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JANIO DE FREITAS
Insuportável
A trégua generosamente
concedida pelos agentes da
Polícia Federal em greve, ou que
assim se dizem, não se dá no embate que travam com o governo,
como supõem os próprios concedentes. A trégua é dada à parcela
da população compelida a embarcar ou desembargar nos aeroportos de São Paulo e Rio, e que
já precisava reabastecer a passividade para mais humilhações
policiais.
Jornais, TV e rádios estão próximos do silêncio, quando não de
todo omissos, diante das anormalidades provocadas pelo que
chamam de greve dos agentes da
PF. Há variados motivos para o
escapismo mal disfarçado, mas
não errará muito quem queira
atribuí-lo a medo de represálias
individuais, a meio de um imprevisto sempre possível.
Desde o dia 9, quem chegou a
um daqueles aeroportos, em saída ou em chegada, foi submetido
ao mais antidemocrático dos
preceitos: todos são suspeitos até
prova em contrário. Um a um -
idosos, mulheres, crianças e homens - todos passaram por processos de identificação minuciosamente provocadores, cujo único intuito foi o de martirizá-los
com cansaço físico e ansiedade
exasperante, por horas insondáveis, duas, quatro, cinco, de pé
nas filas sem fim.
A esse tratamento os agentes
da PF deram o nome de greve.
Greve para que lhes seja dado, e
aos escrivães e papiloscopistas,
"vencimento de nível superior".
Greve? Não. O direito de greve é
reconhecido dentro de condições
determinadas, que não incluem
a arbitrariedade, muito menos a
arbitrariedade praticada com
uso do poder de autoridade.
Por intermédio de representantes sindicais, os agentes da PF
afirmam que a verificação rigorosa da identidade de passageiros, em embarque ou desembarque, está em suas atribuições.
Sim, mas em termos. Servidores
públicos só podem fazer o que a
lei autoriza. E nenhuma autoriza a exorbitar a pretexto de verificação de identidade ostensivamente morosa. Lentidão intencional contra os cidadãos, como
está dito com clareza pelo vice-presidente da Federação dos Policiais Federais, João Valderi, ao
falar da trégua: "Se o ministro
[da Justiça] continuar a falar esses absurdos, vamos retomar a
operação ainda lenta".
Além de contrariar o princípio
legal básico do serviço público, o
tratamento dado aos passageiros
constitui constrangimento físico
e moral com propósito de alcançar benefício. Todo agente federal sabe o que é isso, porque tem
a obrigação de prender quem o
pratique sem ser agente federal
"em greve".
O benefício buscado está posto,
com todas as letras e números,
nas explicações das lideranças
sindicais dos "grevistas". O constrangimento de indivíduos como
meio, se não bastarem as evidências fotografadas e filmadas,
também conta com palavras. Por
exemplo, na frase exaltada do
presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais, Francisco Carlos Garisto, um líder
muito representativo, anteontem, sobre a dificultação de embarque e desembarque: "Vamos
aumentar a cada dia até que fique insuportável".
O líder policial da PF se deu
conta? O que Francisco Garisto
enunciou é o princípio mesmo da
tortura: aumentar o constrangimento físico e moral "até que fique insuportável".
É fora de dúvida que policiais
devem ser tão bem pagos quanto
possível, e até além disso. Mas
policiais atuam contra os malefícios da sociedade, não são eles a
violentá-la.
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