São Paulo, sexta-feira, 19 de maio de 2000


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REGIME MILITAR
Arquivos dos EUA dizem que país teria optado por dar equipamentos
Para CIA, participação do Brasil na Condor foi lateral

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

Na visão dos agentes norte-americanos na América Latina na década de 70, o Brasil participou com restrições e teve uma atuação limitada da Operação Condor -o acordo feito em 1975 pelas ditaduras militares da região para trocar informações sobre atividades "subversivas" e perseguir opositores dos regimes militares da época.
É o que revelam os documentos dos EUA sobre a ditadura chilena tornados públicos no ano passado. Eles indicam que, embora tenha aceitado juntar-se ao acordo original entre Chile e Argentina para fundar essa parceria, o governo brasileiro teria se oposto inicialmente à realização de assassinatos na Europa e não demonstrava tanto ânimo com suas atividades quanto seus parceiros do Cone Sul.
Como exemplo disso, segundo os EUA, o Brasil teria decidido, ao menos no início, ficar de fora das "operações de ação" da Condor e se comprometido a fornecer equipamentos para a Condortel, a rede de comunicações que assessorava a ação conjunta das ditaduras.
Isso não significa que os EUA viam o Brasil como uma nação que não colaborava com seus vizinhos na caça a comunistas. Os EUA acreditavam que, no lado brasileiro, essa colaboração se dava no nível das relações bilaterais entre os países e não por meio da Condor.
O documento mais específico sobre a participação brasileira na Operação Condor é uma comunicação feita, no início de 1976, por agentes da CIA no Brasil para Washington.
"Apesar de ter aderido ao acordo original entre Argentina, Uruguai, Chile, Bolívia e Paraguai para cooperar na troca de informações sobre terrorismo e subversão, (o Brasil) ainda não concordou em participar das operações de ação na Europa e limitaria sua contribuição, no momento, ao fornecimento de equipamentos de comunicação para a Condortel, a rede de comunicação estabelecida pelos países da Condor."
A Condortel era uma subdivisão da Operação Condor responsável por aparelhar os países latino-americanos com equipamentos que viabilizassem a troca de informações e ações sem que fosse preciso requisitar o aparato oficial. A CIA informou que o responsável pela Condortel era o coronel argentino Luiz Francisco Nigra.
A oposição brasileira teria acabado retardando o início das operação da Condor na Europa, como mostra o mesmo documento da CIA.
"Os países da Condor decidiram suspender seus planos de operar na Europa e promover um curso de treinamento em Buenos Aires para os oficiais da Condor que ficariam na Europa até o Brasil decidir se irá participar com os outros da operação, ...(divulgação censurada), que deverá ser sediada na França."
Não existem papéis indicando se o Brasil acabou mais tarde mudando de idéia. Em agosto de 1976, outra comunicação secreta da CIA alerta o governo dos EUA que "os serviços uruguaios, argentinos e chilenos planejam treinar grupos em Buenos Aires para missões na Europa Ocidental. Os planos e metas não serão informados a pelo menos alguns líderes governamentais. A maior concentração de exilados latino-americanos na Europa fica em Paris".
Entre as vítimas conhecidas de ações das ditaduras latino-americanas no mundo está o fundador do Partido Democrata Cristão chileno, Bernardo Leighton, que sofreu um atentado em Roma em outubro de 1975.

Reservas
O ânimo reduzido do Brasil com a Operação Condor é indicado em vários comunicados e publicações periódicas internas norte-americanas.
No primeiro, um relatório semanal do Departamento de Estado dos EUA (datado de outubro de 1976) sobre a cooperação entre os regimes militares da América do Sul, informa-se: "Brasil e Bolívia estão começando a participar (da Condor), mas têm reservas, por uma ou outra razão. O ímpeto original para a cooperação entre os países do Cone Sul provavelmente veio do Chile...O grupo atual (Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai) espera trazer o Brasil para dentro do acordo".
Ao explicar ao governo dos EUA o que é a Operação Condor, outro documento, de setembro de 1976, feito por agentes do Departamento de Defesa dos EUA na Argentina, informa: " (A operação Condor) foi estabelecida recentemente entre serviços de inteligência da América do Sul com o objetivo de eliminar as atividades de terroristas marxistas em países membros, tendo sido dito que o Chile é o centro das operações. Outros membros participantes incluem: Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia. Além disso, o Brasil aparentemente concordou em fornecer informações para a Operação Condor. Os membros que mostram maior entusiasmo até agora foram a Argentina, o Uruguai e o Chile", afirma o texto dos agentes.


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