São Paulo, sexta-feira, 18 de outubro de 2002

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AGENDA DA TRANSIÇÃO/INFLAÇÃO E DÍVIDA PÚBLICA

Em dezembro de 1994, pouco antes de FHC assumir o governo, a dívida pública estava em R$ 153,16 bilhões, ou 30,4% do PIB; em agosto deste ano, o endividamento chegou a R$ 784,61 bilhões, equivalentes a 58,3% do PIB

Inflação contida por juros leva a explosão da dívida pública

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os elevados juros praticados desde a implantação do Plano Real, em julho de 1994, foram os principais responsáveis pelo comportamento explosivo registrado pela dívida pública durante o governo Fernando Henrique Cardoso.
Juntos, União, Estados, municípios e empresas estatais acumularam o endividamento mais elevado de que se tem notícia nos dias de hoje.
Além dos juros, a alta do dólar e o reconhecimento de "esqueletos" também colaboraram para elevar o endividamento. O dinheiro arrecadado com as privatizações ocorridas durante o governo FHC não foi suficiente para impedir o aumento da dívida.
Em dezembro de 1994, antes de FHC assumir seu primeiro mandato, a dívida líquida do setor público era de R$ 153,16 bilhões, o equivalente a 30,4% do PIB (Produto Interno Bruto, conjunto de riquezas produzidas por um país). Em agosto deste ano, o endividamento chegou a R$ 784,61 bilhões -ou 58,3% do PIB.

Juros
Após a implantação do Real, o controle da inflação foi feito com base na chamada âncora cambial. O governo controlava a cotação do dólar, que era mantida próxima de R$ 1. Essa estratégia foi adotada durante todo o primeiro mandato de FHC (95/98).
Os problemas surgiram quando as crises financeiras trouxeram pânico aos mercados internacionais. Turbulências como as que se abateram sobre o Sudeste Asiático, em 1997, e sobre a Rússia, em 1998, despertaram a desconfiança dos bancos em relação aos países emergentes.
Para evitar que investidores estrangeiros retirassem os dólares aplicados no Brasil -o que desmontaria o sistema de câmbio controlado-, o governo elevou os juros a níveis estratosféricos.
A taxa chegou a ficar acima de 40% ao ano no auge das crises. O resultado disso é que, ao pagar juros elevados, a dívida do governo crescia cada dia mais.
O economista Sérgio Werlang, ex-diretor do Banco Central e atual diretor do banco Itaú, diz que esse problema poderia ter sido evitado se o regime de câmbio flutuante tivesse sido adotado com mais rapidez. "Em meados de 1995 já dava para fazer isso", afirma.
A situação foi agravada pelo desequilíbrio fiscal observado no período. O superávit primário (economia para o pagamento de juros), hoje enaltecido pela equipe econômica, não existiu no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso. O governo gastava mais do que arrecadava e acabou acumulando déficit primário de R$ 7 bilhões entre 1995 e 1998.
Resultado: incapaz de arrecadar dinheiro suficiente para pagar os juros que incidiam sobre sua dívida, o governo recorria a novos empréstimos para conseguir pagar esses juros. Os novos empréstimos, por sua vez, geravam a necessidade de mais gastos com juros, criando um círculo vicioso que elevava a dívida sempre mais e exigia mais dinheiro para pagá-la. Como obter recursos para rolar essa dívida? Mantendo os juros altos.

Ajuste
Porém, depois que a moratória da Rússia, em 1998, trouxe pânico aos mercados financeiros, o Brasil passou a enfrentar dificuldades para conseguir empréstimos para financiar o déficit público. Foi então que o governo decidiu fazer um ajuste fiscal emergencial, baseado principalmente no aumento de impostos.
O objetivo era obter resultados fiscais primários positivos -da ordem de 3% do PIB- para que a relação entre dívida e PIB se estabilizasse em 46,5% até o final de 2001.
Na ocasião, também foi fechado o primeiro acordo do governo FHC com o FMI (Fundo Monetário Internacional), que pôs US$ 41,5 bilhões à disposição do país. O acordo iria se encerrar três anos depois, quando a dívida já deveria estar sob controle, mas continua a vigorar até hoje.
O objetivo de estabilizar a dívida nunca foi alcançado, em grande parte por causa da desvalorização do real ocorrida nos anos seguintes. Logo nas primeiras semanas do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, o governo se viu obrigado, pelo mercado, a adotar o regime de câmbio flutuante.
Desde então, a alta do dólar tem ajudado a levar o endividamento do governo a níveis recordes. Atualmente, cerca de 50% da dívida líquida do setor público é corrigida pela variação do câmbio. Entre janeiro de 1995 e agosto de 2002, a desvalorização do real causou aumento de R$ 207,74 bilhões na dívida.



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