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ENTREVISTA DA 2ª
Em Campo Grande, Puccinelli afirma que reduzir déficit habitacional é prioridade; modelo é criticado
Prefeito diz que acaba com favelas até 2004
FABIANO MAISONNAVE
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CAMPO GRANDE
Campo Grande, a capital de Mato Grosso do Sul, pode chegar a
2004 sem ter nenhum dos seus
cerca de 680 mil habitantes morando em favelas. Pelo menos essa é a promessa do prefeito da cidade, o médico André Puccinelli
(PMDB), 54, que atualmente
cumpre seu segundo mandato.
Para demonstrar que isso é possível, Puccinelli exibe os números
de seu programa habitacional,
que, de acordo com ele, é uma das
prioridades de seu governo: em
97, havia cerca de 4.500 famílias
morando em favelas, aproximadamente 22.500 pessoas -número que correspondia a 3,75% da
população do município.
Atualmente, segundo o prefeito,
existem somente 800 famílias morando em favelas -ou 4.000 pessoas. Isso equivale a 0,6% do número total de habitantes.
Para conseguir esses números, a
prefeitura levantou 8.694 casas,
das quais 3.000 foram para o programa de desfavelização. Além
disso, algumas favelas têm sido
regularizadas, sem necessidade
de remoção das famílias.
Os números são de fazer inveja
à maioria das capitais -São Paulo, por exemplo, tem 10% de sua
população morando em locais
inadequados.
O modelo do programa habitacional de Campo Grande, no entanto, é alvo de críticas. Especialistas afirmam que a prefeitura segue um modelo tradicional, baseado em grandes loteamentos localizados fora da região central,
com potencial de se tornar um
problema social a longo prazo. O
maior loteamento tem 3.000 casas
no mesmo local.
Outro problema, apontado pela
própria prefeitura, é a pouca diminuição da demanda: em 97, havia 20 mil famílias inscritas em
projetos habitacionais do município. Seis anos depois, são ainda 17
mil na lista de espera.
Agência Folha - Como está a situação habitacional hoje em Campo Grande?
André Puccinelli - Em 97, nós
consolidamos um estudo de
Campo Grande e elencamos por
faixa socioeconômica.
De três salários mínimos de renda familiar para baixo, o poder
público deve cuidar porque não
tem Caixa Econômica Federal,
não tem FGTS, não tem financiamento nenhum. Nós chegamos à
conclusão de que tínhamos aproximadamente 20 mil famílias com
renda familiar de três salários mínimos nessa situação.
Então nós começamos. O que
nós podíamos regularizar, nós fizemos. Aquelas favelas que não
pudemos regularizar, nós as recolocamos em unidades habitacionais. Nós fizemos uma plantinha
padrão de 28,8 m2, que é um quartinho, sala e cozinha juntos e um
banheirinho. Fizemos este padrão
porque é mais barato, dá para fazer maior quantidade, e a gente
tem de enfiar inicialmente embaixo de um teto. Buscamos recursos
no orçamento da União, recursos
próprios e na Caixa.
Agência Folha - Grande parte das
pessoas que moram nos conjuntos
habitacionais é desempregada ou
sobrevive de subempregos. Existe
alguma ação da prefeitura sobre
esse problema?
Puccinelli - Nós vimos que o servidor pagava, porque o desconto
vinha na folha, mas o favelado
não pagava. Aí nós fizemos unidades de produção. Que diabo é
isso? Compramos máquinas para
a construção de tijolos de cimento
e manilhas e contratávamos essas
pessoas que saíram das favelas para produzir. Mas essas unidades
ainda não são suficientes para absorver todas as pessoas que saem
das favelas.
Agência Folha - Desde a década
de 90, a cidade atravessa um período de estagnação econômica e baixo crescimento populacional em
relação ao passado. Esses fatores
tornaram o problema da moradia
fácil de resolver?
