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CELSO PINTO
Quem deve regular o mercado?
Parte das operações de mercados futuros na Bolsa de Mercadorias & Futuros, a BM&F, como as
que envolvem juros e dólares, é
supervisionada pelo Banco Central. Outra parte, relativa ao mercado acionário, é supervisionada
pela Comissão de Valores Mobiliários, a CVM.
Nenhuma regra, do BC ou da
CVM, no entanto, impediu que o
Banco Marka apostasse 20 vezes
seu patrimônio contra a desvalorização do real. Faria diferença se
a regulação e supervisão estivessem concentradas numa única
entidade independente?
Essa é uma das questões importantes que o caso Marka suscita.
Como evitar que a imprudência
de instituições financeiras gerem
situações de risco que acabam cobertas com o dinheiro público?
A resposta direta é que, por melhor que seja o sistema de supervisão e regulação, é impossível
evitar quebras. Os colapsos do
Continental Bank e das sociedades de crédito imobiliário, nos Estados Unidos, e dos bancos BCCI
e Barings, no Reino Unido, são
bons exemplos.
Em muitos países, de toda forma, o esforço para minimizar o
risco resultou na separação formal entre o órgão regulador e supervisor e o Banco Central. O Reino Unido fez isso em 1997. Ao
mesmo tempo em que tornou o
BC independente, com a única
função de ser o guardião da moeda, criou um órgão à parte para
cuidar da supervisão das instituições.
Nos Estados Unidos existe a separação, embora haja uma superposição de funções. Na prática, o Fed, que é o emprestador de
última instância, faz as regras e
fiscaliza os bancos sob a ótica do
risco sistêmico. Já o Office of the
Comptroller of the Currency
(OCC), aplica as regras de supervisão, sob a ótica da defesa dos
interesses dos depositantes e aplicadores.
Os países que aderiram ao Euro,
na Europa, na prática transferiram as funções clássicas de banco
central para o BCE (Banco Central Europeu). Os bancos centrais
de cada país continuam sendo
emprestadores de última instância e, em alguns casos, também os
órgãos supervisores. No Japão
também existe uma separação.
Na Argentina, a separação é
parcial, já que o órgão de supervisão tem assento no banco central.
Outros países latino-americanos,
como o Chile, também optaram
pela separação.
É, contudo, um tema polêmico.
Um dos apelos da separação formal, lembra Gustavo Loyola, ex-presidente do BC, é que permite
reunir todo tipo de instituição
sob um único guarda-chuva supervisor. No mercado financeiro
de hoje não faz sentido olhar apenas os bancos, quando operações
relevantes podem estar concentradas em empresas de leasing,
seguradoras, factoring etc.
Mas também não faz sentido
obrigar o BC a supervisionar todas as empresas que façam operações financeiras, ou que tenham
um caráter financeiro. Quando a
Encol, por exemplo, tomava dinheiro dos compradores para financiar obras passadas, estava
fazendo uma operação "bancária" perversa, não sujeita a qualquer regulação pelo BC ou pela
CVM. Um órgão independente
poderia ter um amplo leque de
ação e criar, por exemplo, regras
por produtos assemelhados, em
vez de olhar apenas o mercado
por tipo de instituição.
De outro lado, contudo, seria
vital que o órgão supervisor tivesse independência para agir, lembra Loyola. Além do problema
prático de montar uma nova estrutura, seria preciso definir muito bem o aparato institucional de
seu funcionamento.
Muitos acham, contudo, que o
ponto mais relevante é outro. Enquanto o BC for o emprestador de
última instância, vai querer controlar a qualidade dos bancos para
os quais, se houver problemas, terá que emprestar.
Uma solução radical para isso
foi proposta pelo professor Charles
Goodhart, membro do Comitê de
Política Monetária do Reino Unido. Goodhart é a favor de que se
retirem do BC não só as funções de
supervisão e regulação, mas também a de emprestador de última
instância.
Se, no fundo, trata-se de usar dinheiro público para evitar o risco
de uma crise sistêmica, então o
melhor é transferir essa função,
diretamente, para o Ministério da
Fazenda. O dinheiro que eventualmente fosse usado para ajudar os bancos teria que sair do Orçamento, de forma transparente.
Sabe-se que o presidente do BC,
Armínio Fraga, gosta da idéia,
ainda que apenas no contexto do
debate acadêmico por ela levantado.
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