São Paulo, Sexta-feira, 18 de Junho de 1999
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GOVERNO
Campelo depõe durante cinco horas na Câmara e volta a negar acusações de tortura contra ex-padre em 70
Diretor coloca cargo na mão do Planalto

Sérgio Lima/Folha Imagem
O novo diretor da PF, João Batista Campelo, durante depoimento no qual se defendeu de acusações ontem


ABNOR GONDIM
da Sucursal de Brasília

O diretor-geral da Polícia Federal, João Batista Campelo, disse ontem, em depoimento de cinco horas na Comissão de Direitos Humanos da Câmara, que sua permanência no cargo está nas mãos do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Campelo respondeu a deputados que pediram a sua renúncia, como Vivaldo Barbosa (PDT-RJ) e Rita Camata (PMDB-ES), da mesma forma ao longo do depoimento.
"Aguardo a decisão do Planalto sobre a minha manutenção ou não no cargo porque dele (FHC) recebi o convite", disse Campelo. "Não aceito ter a minha moral e o meu passado vilipendiado."
Ele disse que sou "técnicas de entrevista" e não tortura para obter em 1970 a confissão do então padre José Antônio Monteiro sobre envolvimento em atividades subversivas.
Ao final do depoimento, o presidente da comissão, Nilmário Miranda (PT-MG), enviou carta a FHC pedindo a destituição de Campelo do cargo por estar convencido de sua culpa.
Campelo voltou a negar a acusação de ter participado de sessões de tortura contra o ex-padre.
O delegado foi nomeado no último dia 15, sob protesto do ministro Renan Calheiros (Justiça), do PMDB, contrário à sua escolha para o cargo. Calheiros pretendia manter no cargo o delegado Wantuir Jacini, que ocupava a função interinamente.
No depoimento assinado pelo ex-padre em agosto de 1970 consta que Monteiro confessou ao delegado Campelo sua participação na organização AP (Ação Popular). Essa entidade era combatida pelo regime militar (1964-85).
Dois meses depois, Monteiro afirmou à Justiça Militar que foi obrigado a assinar o documento após ter sido submetido a pau-de-arara e ameaçado de sofrer queimaduras pelos auxiliares de Campelo.
"Sem usar meios de tortura, como o sr. conseguiu convencer o ex-padre a assinar um depoimento em que se incriminava?", perguntou Marcos Rolim (PT-RS).
Resposta de Campelo: "É possível usar os meios legais para obter a informação que se pretenda". Segundo ele, essas "técnicas de entrevista e de interrogatório" são ensinadas aos policiais federais na Academia Nacional de Polícia.
"Os manuais (de interrogatório) estão aí para ser usados", disse o delegado da PF, que já foi diretor da Academia Nacional de Polícia, responsável pela preparação dos candidatos aprovados em concursos públicos para a PF.
O depoimento de Campelo foi suspenso por quase 30 minutos, com a troca de insultos entre parlamentares pró e contra Campelo. Os defensores do diretor protestavam contra a divulgação prévia do parecer do presidente da Comissão de Direitos Humanos a favor da destituição do delegado.
Demonstrando surpresa, Campelo disse que havia acabado de ler o voto do Nilmário Miranda e que se sentia "constrangido". O documento foi divulgado anteontem após o depoimento do ex-padre José Antônio Monteiro.
Miranda retirou seu voto para amenizar o protesto, mas decidiu enviar carta ao presidente da República.
Segundo Miranda, o envolvimento de Campelo está comprovado pelo fato de ele ter presidido o inquérito policial: "Portanto, (Campelo) comandou e teve ciência de todos os atos relativos ao inquérito, inclusive das sessões de tortura e coação física e moral contra testemunhas e acusados".
"Senhores, eu estou condenado", disse o novo diretor da PF, lendo o texto do voto de Miranda.
Os aliados do novo diretor da PF se rebelaram e a sessão foi paralisada. Em protesto, o deputado Elton Rohnelt (PFL-RR), principal defensor de Campelo, alegou que não haveria mais depoimento porque a decisão final já havia sido tomada pelo presidente da comissão.
Após deixar o plenário e conversar com seus aliados, o próprio Campelo decidiu retomar o depoimento.
Após depor, sempre ao lado de um advogado particular, Campelo exibiu duas ações judiciais que irá mover contra o ex-padre.


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