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Grampo sugere tráfico de influência no STJ
Advogado Roberto Bertholdo é acusado de cobrar de um cliente R$ 715 mil para obter decisões favoráveis do tribunal
Candidato ao Senado pelo Paraná pagou seu suplente para conseguir um habeas corpus no tribunal capaz de trancar uma ação contra ele
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL
Conversas captadas por
grampos autorizados pela Justiça do Paraná sugerem tráfico
de influência para obtenção de
medidas favoráveis no STJ (Superior Tribunal de Justiça).
As interceptações constam
de processo que tramita sob sigilo no TRF (Tribunal Regional
Federal) da 4ª Região, em Porto
Alegre (RS). Há indícios de que
o advogado Roberto Bertholdo,
44, usou de suposta proximidade com ministros do STJ para
receber pelo menos R$ 715 mil
do seu ex-cliente Antônio Celso
Garcia, 52, o Tony Garcia, interessado em obter decisões favoráveis naquele tribunal.
Bertholdo foi assessor da liderança do PMDB no Congresso Nacional e conselheiro de
administração da usina hidrelétrica de Itaipu.
O advogado é acusado por
uma força-tarefa do Ministério
Público em quatro processos
diferentes por supostos tráfico
de influência e grampo ilegal.
O grosso das acusações veio
de gravações realizadas por
Tony Garcia e declarações de
um ex-sócio do advogado, Sérgio Renato Costa Filho.
Preso em 2003 por outra
acusação, Tony Garcia assinou
um acordo de delação premiada com a força-tarefa. Foi "posto em liberdade com objetivo
de colher provas" relativas às
investigações, segundo ofício
da Justiça Federal do Paraná.
Grampo ambulante
Garcia transformou-se num
grampo ambulante sob constante monitoramento da Polícia Federal
entre 2004 e 2005. Andava
com um gravador digital, recebeu da polícia e usava três telefones celulares grampeados o
tempo todo e autorizou a instalação de câmeras e gravadores
em sua casa e em seu escritório
em Curitiba (PR).
Com base nas gravações e depoimentos, o Ministério Público acusou Bertholdo de ter usado de suposta influência no STJ
em duas ocasiões. A primeira
teria ocorrido durante a campanha eleitoral de 2002. Garcia
disputou uma vaga no Senado,
e Bertholdo era seu suplente.
Garcia pretendia "limpar"
seu nome na Justiça. Para isso,
buscava um habeas corpus no
STJ que trancasse o processo
no qual era acusado de crime
contra o sistema financeiro por
suposto envolvimento numa
fraude do consórcio Garibaldi,
liqüidado pelo Banco Central
em 1994 por indícios de irregularidades.
Contatos
Segundo o depoimento prestado por Tony Garcia à Justiça
Federal, Bertholdo prometeu
usar seus contatos em Brasília.
"Ele [Bertholdo] falou que seria
para que o ministro desse o sobrestamento do processo. (...)
Que teria uma relação com o
ministro e que faria esse encaminhamento. Ainda perguntei:
"Mas isso é para o escritório, para sair uma coisa efetiva, ou é
uma suposição?" [Ele respondeu]: "Não, não. Essa é uma coisa que vai direto com o ministro, é assim que funciona Brasília, e essas coisas são conversadas, acertadas, e saem de acordo com o combinado'", relatou
Tony Garcia.
Bertholdo impetrou o habeas
corpus em favor de Garcia no
dia 1º de agosto de 2002. No dia
seguinte, o ministro Vicente
Leal, que deixou o STJ em
2004, despachou favoravelmente ao pedido.
"Com efeito, (...) a liminar foi
singelamente concedida de
próprio punho pelo ministro
Vicente Leal", diz a denúncia
assinada por cinco procuradores da República - Orlando
Martello Júnior, Vladimir Aras,
Deltan Dallagnol, Januário Paludo e Carlos Frederico dos
Santos Lima.
Segundo a denúncia, "acreditando que havia "comprado" o
ministro Vicente Leal, Antônio
Celso Garcia, no dia 8 de agosto
de 2002, determinou a emissão" de um cheque de R$ 600
mil. O dinheiro foi parar na
conta de uma empresa de Roberto Bertholdo.
Após o depósito, houve uma
série de saques em dinheiro em
nome de 18 pessoas. Bertholdo
retirou pessoalmente R$ 200
mil no dia 12 de agosto e outros
R$ 30 mil no dia 19.
À Justiça, Bertholdo alegou
que todo o dinheiro foi empregado na campanha eleitoral daquele ano.
Sem acusação
O ex-ministro Vicente Leal
foi afastado do STJ em abril de
2003 por uma suspeita de envolvimento com venda de decisões judiciais para narcotraficantes levantada pela Operação
Diamante, desencadeada pela
Polícia Federal. Um ano depois,
ele pediu e foi aposentado pelo
tribunal.
No processo que trata de
Bertholdo e Garcia, Vicente
Leal não foi acusado pelo Ministério Público. No processo,
não existem provas de que Leal
tenha recebido dinheiro.
De acordo com a denúncia, o
segundo momento em que Bertholdo teria traficado influência ocorreu entre fevereiro e
maio de 2004. O advogado teria
dito a Garcia que precisava de
dinheiro para garantir uma decisão favorável no julgamento
final do mesmo habeas corpus.
Bertholdo pediu R$ 180 mil a
Garcia. Numa conversa gravada por seu ex-sócio, Sérgio Renato Costa Filho, meses depois
do suposto pagamento, Bertholdo lembrou-se de ter recebido R$ 50 mil em espécie.
"Os 50 eu sei onde é que tá.
Os 50 tá num cofre escondido
que eu pus ele só naquele cofre.
(...) Numa caixinha. Esse eu
lembro."
Decisão cassada
No entanto, a turma do STJ
que analisou o pedido, formada
pelos ministros Paulo Galotti,
Paulo Medina e Hamilton Carvalhido, deu decisão contrária a
Garcia e Bertholdo. Com isso,
foi cassada a medida anterior
do ex-ministro Vicente Leal.
Para o Ministério Público, o
tráfico de influência já ficou caracterizado. "Tal estratagema
levou Antônio Celso Garcia a
acreditar no recebimento da
vantagem indevida por parte
dos ministros Paulo Galotti e
Paulo Medina", diz a denúncia
dos procuradores.
Nenhum dos ministros foi
acusado pelo Ministério Publico de envolvimento com a iniciativa de Bertholdo. No processo não há provas ou indícios
de que os ministros tenham recebido propina do advogado.
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