Puccinelli - Mais fácil, porque no
final da década de 70, quando nos
separamos [de Mato Grosso",
chegou-se a ter um crescimento
de 8% em Campo Grande. Hoje, o
crescimento demográfico é de
2,41%, um tiquinho acima da média nacional. Então, com esse
crescimento demográfico, se consegue dar um aporte em que reduza a fila. Você veja que, mesmo
tendo construído 8.694 casas, eu
reduzi de 20 mil famílias para 17
mil.
Agência Folha - Dessas famílias, o
senhor afirma que 800 vivem em
favelas. Como mora o restante?
Puccinelli - Os que vivem com
três salários alugam uma residência de até R$ 150, mas quem está
desempregado vive de favor. São
na maioria novos casais que se
formaram e ainda vivem na casa
dos pais e os desempregados.
Agência Folha - Em quanto tempo
o sr. acha que é possível eliminar as
favelas em Campo Grande?
Puccinelli - Eu quero tentar até o
final do meu mandato. Atualmente, estou regularizando algumas favelas. São frutos, na grande
maioria, de invasões ocorridas há
muito tempo porque eu não permiti invasões de 97 para cá.
Agência Folha - Por que o sr. optou por grandes conjuntos habitacionais, modelo que tem sido alvo
de críticas por causa dos problemas
sociais que gera?
Puccinelli - Eu não optei por esse
modelo. Nós limitamos em 750
unidades habitacionais por bloco
até dotarmos de infra-estrutura
pública suficiente. O poder público não consegue elencar os instrumentos, como creches, escolas,
postos de saúde.
Fui fazendo modularmente.
Concordo que grandes conjuntos
habitacionais não devem ser feitos. Eu os fiz ao longo de seis anos
da minha administração, estou
completando 3.000 casas no mesmo lugar, mas são quatro módulos de 750.
Agência Folha - O sr. está dizendo
que é um conjunto habitacional
grande, mas o fato de ter sido feito
aos poucos minimiza o impacto?
Puccinelli - É, conjunto acima de
750 lotes em um ano não se deve
fazer. Eu usei os limites urbanísticos máximos para uma capital como a nossa, de 670 mil, 680 mil
habitantes.
Agência Folha - Há muitas reclamações sobre o preço da mensalidade. Segundo a Associação de Moradores do Jd. Canguru, o maior
conjunto que o sr. construiu, a inadimplência chega a 70%. O sr. pretende rever essa questão?
Puccinelli - O número não é correto, a inadimplência está em torno de 50% porque a unidade
comporta famílias de favelas e de
outros locais. Quanto está o salário mínimo, quando teve de inflação? Se você aplicar o IPCA-E, que
é o menor dos índices do governo,
o valor está 12% menor do que era
no início da aplicação da mensalidade, em maio do ano passado.
Então o valor de R$ 45 por mês está bem aplicado.
O valor é menor que o aluguel
de um imóvel igual no mesmo local. Encontrei aluguel lá por até
R$ 90. Para formar uma cultura
da conquista pelo suor do trabalho, ele tem de pagar. E a cultura
dos que saem da favela é a de que
têm de receber tudo de graça.
Agência Folha - Outra estatística
da associação é que cerca de 40%
dos moradores já se mudaram.
Puccinelli - É verdade. Apesar de
serem advertidos de que não podem vender, porque eu não deixo
entrar de volta na fila. O que o cara faz? Ele vai lá e se cadastra como André Puccinelli, aí ele vende
por R$ 1.000, R$ 400, pega o dinheiro e quer entrar na fila de novo como Elizabeth Puccinelli, casada com André.
Então nós checamos por meio
da filiação, então veio a Elizabeth,
apresenta três filhos, você sabe
que é a mulher do cara. Aí pomos
no último lugar da fila.
Agência Folha - O que acontece
com essas pessoas depois que
saem?
Puccinelli - Nós não sabemos,
porque nós não temos permitido
invasões, não temos permitido
aumento de favela. Então não sabemos para onde vão. Pode ser
que o sujeito mude de cidade, não
se recadastre, entre nos programas do governo estadual.
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