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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ FUNDOS DE PENSÃO
Correspondências enviadas por executiva do Citigroup a ministro abordam negociações sobre acordo de acionistas da Brasil Telecom
Cartas sinalizam que Palocci participava de decisões de fundos
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Cartas e um encontro de executivos do Citigroup com o ministro
Antonio Palocci (Fazenda) e
mensagens do banqueiro Daniel
Dantas (Opportunity) para a instituição financeira americana indicam que os negócios dos fundos
de pensão eram questão de governo para a gestão do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva.
Conforme a Folha publicou no
último dia 4, e-mails de Dantas
para a ex-vice-presidente do CVC
(Citibank Capital Venture) Mary
Lynn Putney revelaram a ingerência do Planalto sobre as três grandes fundações estatais de previdência (Previ, Petros e Funcef),
todas presididas por petistas.
Nas correspondências, de maio
de 2003, anexadas por advogados
de Dantas a processo que corre na
Justiça americana, o dono do Opportunity conta como o então ministro José Dirceu (Casa Civil) e o
presidente do Banco do Brasil na
época, Cássio Casseb, foram escalados para pressioná-lo a deixar o
controle da Brasil Telecom.
Novas cartas apontam que Palocci, a quem Casseb estava subordinado, também participava
das discussões sobre o acordo de
acionistas da Brasil Telecom, o
que reforça a tese da influência do
governo sobre os assuntos dos
fundos de pensão.
"Estou escrevendo para esclarecer a posição do Citigroup em relação a seus investimentos por
meio do Fundo CVC Opportunity
na Telemig Celular, Amazônia
(Celular) e Sanepar. Estamos
muito preocupados com os recentes ataques aos acordos de
acionistas na Newtel e na Sanepar.
Os acordos de acionistas são cruciais para proteger os investimentos do Citigroup nessas companhias", escreveu Putney a Palocci
em 27 de fevereiro de 2003.
Parceria
No governo do ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso, o
Citibank, por meio do CVC (braço do grupo para investimentos
em outros países), fechou parceria com o Opportunity para comprar empresas brasileiras no processo de privatização. Com a gestão nas mãos de Dantas, criaram o
fundo CVC Opportunity, no qual
os fundos de pensão investiram.
Apesar de ter menos de 10% das
ações -contra cerca de 45% do
Citibank e 45% dos fundos de
pensão-, o banco de Dantas passou a controlar a Brasil Telecom
em razão de uma série de intrincados acordos e contratos judiciais. O Opportunity assumiu o
comando também da Telemig
Celular e Amazônia Celular, por
meio da Newtel (empresa de participações), e da Sanepar (companhia de saneamento do Paraná)
-nos três casos, a partir de investimentos do CVC Opportunity.
Na mesma mensagem de 27 de
fevereiro de 2003, Putney diz a Palocci que, se os contratos de acionistas da Newtel e da Sanepar não
fossem honrados, os investimentos do banco na Telemig Celular,
Amazônia Celular e Sanepar seriam "substancialmente prejudicados". "Além disso, se esse precedente se configurar, todos os
nossos investimentos e nossa
operação [no país] serão enfraquecidos", completou.
Em 11 de abril, Putney enviou
outro e-mail ao ministro, reforçando a posição da mensagem
anterior e lembrando que, por
meio do CVC Opportunity, o
banco americano havia investido
mais de US$ 700 milhões no país.
No dia 5 de março, Dantas escreveu para Putney relatando
conversa que tivera com Dirceu
dias antes, quando o então ministro teria pedido a ele para deixar o
comando da Brasil Telecom. Na
mesma mensagem à executiva do
Citi, o dono do Opportunity conta
que Casseb havia informado a Palocci que a carta dela ao ministro
havia sido "desautorizada".
Segundo a Folha apurou, Putney, que se aposentou do Citi no
final de 2004, escrevera a Palocci
por conta própria, sem cumprir
procedimento interno da instituição que pressupunha submeter a
carta a outras instâncias do banco. Ao saber disso, Casseb, que foi
vice-presidente do Citibank no
Brasil, deu a notícia ao ministro,
considerando que a mensagem
havia sido "desautorizada".
Por meio da assessoria do BB,
Casseb informou que todas as
ações dele "sempre foram nos
melhores interesses da Previ",
uma vez que presidia o BB, patrocinador do fundo de pensão dos
funcionários da instituição. Casseb deixou o banco em 2004.
Encontro
No dia 2 de dezembro do ano
passado, uma quinta-feira, o ministro Palocci teve um encontro
em São Paulo com o executivo do
Citi Paulo Caldeira. Segundo a
Folha apurou, eles trataram dos
acordos do Citi e do Opportunity
com os fundos de pensão.
Iria também para esse encontro
o número dois mundial do Citi,
Mike Carpenter, que chefia o
CVC. Carpenter, no entanto, teve
um problema de última hora e
não pôde comparecer.
Um ano antes, no dia 18 de setembro de 2003, o então ministro
Dirceu também recebera Carpenter no Planalto, acompanhado do
presidente do Citibank no Brasil,
Gustavo Marin. Segundo a assessoria de Dirceu, o encontro foi a
pedido do executivo.
Apesar de patrocinadas por empresas estatais federais, Previ, Petros (Petrobras) e Funcef (Caixa
Econômica Federal) são consideradas entidades de direito privado. Pertencem aos participantes
(funcionários da ativa, aposentados e pensionistas), que contribuem ou que contribuíram com
os fundos. O governo não deveria
intervir nem direcionar os investimentos dessas fundações.
Disputa
O governo sempre negou que
interferisse nos assuntos dos fundos de pensão. As correspondências e os encontros de Dantas e de
executivos do Citibank com a alta
cúpula do governo, porém, apontam para a direção contrária.
A briga entre os fundos e o Opportunity pelo controle da Brasil
Telecom se arrasta desde 1999. A
partir de 2003, no entanto, Dantas
sofreu uma enorme ofensiva do
governo e dos fundos, que, entre o
final de 2004 e o início de 2005, levaram o Citibank para seu lado.
Os americanos conseguiram
destituir Dantas do controle da
Brasil Telecom na Justiça de Nova
York. Decisões no Brasil também
afastaram o brasileiro do comando da telefônica neste ano.
Os fundos assinaram um acordo com o Citi pelo qual passam a
controlar a Brasil Telecom. Em
troca, se comprometem a adquirir a participação do Citi na companhia por R$ 1 bilhão se até outubro de 2007 os dois lados não
encontrarem comprador comum
para o capital da empresa.
Para tentar desfazer a decisão
tomada pela Justiça americana, os
advogados do Opportunity nos
EUA entraram com recurso na
corte de Nova York. No texto,
afirmam que o acordo do Citibank com os fundos de pensão
contou com o apoio de uma autoridade "do mais alto nível do governo brasileiro".
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