São Paulo, sexta-feira, 18 de outubro de 2002

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PT prevê juro menor e PIB maior já em 2003

A redução da inflação nos anos FHC tem relação com os aumentos dos juros e da dívida pública?
A inflação caiu logo no início do primeiro governo Cardoso devido à eliminação dos indexadores e à introdução de uma nova moeda, o real, na qual a sociedade depositava confiança. Assim foi eliminada a inércia que transmitia a inflação de um mês para o outro, através dos índices de correção.
Nos primeiros meses do Real foi necessário manter juros elevados, para moderar o consumo, que costuma se elevar quando ocorre uma redução brusca da inflação. Porém, uma vez desmontada essa pressão inicial, teria sido possível moderar as taxas de juros. Mas eles foram mantidos elevados para atrair capitais externos e cobrir os déficits das contas externas, gerados por uma abertura indiscriminada e uma sobrevalorização prolongada do real.

A fim de conter o crescimento da inflação, é preciso que o governo se aproxime ainda mais do equilíbrio entre suas despesas e receitas? É preciso cortar gastos em que setor do governo?
O crescimento da inflação no segundo mandato do presidente Cardoso não tem nada a ver com a relação entre receita e despesa do governo, mesmo porque foi nesse período que o Orçamento alcançou os maiores superávits primários. Na verdade, os preços subiram principalmente nos momentos de alta do dólar e de desvalorização do real, em 99, depois em 2001 e agora no final de 2002.
Trata-se, portanto, de uma pressão inflacionária causada pelos preços de energia, telecomunicações, gás e demais setores de serviços públicos, com preços administrados. Essas tarifas, por descuido do governo, são corrigidas pelo IGP-M, que tem forte indexação ao dólar. Deve-se também à alta da gasolina, assim como das chamadas commodities, como trigo, soja, milho e outras mercadorias comercializadas em dólares no mercado internacional, que são matéria-prima para o pão, farinha, massas e outros produtos de alto consumo.
Para reduzir a inflação é preciso criar as condições para que o dólar caia, o que pode ser conseguido mediante a geração de maiores saldos comerciais e a diminuição da vulnerabilidade da economia. Independentemente da questão inflacionária, é possível reduzir despesas, de modo a aumentar os recursos disponíveis para investimentos e projetos sociais.
Uma das despesas que mais oneram os cofres púbicos é a conta de juros -ou o serviço da dívida pública-, que pode cair com a redução gradativa da taxa básica de juros. A conta de juros a ser paga apenas pela União em 2003 é da ordem de quase R$ 70 bilhões, o que corresponde a duas vezes o orçamento da Saúde e mais duas vezes os gastos da Educação, tudo somado. A racionalização dos gastos com obras, aquisição de material de consumo e contratação de serviços do governo, mediante o aperfeiçoamento das licitações, compras via internet e sobretudo com a erradicação de desvios e da corrupção, podem render mais recursos.

É possível cumprir a meta de inflação de 2003 e baixar os juros ainda no primeiro semestre de 2003?
A meta de inflação para 2003, estabelecida em 4%, já é dada como superada pela maioria dos analistas, que trabalham com a previsão de 5,5% do IPCA. Como de costume, o Banco Central trabalha com metas irrealistas, excessivamente baixas pelas condições da economia brasileira, que são ultrapassadas sistematicamente, o que leva o Copom a praticar juros acima do necessário.
A economia continua funcionando com taxas de juros exageradamente elevadas, mais do que suficientes para manter a inflação sobre controle. A rigor, não há pressão de demanda na economia, porque o mercado consumidor está deprimido pela compressão da renda dos brasileiros.

Como conciliar a retomada do crescimento ainda em 2003, o controle da inflação, o aumento dos gastos públicos devido à alta recente dos juros e do dólar e o cenário provável de crédito ainda restrito para o país, que deve impedir uma valorização do real?
Essa pressão inflacionária que vem do câmbio vai ceder quando o novo governo restaurar a credibilidade perdida da economia brasileira, reduzir a vulnerabilidade e diminuir a nossa dependência de capitais externos. Com uma política mais eficiente de comércio exterior e fortes estímulos à produção brasileira, é possível, já no próximo ano, alcançar superávits comerciais acima de US$ 15 bilhões e inverter a trajetória ascendente do dólar. Nessas condições, a inflação perderá seu combustível principal e deverá se acomodar num patamar menor que a de 2002, possibilitando crescimento de 3% a 3,5% em 2003.


Guido Mantega é assessor econômico de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), professor da Fundação Getúlio Vargas e respondeu às questões da Folha pelo candidato de seu partido.



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