São Paulo, Sexta-feira, 18 de Junho de 1999
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CELSO PINTO
Os juros podem cair

A pressão recente sobre a taxa de câmbio, que amainou nos últimos dias, mas pode voltar, recolocou a discussão sobre até onde irá a disposição do Banco Central em continuar reduzindo as taxas de juros.
O presidente do BC, Armínio Fraga, tem sustentado, com firmeza, que, enquanto a inflação continuar sob controle, os juros continuarão a cair. Ele admite que, se ocorrer a rodada de alta nos juros americanos, ela poderá afetar o fluxo de dólares para os países emergentes, inclusive o Brasil.
Se ficar mais difícil captar dólares, a pressão sobre o câmbio pode aumentar. Ainda que esse cenário se confirme, contudo, Armínio insiste que, enquanto o câmbio não exercer alguma pressão inflacionária, não haverá razões para subir os juros internos.
Para sair do sufoco que acompanhou os primeiros meses da livre flutuação cambial, o BC não hesitou em atrair capitais de curto prazo, oferecendo vantagens fiscais temporárias. A entrada desse capital ajudou muito a aliviar a cotação do real frente ao dólar e acelerou a restauração de alguma credibilidade externa.
Se a situação complicar, o BC poderia voltar a recorrer a esses capitais? Armínio reafirma que o país não deve depender de capitais de curto prazo e o incentivo fiscal a essas aplicações acaba no início de julho.
Existe uma boa razão para a firmeza do BC nessa questão. A livre flutuação é uma recém-nascida no Brasil e é natural que haja dúvidas no mercado em relação à postura do BC.
Em tese, a política do BC deve ser clara. Com o câmbio livre, a política monetária, ou seja, as taxas de juros, deve ser guiada pelos objetivos internos e não externos, como acontecia com o regime de câmbio controlado anterior.
Antes, os juros iam para o espaço para tentar atrair dólares para sustentar a taxa de câmbio. Agora, os juros devem seguir a lógica da economia: se o quadro é de recessão e baixíssima pressão inflacionária, como o atual, então os juros devem cair. É o que está dizendo Armínio.
O problema é que a reação da balança comercial, até agora, está longe de conseguir equilibrar as contas externas. O Brasil continua precisando da entrada de capitais para zerar suas contas, caso contrário, o dólar vai subir.
A pressão cambial deste mês já era esperada, dado o alto volume de vencimentos externos. Essa pressão não acabou. Dos US$ 2,8 bilhões em amortizações previstas, ainda vencerá US$ 1,2 bilhão até o fim do mês. A emissão de eurobônus por empresas brasileiras está virtualmente parada, com as incertezas em relação aos juros americanos.
Além disso, a saída de capitais especulativos de curto prazo neste mês deve ser expressiva. O estoque dessas aplicações estava em US$ 2,6 bilhões no dia 7 de junho. Não vai cair a zero: mesmo no pior da crise cambial, o estoque não caiu abaixo de US$ 1,3 bilhão. De todo modo, deve sair mais de US$ 1,5 bilhão no mês.
Julho não será muito melhor. Estão previstas amortizações de US$ 3,9 bilhões, e as colocações de papéis devem continuar difíceis.
O BC ainda tem uma margem razoável de intervenção no mercado dentro do acordo com o FMI (US$ 1,9 bilhão neste mês), mas tem evitado, até agora, entrar pesado. Provavelmente só vai fazê-lo se algum fator, externo ou interno, levar a uma oscilação claramente exagerada.
Tudo indica, portanto, que o BC vai anunciar um novo corte dos juros na reunião do Conselho de Política Monetária (Copom) na quarta-feira que vem, talvez para 20% ou 21%. Como a pressão de vencimentos externos será muito menor a partir de agosto, existe uma chance razoável de a pressão sobre o câmbio não fugir de controle.
Se a economia começar a se recuperar de forma mais significativa no segundo semestre, contudo, o quadro pode complicar. Com menos capacidade ociosa, subidas mais fortes no câmbio poderão refletir alguma pressão inflacionária e abortar o movimento desejado de trazer os juros reais (acima da inflação) para 10% no fim do ano.
Existem duas maneiras de evitar isso. Uma seria aumentar a entrada de recursos mais estáveis, o que depende de um cenário externo razoável e de credibilidade interna crescente (algo que a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal e/ou da reforma tributária poderia assegurar). Outra seria contar com um salto nas exportações que cobrisse o buraco externo, algo virtualmente impossível neste ano.


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