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DOMINGUEIRA
Síndrome de Caramuru
MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
Editor de Domingo
O sociólogo Gilberto Vasconcellos cunhou a expressão
"síndrome de Caramuru" para
designar esse fenômeno cada
vez mais comum no Brasil de se
observar o estrangeiro com encantamento e temor. A quantidade de economistas e "técnicos", sem falar em sociólogos e
outros "ólogos", que tem opinado sobre o que o Brasil deve ou
não fazer é impressionante.
Não haveria nada de mal nisso, se esses sábios não fossem
acolhidos com tanta reverência, como se falassem de um lugar neutro, supostamente
"científico", e não vocalizassem
nenhum tipo de interesses.
Um momento ritualístico
exemplar dessa síndrome ocorreu na famosa entrevista coletiva da equipe econômica com
mr. Fischer, o mágico do Fundo, que ateou fogo na aguardente diante da tribo arregalada.
A síndrome de Caramuru não
ocorre, entretanto, apenas na
relação com entes de carne e osso. Ela transferiu-se, no Brasil
tucano, para uma outra entidade, o "mercado", que passou a
reinar acima de tudo, da vida,
dos princípios, das pessoas.
Nada pode-se fazer que venha
a chatear o mercado. O mercado é muito suscetível. Quando
se irrita, é a peste. Cospe fogo
pelas ventas.
Muitos desses tementes viram
na instalação de uma CPI para
investigar o sistema financeiro
um grande risco.
No momento em que o mercado começa a se acalmar e ficar
bonzinho de novo com a tribo,
quando resolve "voltar" (como
se o novo dinheiro que entra
fosse fruto de um gesto de compreensão e parceria e não da especulação num mercado com
juros insustentáveis), vêm esses
incautos querer atrapalhar.
Não sabem que não se pode
mexer com as intimidades do
mercado? Que ele é superior, a
fonte da vida, e não pode revelar-se, jamais, por inteiro?
Há obviamente interesses políticos na CPI, haverá quem
queira dela fazer palanque, poderá haver rebuliço e leviandade. Mas nada pode justificar a
omissão diante das operações
suspeitas que vêm se acumulando ao longo dos últimos
anos.
Talvez, por vício iluminista
ou resíduo formal de cultura de
"esquerda", o atual governo
sinta-se dispensado de certos
protocolos éticos por acreditar
que tem a chave do sucesso para o país -e seus fins elevados
justificariam desvios nos meios.
Acontece que se vive numa
democracia, que se deve ter em
mente o sentido da república, o
fato de que esses dinheiros e essas operações não são alheios à
sociedade, às pessoas que pagam impostos, que mal conseguem trabalhar e que quando o
fazem já são suficientemente
expoliadas nesse país aberrantemente desigual.
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