos quais mais da metade já foi entregue. Mas talvez o item mais preocupante para os vizinhos (especialmente para a Colômbia. envolvida com a narcoguerrilha Farc) sejam os cem mil fuzis de assalto AK-103, versão mais moderna no famoso AK-47 russo, e da fábrica de munição para eles. Há medo de que parte desse arsenal seja desviado para a guerrilha ou o crime organizado através da corrupção.
"O terreno das percepções, do que consiste uma ameaça ou não, é pantanoso", disse Diego Fleitas, da Associação para Políticas Públicas, de Buenos Aires. Fleitas citou como preocupante a declaração ao Congresso do general brasileiro José Benedito de Barros Moreira, secretário de Política, Estratégia e Relações Internacionais do Ministério da Defesa, de que o Brasil deveria ter condições de fabricar uma bomba atômica, se achasse necessário.
O general Barros Moreira, presente no seminário, defendeu suas declarações ao Congresso. Diz que deixou claro que não está defendendo a construção da bomba, mas acha que o país deve ter as condições de fazê-la no futuro, se o Estado assim determinar, por força de circunstâncias futuras: por exemplo, se outro país latino-americano decidir ter a sua.
A pesquisadora Francine Jácome, diretora do Instituto Venezuelano de Estudos Sociais e Políticos, de Caracas, contrastou a maior cooperação no Cone Sul com as relações mais "fragmentadas" da região andina. Ela elogia o maior controle civil dos militares, a transformação da região sul do continente em zona de paz, a criação de mecanismos de confiança mútua e a participação em missões de paz como a do Haiti, na qual militares do Brasil, Argentina e Chile trabalham juntos.
Já nos principais países dos Andes a agenda dos países é diferente e ocorre debilitação do poder civil. A Venezuela passou a ver os EUA como ameaça e faz discursos provocativos, sobretudo na área nuclear. "O discurso é de integração, mas na prática tem o efeito contrário", diz ela das políticas de Chávez.
Sophie Jouineau, diretora de assuntos latino-americanos da área de estratégia do Ministério da Defesa francês, lembrou que há pouco risco de guerra externa na região, mas que a "criminalidade extranacional" tem a capacidade de reduzir a capacidade dos estados de prover segurança a seus cidadãos.


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