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São Paulo, quinta-feira, 20 de fevereiro de 2003

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ARTIGO

As interceptações telefônicas

LUIZ ANTONIO GUIMARÃES MARREY
ESPECIAL PARA A FOLHA

Recentes episódios ocorridos no Estado da Bahia, onde no curso de investigação criminal foi obtida autorização judicial para interceptar a comunicação telefônica de diversas pessoas alheias ao objeto do inquérito, entre elas parlamentares, levou o senhor ministro da Justiça a instituir comissão para propor alterações na Lei nš 9.296/96, que regulamenta a matéria.
A utilização de tal meio de investigação, de maneira séria, tem possibilitado alguns sucessos na repressão ao crime organizado e sem dúvida é uma ferramenta importante de trabalho policial.
Trata-se, pois, de instrumento que tem de ser preservado, em benefício da segurança coletiva.
No entanto, são necessárias algumas cautelas a fim de que as interceptações não sejam utilizadas como instrumento de extorsão ou chantagem política e pessoal.
O Estado democrático de direito exige que haja estrito controle da violação de garantia fundamental como o sigilo das comunicações telefônicas e de transmissão de dados.
É necessário, portanto, que a lei exija que a autoridade que requer a medida a fundamente de maneira sólida e pelo menos indique em nome de quem consta a linha a ser interceptada.
A lei deve impor a prévia manifestação do Ministério Público antes da apreciação do pedido pelo juiz e não simplesmente sua comunicação a posteriori, o que tem levado à sonegação de tais informações ao titular da ação penal e enfraquecido a fiscalização de sua regularidade.
Há de se criminalizar, de maneira autônoma, a conduta de se deferir a interceptação fora dos casos estabelecidos em lei, bem como a de fazer afirmação falsa a fim de iludir o magistrado que deve decidir sobre a autorização.
Outra questão deve ser enfrentada e discutida com os meios de comunicação. Quando é realizada interceptação telefônica criminosa, seja mediante autorização obtida indevidamente, seja aquela feita de modo clandestino, muitas vezes o que se quer é desmoralizar a vítima pela sua difusão ou obter dela vantagem indevida, fazendo a ameaça de divulgação de seu conteúdo.
Ora, a publicação do resultado da diligência criminosa representa a vitória de quem atua de maneira ilegal. É preciso dizer que admitir a divulgação do resultado da ilegalidade, mesmo que as informações sejam relevantes, significa aceitar que os fins justificam os meios.
Tal conclusão levaria a aceitar como válida a confissão de fato verdadeiro, obtida mediante tortura, o que é inadmissível.
O Estado democrático pode e deve ser eficaz no enfrentamento da criminalidade, inclusive utilizando os meios tecnológicos modernos para tal fim. Não pode, no entanto, tolerar métodos e condutas arbitrárias, típicas do banditismo e do autoritarismo, como forma de agir.


LUIZ ANTONIO GUIMARÃES MARREY, 47, é procurador-geral de Justiça do Estado de São Paulo. Foi presidente do Conselho Nacional de Procuradores Gerais de Justiça.


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