São Paulo, sexta, 18 de setembro de 1998

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JANIO DE FREITAS
Benefício e prejuízo

"A imprensa", quer dizer, jornais, revistas, rádios e TVs, foi acusada de mau comportamento pela oposição e pelo governo. Ambos com e sem razão.
O tratamento discriminatório de que Luiz Inácio Lula da Silva se sente vítima nem precisa, por tão óbvio e grosseiro, ser discutido sob qualquer ponto de vista. Vale, sozinho, por uma condenação de máximo grau a todos os meios de comunicação.
Faltasse ainda uma última demonstração do comportamento de facção política adotado pela mídia na disputa (re)eleitoral, estaria ela no evento mesmo em que Lula fez o seu sentido discurso sobre a discriminação. Foi a instalação, com um almoço na quarta-feira, do Conselho Político que, se eleito, incorporaria ao seu governo. Uma centena de figuras de grande proeminência nacional, abrangendo todos os ramos importantes de atividade.
Nos meios de comunicação, os que não minimizaram o evento, expressivo sob vários aspectos, simplesmente o omitiram. Tal como, três dias antes, foi feito com a numerosa relação de intelectuais e artistas que apóiam Lula.
É claro que o comportamento maciço da mídia causa prejuízo imenso à candidatura de Lula. E nem é outra a sua intenção. Mas não é a essa forma de imoralização da democracia eleitoral à brasileira que se deva atribuir o insucesso da campanha de Lula.
A campanha não achou o tom, o teor e o sentido. Não compreendeu o quanto há de ilusionismo no apoio angariado por Fernando Henrique e o quanto esse ilusionismo, como qualquer outro, estaria vulnerável à dissecação didática dos capacitados, por sua reconhecida autoridade, a fazê-lo para o grande público.
Agora, a acusação governista. Ministro das Comunicações por força da ingravidade do governo, o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros acusou "a imprensa" de deturpar os acontecimentos financeiros atuais. Em luta com os cachimbos típicos de novo-rico, que não sabe escolher e não aprendeu a fumar, Mendonça de Barros dirige a ira para o caráter de crise dado aos acontecimentos, como se houvesse "um quase fim de mundo".
Tem razão. Mas o "quase" já atrapalha um pouco a sua frase. Pois o próprio Mendonça de Barros considera, pelo que diz ler em uma revista não ressalvada em sua crítica à "imprensa do mundo todo", estar havendo apenas "um fim de ciclo de dez anos de crescimento numa parte importante do mundo, que é (sic) os Estados Unidos e parte da Europa". Como as outras partes nem tiveram o necessário crescimento nos dez anos, então seria mesmo o fim, que o mau cachimbo do mau fumante não deixa ver.
Já no que respeita à "imprensa" da casa, Mendonça, outra vez, tem razão e não tem. O esforço de minimizar, ainda que só pelo linguajar cabalístico, os fatos que ferem o Brasil deturpa, sim, a exposição da realidade. Mas o resultado disso é em benefício do presidente-candidato que fez de Mendonça ministro e do candidato-presidente que dará a Mendonça um ministério mais importante, no previsto segundo mandato. Logo, Mendonça é também beneficiário da "imprensa" deformante.
Não só os maus cachimbos, mas também a ingratidão faz a boca torta.



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