São Paulo, Quarta-feira, 19 de Janeiro de 2000


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GOVERNO
Ato dependeu de ajustes
Queda de Alvares era questão de tempo

ELIANE CANTANHÊDE
Diretora da Sucursal de Brasília

O ministro demissionário Elcio Alvares entrou "morto" em 2000. Na linguagem de Brasília, ou do poder, significa que já não tinha condições e sustentação para se manter num cargo tão delicado quanto o Ministério da Defesa.
Em pouco mais de duas semanas, Alvares almoçou três vezes com os três comandantes militares (Exército, Marinha e Aeronáutica). Desde os primeiros dias do ano, porém, sua saída era apenas uma questão de tempo e de ajustes.
Setores políticos do governo temiam que seu afastamento fosse interpretado como uma vitória dos militares, porque ele foi o pivô da demissão do então comandante da Aeronáutica, brigadeiro Walter Bräuer.
Além disso, o presidente Fernando Henrique Cardoso enfrentou enormes dificuldades para chegar a um substituto. Ele demorou cinco anos para enfim criar o Ministério da Defesa. Não queria errar na escolha do ministro pela segunda vez.
FHC esperou o quanto pôde que o próprio Alvares pedisse demissão. Como ele não tomava a iniciativa, passou a enviar sinais evidentes nesse sentido. Uma nota divulgada anteontem pelo ministro José Carlos Dias (Justiça), reclamando de uma entrevista de Alvares, foi o último desses sinais.
No final de 1999, interlocutores do presidente já falavam abertamente nos nomes mais prováveis para o lugar de Alvares.
Um deles era o do embaixador Celso Lafer. FHC sente-se em falta com ele, um amigo pessoal, por tê-lo tirado do Ministério do Desenvolvimento meses depois da posse.
Lafer foi descartado porque seu discurso acadêmico e seu perfil de diplomata não combinariam com o temperamento objetivo e pragmático dos militares -de quem seria o superior imediato. Argumento semelhante foi usado contra o embaixador Ronaldo Sardenberg, ministro de Ciência e Tecnologia.
FHC passou então a dar preferência para um jurista renomado e sem vínculos partidários. Fixou-se, inicialmente, no ex-ministro da Justiça Célio Borja e nos ministros Sidney Sanches e Nelson Jobim, do Supremo Tribunal Federal.
Rapidamente, políticos ligados ao presidente lembraram a ele da passagem de Borja pelo governo de Fernando Collor de Mello e apuraram que seria muito difícil tirar algum dos ministros do Supremo.
No tribunal, eles têm autonomia, recessos e cargos vitalícios (são indemissíveis). O que optasse pelo Executivo ficaria subordinado ao presidente e tendo que administrar queixas, reivindicações e algumas mágoas de uma área peculiar, sobretudo da Aeronáutica.
O escolhido afinal, Geraldo Quintão, atual Advogado Geral da União, tem duas vantagens: já está dentro do esquema de poder e conhece bem os assuntos mais polêmicos e mais urgentes da Defesa, que são a criação da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), o novo Código Brasileiro do Ar e a venda de 20% das ações da ex-estatal Embraer para um consórcio de quatro empresas francesas.
Apesar das dificuldades, a demissão de Alvares se precipitou com a sua entrevista à revista "Época", insinuando que o ministro José Serra (Saúde) era um dos articuladores da sua queda e usando o ministro Dias (Justiça) para justificar que advogados não exatamente escolhem clientes.
A saída de Alvares poderia ter sido qualquer dia, qualquer momento. Foi ontem, como poderia ser hoje ou durante o Carnaval.


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