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CELSO PINTO
As razões para a euforia
Num momento em que se imaginava que o mercado financeiro estaria atravessando uma forte turbulência, vive-se uma euforia. O
câmbio caiu para R$ 1,808 por dólar, a Bolsa disparou, os títulos no
Exterior deram um salto e não pára de entrar dólares.
Vários fatores ajudaram a mudar o panorama, mas o principal
foi a mudança de sinal no fluxo de
dólares. O mercado adora discutir
resultados fiscais, mas quer, acima de tudo, ter certeza de que vai
receber de volta o que investir. Isso, só o resultado das contas externas pode garantir.
Houve uma combinação de
boas notícias externas e internas.
A turbulência esperada para o final do ano viria do medo do "bug
do milênio", ou seja, um colapso
gerado pela mudança para o ano
2000 nos computadores.
Esperava-se que os investidores
externos, defensivamente, mantivessem o máximo possível em
"cash" ou títulos "seguros", saindo
dos países emergentes, mais sujeitos a problemas. Antevendo um
aperto na liquidez, muitas empresas correram ao mercado a partir
de agosto, provocando um aumento nos juros e uma fuga para
a qualidade. Parecia uma amostra do cenário de horror que se
instalaria a partir de novembro e
dezembro.
Já em janeiro, passada a tempestade, muitos investidores estariam com dinheiro em caixa para
voltar a investir. Portanto, o primeiro trimestre de 2000 poderia
ser um momento de alta nos mercados emergentes.
Hoje, parece claro que o pior do
"bug do milênio" já passou, em
agosto e setembro. Os temores foram sendo minimizados. Investidores anteciparam seus investimentos e, com isso, provocaram
uma subida de preços que só era
esperada a partir de janeiro.
No caso do Brasil, havia uma
dúvida adicional. As contas indicavam um aperto no fluxo de dólares no último trimestre deste
ano, mas um claro alívio no primeiro trimestre do próximo ano,
especialmente pelo menor volume
de amortizações.
A pressão sobre o câmbio foi
ainda maior por duas razões: o
BC entrou comprando dólares em
outubro e no início de novembro,
e o salto na inflação gerou incertezas. O dólar foi a R$ 2,00 e muitas
empresas, temendo o pior, acabaram comprando seguro ("hedge")
contra alta do câmbio ou antecipando obrigações que venciam
em dezembro.
Quando o BC passou a vender
dólares (com a concordância do
FMI) para suprir a escassez temporária, a percepção do câmbio
começou a mudar. O empurrão final foi a oferta de US$ 1,3 bilhão
para ajudar o mercado nos dias
da virada do ano. Foi o prego no
caixão do "bug do milênio": o risco de faltar dólares virtualmente
desapareceu.
Como muita gente tinha antecipado vencimentos, dezembro acabou se revelando muito mais ameno, em fluxo, do que se esperava.
Para as empresas que anteciparam vencimentos ou fizeram
"hedge" comprando dólar a R$
1,95 ou mais, a queda da cotação
para R$ 1,80 implica uma perda
expressiva e uma lição: o câmbio
também flutua para baixo.
O segundo fator de mudança de
ânimo foi a percepção de que o
pior do ajuste fiscal foi feito. Até
setembro, o superávit primário do
setor público ficou em 4,2% do
PIB. É uma melhora de 4,3% do
PIB em relação a 98 e de 5,2% do
PIB em relação a 97.
Um ajuste fiscal de 5% do PIB,
em dois anos, ainda que ajudado
por inúmeros fatores temporários,
é um esforço imenso. Significa,
também, que qualquer esforço
adicional necessário será marginal em relação ao esforço que já
foi feito.
Ainda existem incertezas fiscais
importantes, mas mesmo os cenários mais pessimistas supõem que
teria que ser feito um ajuste adicional de 1% do PIB ou pouco
mais. Quer dizer, comparado ao
que já foi feito, os acertos futuros
parecem mais críveis.
A terceira mudança de expectativas, ainda não inteiramente
consolidada, é em relação à inflação. O IPCA subiu 8,3% até novembro. Os preços dos bens sensíveis à concorrência externa ("tradables"), mais sujeitos ao impacto
da desvalorização, subiram 9,3%,
como mostram dados do banco
CSFB-Garantia. Os dos bens não
expostos a essa concorrência subiram apenas 2%.
Esses dois grupos formam 70%
do IPCA. A pressão forte veio, de
fato, dos preços administrados,
que subiram 23%, mas pesam
apenas 18,6% na composição do
IPCA. Os produtos sazonais subiram 7,2%.
O alívio no câmbio ajuda tanto
a segurar os preços dos "tradables" quanto os administrados (as
tarifas seguem o IGP, onde o peso
dos "tradables" é enorme). O temor de um descontrole inflacionário, portanto, arrefeceu.
Já há quem discuta em que ponto o BC deveria intervir para evitar uma apreciação forte demais
do real. É, em boa medida, uma
falsa questão. A curto prazo, se
houver alívio na inflação, é desejável que os juros caiam e a economia se aqueça um pouco mais. Juros menores freiam a desvalorização do dólar.
Se, ainda assim, o dólar continuar a cair, o BC pode (e deve)
aproveitar para liquidar parte dos
R$ 109 bilhões em dívida pública
indexada ao dólar que possui. Reduz o risco do governo e ajuda a
frear a apreciação do real.
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