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MOHAMED EL-ERIAN
Americano cuida da área de emergentes de empresa dos EUA e direciona recursos para o país
Investidor se diz "feliz" em pôr dinheiro no Brasil
ROBERTO DIAS
DE NOVA YORK
O gráfico que rastreia o risco-país decerto virou motivo de comemoração em Brasília, mas o
nova-iorquino Mohamed El-Erian tem boas razões para partilhar um bocado da festa.
El-Erian, 44, trabalha na Pimco
(Pacific Investment Management
Company), a maior gerenciadora
de investimentos em títulos do
mundo, responsável pelo destino
de mais de US$ 300 bilhões.
Na empresa californiana, é ele
quem cuida da área de mercados
emergentes. Ou seja, olha para
países como o Brasil, do qual investidores cobram significativo
prêmio de risco para emprestar
seu dinheiro e do qual fogem ao
menor sinal de problema.
No ano passado, El-Erian desconsiderou um desses sinais de
problema -a eleição brasileira.
Enquanto investidores tentavam se livrar dos títulos do país e
falavam que investir no Brasil era
como apostar num cassino, ele
não só segurou seus papéis brasileiros como aproveitou para comprar mais.
"Nós fomos felizes de aumentar
nossa exposição [a papéis brasileiros] enquanto outros estavam
vendendo", diz El-Erian, um descendente de egípcios que fez carreira de 14 anos no FMI (Fundo
Monetário Internacional), de onde saiu em 1997.
Felicidade, no caso, pode ser
traduzida por 20,1%, a rentabilidade que os fundos que gerencia
tiveram neste ano.
Em suas mãos estão cinco dos
dez fundos para emergentes que
mais ganharam nos quatro primeiros meses do ano.
Com a mudança de ventos para
tais mercados, cada vez mais gente tem aplicado nesses países, e os
US$ 927 milhões diretamente sob
seu cuidado são mais que o dobro
do volume que tinha no ano passado -além desse dinheiro, do
qual é o gerente direto, El-Erian
também direciona investimentos
de outros fundos em emergentes.
O Brasil é o destino mais comum para suas aplicações: 26%
de sua carteira de investimentos é
usada para comprar dívida do
país. México, com 19%, e Rússia,
com 18%, vêm a seguir.
Em agosto passado, quando o
FMI preparava US$ 30 bilhões para entregar ao Brasil no maior pacote de ajuda de sua história, El-Erian estava com sua mulher no
Alasca, aproveitando as férias.
Lá, escreveu em artigo para
clientes da Pimco, aprendeu com
guardas florestais que intervenções no curso natural da história,
embora devam ser mínimas, às
vezes se mostram necessárias. Ao
voltar, citou a situação de um incêndio causado por um raio numa floresta e o momento vivido
pelo Brasil à época para concluir
que o pacote era
bem-vindo -avaliação contrária à
que fizera no caso
argentino um ano
antes.
Agora, volta a
usar a natureza para explicar o que
pensa dos mercados emergentes da
América Latina.
Enquanto gente
do peso do vice-presidente do Citigroup, William
Rhodes, diz que o
otimismo pode estar passando do
ponto, El-Erian indica que tal conclusão vale apenas
em parte e diz que
é chegado o momento de os investidores separarem os países de acordo com seus
méritos.
"Pense numa grande maré subindo. Inicialmente, ela levanta
todos os botes. Com o tempo, botes com buracos param de subir.
Os sólidos continuam subindo",
afirma o investidor, que coloca o
Brasil no segundo grupo.
Leia os principais trechos da entrevista.
Folha - Qual é a posição de seus
investimentos hoje na América Latina?
Mohamed El-Erian - Supervisionamos US$ 11 bilhões em títulos
de mercados emergentes. Nosso
fundo de investimento baseado
nos Estados Unidos cresceu de
US$ 440 milhões no começo do
ano para US$ 1,072 bilhão. Sua
versão off-shore também está tendo crescimento firme e agora soma US$ 132 milhões, comparados
a US$ 47 milhões no começo do
ano. Então, em ambos os casos,
houve duplicação do investimento sob nosso gerenciamento.
Em termos de nossa exposição
na América Latina, consistentemente com nossa avaliação dos
fundamentos, estamos acima da
recomendação [corrente no mercado] no Brasil, na Colômbia, no
México, no Panamá e no Peru. Estamos abaixo na Argentina, no
Uruguai e na Venezuela.
Folha - Em que vocês investem no Brasil?
El-Erian - Nossas
aplicações no Brasil
são um tanto diversificadas, refletindo
várias considerações
como a atratividade
dos títulos, possíveis
mudanças nas curvas [de rendimento]
e as condições técnicas do mercado.
Nós vemos um interesse crescente pelo Brasil depois da
saída desordenada
-e, na nossa opinião, excessiva- do
ano passado. Isso foi
ilustrado mais recentemente pelo largo interesse dos investidores pelos novos títulos
emitidos, vencendo em 2007.
O Banco Central e o ministério
têm feito um trabalho muito bom
em disseminar informação para
uma base crescente de investidores.
