São Paulo, domingo, 20 de janeiro de 2008

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JANIO DE FREITAS

As alturas de Lula e os baixios de Cesar


A idéia de seus poderes elevou-se a tais alturas que Lula já se permite até decidir sobre o direito alheio à vida

A IDÉIA DE SEUS PODERES elevou-se a tais alturas que Lula já se permite até decidir sobre o direito alheio à vida. No outro extremo, o desprestígio de Cesar Maia desceu a tais baixios, que suas péssimas conseqüências forçam uma reação positiva, e um exemplo, no abandonado Rio.
Na recente viagem à Bolívia, Lula viu o seu ministro da Justiça, Tarso Genro, desabar de repente como uma estátua, sem sentidos, por efeito dos quase 4.000 metros de altitude em La Paz. Ainda assim, Lula compromete-se a ajudar os bolivianos a derrubar a proibição de jogos internacionais de futebol a mais de 2.750 metros. Há muito tempo considerada, a proibição pela Fifa efetivou-se, no ano passado, com o estímulo das evidências de risco à vida sofrido por jogadores brasileiros - os do Flamengo, que em disputa da Taça Libertadores precisaram, quase todos, ser socorridos por bombas de oxigênio, inclusive durante o jogo.
Evidência mais recente é a de que tudo, na Bolívia de hoje, está sob influência do confronto entre, de uma parte, Evo Morales e La Paz, e, de outra, as regiões baixas do país, fronteiriças com o Brasil. Obter a continuação dos jogos internacionais na altitude seria uma vitória popularesca de Morales sobre a oposição que lhe faz a quase planície boliviana.
Comprovadas as razões médicas que condenam jogos internacionais no ar rarefeito dos Andes, a atitude de Lula é uma irresponsabilidade presunçosa, e tão mais inadmissível quanto é certo o seu conhecimento das razões da proibição. Mas a irresponsabilidade tem ainda uma extensão política: intromete-se em disputas internas e até agora legítimas na Bolívia. Isso, depois de Lula repetir, mais uma vez, que "o Brasil não se envolve em assuntos internos de nenhum outro país".
Fora do Altiplano boliviano e do Planalto brasileiro, o novo movimento é incipiente, ainda não oferece indicações de sua tendência. Mas dá o sinal animador de uma disposição de protesto real, com a prática da desobediência civil, contra a administração pública inepta e negligente. Nada a ver com os desfiles adondocados na orla de Ipanema. O movimento surgiu entre pessoas de classe média, e um pouco menos, em bairros fora da zona sul -classes e bairros em que Cesar Maia teve numeroso eleitorado.
A proposta do movimento é a recusa a pagar o IPTU antes de novembro, quando o Rio terá novo prefeito eleito, ou fazê-lo nos prazos hábeis por depósito judicial. Até ontem, quando estavam previstas mais ações de cooptação, já eram 12 bairros cujas associações representativas, algumas da zona sul, aderiram e propalam a onda.
Cesar Maia, de reconhecida competência, abdicou do exercício da administração tão logo tomou posse. Nestes quatro anos, só se interessou, de fato, pelas obras do Pan, cujo custo verdadeiro até hoje não se sabe. Mas sabe-se que a Prefeitura do Rio estourou o seu cofre para colher, como previsto pelos que não tinham interesses envolvidos, um desastre financeiro e físico. A previsão de que o Rio teria o saldo de R$ 1,4 bilhão ficou como idiotice ou como vigarice de organizadores. A par do problema financeiro, o saldo físico são estádios, pistas e piscinas sem meios de conservação, e com raríssimo ou nenhum uso. Abandono idêntico ao restante da cidade, de ruas repletas de buracos, calçadas sujas, iluminação mal conservada, canteiros sem conservação, serviços de saúde lastimáveis, e IPTU caríssimo e aumentado para este ano. Cidade, porém, com um blogueiro muito atento, sarcástico e dedicado em tempo integral à internet: Cesar Maia, um caso estranho.
Se o movimento difundir a disposição de protestos efetivos, com o uso do direito de desobediência civil, a omissão de Cesar Maia deixará um presente ao Rio. E, tomara, uma sugestão a outras cidades também muito necessitadas de despertar, neste país de cordeiros e ovelhas.


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