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Desapropriação deixa de ser prioridade
Terras desapropriadas sob Lula são suficientes para assentar só 21%; ministério reconhece dificuldades
EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Em seu primeiro mandato, o
presidente Luiz Inácio Lula da
Silva assinou decretos que desapropriaram um total de 2,7
milhões de hectares, uma área
suficiente para assentar cerca
de 82 mil famílias de trabalhadores rurais sem terra, ou seja,
21% das 381.419 que o Ministério do Desenvolvimento Agrário declara ter beneficiado durante o período.
A meta do governo petista
era promover o assentamento
de 400 mil famílias entre 2003
e 2006. E, para se aproximar
desse número, deixou em segundo plano a desapropriação
de imóveis rurais, instrumento
que, de acordo com balanço da
pasta de 2004, seria, ao lado da
operação de compra e venda de
fazendas, responsável pelo assentamento de cerca de 70%
das famílias.
Divulgado em 2003, o PNRA
(Plano Nacional de Reforma
Agrária) diz que "o instrumento prioritário de obtenção de
terras para o assentamento de
famílias é a desapropriação por
interesse social para fins de reforma agrária".
Na prática, porém, ocorreu o
contrário. Instrumentos a que
os petistas se referiam como
"complementares", como a
destinação de terras públicas e
a obtenção de áreas devolutas,
viraram prioridade.
Na expectativa de cumprir a
meta acertada com os sem-terra, houve ainda uma corrida em
busca de lotes vagos em assentamentos criados em governos
anteriores.
Para isso, foi ignorada a avaliação de que alguns deles, principalmente na região amazônica, haviam sido abandonados
por conta da falta de infra-estrutura local (água, luz, rede de
esgoto e estrada).
Das 381 mil famílias que o governo diz ter assentado entre
2003 e 2006, 49% delas (187,7
mil) estão no Norte do país.
O instrumento da desapropriação, além de propagandeado como "prioritário" pelo governo, é também o preferido
dos movimentos sociais do
campo. Isso porque, por meio
dele, é possível, mesmo que
lentamente, mexer na estrutura fundiária do país. Ou seja, ao
se criar um projeto de assentamento em uma terra anteriormente ocupada por um fazendeiro improdutivo, diminui-se
a concentração da terra .
"No governo Lula, a reforma
agrária foi deixada de lado, não
houve democratização de terra
e os acampados do MST foram
pouquíssimo contemplados",
disse Marina dos Santos, da
coordenação nacional do MST
(Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).
A maior parte dos acampados à espera de um lote se concentra nas regiões Nordeste e
Sudeste, enquanto a dos assentamentos, no Norte.
Outro lado
Em resposta por e-mail à reportagem, o chefe-de-gabinete
do Ministério do Desenvolvimento Agrário, Caio França,
disse que a "desatualização"
dos índices de produtividade
"dificultam" a obtenção de terras para a reforma agrária em
algumas regiões do país fora da
Amazônia.
A atualização desses índices é
uma antiga reivindicação da
pasta. Lula já prometeu atualizá-los, mas uma portaria sobre
o tema permanece engavetada
no Planalto.
Com os novos índices, mais
áreas seriam consideradas improdutivas, o que permitiria o
avanço dos assentamentos no
Sul e Sudeste, principalmente.
"A maior participação da região Norte no universo das famílias assentadas decorreu de
uma prioridade dada ao combate ao desmatamento, grilagem e violência e à desatualização dos índices de produtividade, que dificultam a obtenção
de terras na região centro-sul
por meio do instrumento da
desapropriação", argumentou
o chefe-de-gabinete.
De acordo com ele, o plano de
reforma agrária "previa o uso
de diferentes instrumentos e
de diferentes tipos de assentamento", mas "não hierarquizava as formas de obtenção, exatamente, por reconhecer as
possibilidades de uso diferenciadas em cada região".
Ele diz ainda que a democratização do acesso à terra não
ocorre apenas por meio da desapropriação.
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