Como resultado, investidores
de outros setores estão aumentando sua exposição no Brasil, suplementando o efeito de investidores dedicados a isso.
Folha - Como o sr. procedeu durante o período da eleição?
El-Erian - Nós fomos felizes em
aumentar nossa exposição no
Brasil no verão passado [meados
de 2002] enquanto outros estavam vendendo. A decisão refletiu
a visão de que as
instituições brasileiras e o processo
de tomada de decisões eram fortes o
suficiente para
aguentar a pressão
do barulho político
e a saída dos bancos do mercado de
crédito -essa última em reação também às perdas que
tiveram com a
Enron, a WorldCom e a Argentina.
Temos continuado
a comprar Brasil de
acordo com os influxos que recebemos em nossos
fundos.
Folha - Há discussão no Brasil sobre os efeitos da valorização do real para o ajuste das
contas externas e, claro, o efeito
que isso pode ter na visão dos investidores. É possível que isso se
torne um buraco para o Brasil?
El-Erian - Animadoramente, o
debate no Brasil mudou de questões sobre sustentabilidade do débito para desafios de gerenciar sucessos. Um elemento aqui é valorização da moeda.
Nos níveis atuais, o real não
ameaça de maneira significativa
as contas externas, especialmente
se o governo progredir em reformas estruturais que tenham o objetivo de melhorar a poupança
doméstica e melhorar a competitividade. Enquanto
isso, ajuda no front
da inflação e facilita
um corte nas taxas
de juros consistente
com as expectativas
de inflação e de novos fluxos de capital.
Folha - Os ganhos
de fundos que investem na América Latina podem estar chegando ao fim?
El-Erian - Os ganhos têm sido dirigidos por dois fatores.
Primeiro, e mais
importante, melhoras significativas na
avaliação de crédito
devido a políticas
adequadas; esse é particularmente o caso do Brasil.
O segundo fator, que também
agiu para generalizar a corrida para virtualmente todos os países da
América Latina, é o forte fluxo de
fundos com novos investidores
para os mercados emergentes. Esse fluxo reflete fatores tanto de repulsão quanto de atração: as melhoras políticas têm puxado grandes investidores, enquanto as baixas taxas de juros no países industrializados têm empurrado os
fundos a procurar os retornos
mais altos da América Latina.
Acreditamos que ambos os fatores seguem em vigor, resultando em mais ganhos. Dito isso,
também acreditamos que haverá
grande diferenciação, com países
como a Venezuela sendo incapazes de seguir participando dos ganhos por causa de suas fraquezas.
Pense numa grande maré subindo. Inicialmente, ela levanta
todos os botes. Com o tempo, botes com buracos -países com
problemas em seus fundamentos
como a Argentina e a Venezuela- param de subir. Os botes sólidos -como Brasil e México-
continuam subindo com a maré.
Folha - Quanto tempo vai durar
esta maré?
El-Erian - Há dois componentes.
O primeiro é sustentável e reflete
uma realocação estrutural de renda variável para renda fixa e, dentro da renda fixa, para os títulos
de mercados
emergentes. O segundo vai ser invertido em algum
momento e é dirigido pelos fundos
de "hedge", aproveitando o que é
conhecido como
"momentum trade" -pode ser facilmente mudado.
No final, o primeiro efeito é muito
mais importante
do que o segundo,
resultando num
aumento da base
de investidores em
dívida latino-americana.
Folha - Como os
mercados vão ser
separados?
El-Erian - Os barcos sólidos na
América Latina se dividem em
dois grupos. O primeiro tem volatilidade relativamente baixa e créditos de mais baixa rentabilidade
como México e Panamá. O segundo grupo inclui os mais voláteis,
mas de maior rentabilidade, como Brasil, Colômbia e Peru. Há
um terceiro grupo no qual os investidores enfrentam um risco
significativo de colapso nos valores. Inclui Argentina e Venezuela.
Folha - Quais os problemas dos
países com "buracos"?
El-Erian - O valor dos investimentos venezuelanos tem risco
significativo de queda por causa
das fracas instituições, do déficit
fiscal persistente, o
impacto negativo do
controle de capitais,
a contração da economia não-petrolífera e a fraca situação do sistema bancário. Todas essas
fraquezas estão agora sendo mascaradas por preços relativamente altos do
petróleo e um foco
excessivo dos investidores em possíveis
transições políticas.
Folha - O sr. diz que
a Argentina é um dos
países com "buracos"
e não investe lá. Mas
algumas pessoas
acham que o país já
está no pós-crise. Por
que seria tão arriscado ter investimentos por lá atualmente?
El-Erian - A Argentina está no
começo de um processo muito
delicado de recuperação. Para o
processo continuar e construir o
"momentum" necessário, o novo
governo precisará tomar ações
políticas sustentadas e fortes.
Também vai precisar começar a
normalizar suas relações com investidores. São passos importantes, com o foco inicial sendo melhorar as condições domésticas.
Estamos avaliando se o novo governo quer e pode embarcar e
continuar no que será uma viagem desafiadora.
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