São Paulo, Terça-feira, 20 de Abril de 1999
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SISTEMA FINANCEIRO
Economista mostra conhecer detalhes de sua antiga empresa
Depoimento de Lopes à PF não elimina dúvidas

da Sucursal de Brasília


O ex-presidente do Banco Central Francisco Lopes demonstrou, em seu depoimento à Polícia Federal, ter conhecimento de detalhes da administração da empresa de consultoria Macrométrica, embora tenha afirmado não ser mais um dos sócios.
Outro ponto que deixa dúvidas no depoimento de Lopes à PF é sua afirmação de que só soube pelos jornais que o banqueiro Salvatore Cacciola, do Marka, remeteu dólares ao exterior -o BC, porém, informou à CPI dos Bancos ter tido conhecimento prévio da operação.
A relação entre Lopes e a Macrométrica ganhou importância depois que se divulgou a hipótese de a empresa -hoje administrada pelos irmãos Sérgio e Luiz Augusto Bragança- estar envolvida em eventual passagem de informações privilegiadas ao mercado.
No depoimento que prestou à PF na sexta, Lopes disse estar desligado da Macrométrica, mas confirmou que sua mulher, Araci Bentes dos Santos Pugliese, é sócia.
Segundo o termo do depoimento, obtido pela Folha, Lopes foi capaz de responder a perguntas bastante específicas sobre a empresa que fundou em 1984 e da qual se afastou oficialmente antes de ingressar no governo, em 95.
Lopes disse que a Macrométrica não prestou nem presta consultoria aos bancos Marka e FonteCindam (que receberam ajuda do BC após a desvalorização do real, em janeiro) e que não opera nem operou no mercado futuro de câmbio.
Sempre de acordo com o documento da PF, ele chegou a afirmar que a Macrométrica -assim como ele próprio- declara regularmente o Imposto de Renda.
Lopes não citou os irmãos Bragança, seus ex-sócios, no depoimento. Na sexta-feira ainda não era conhecida a reportagem da revista "Época" segundo a qual ambos teriam passado informações recebidas de Lopes aos bancos Marka, FonteCindam e Boavista.
Mas Lopes discorreu sobre outras relações com pessoas envolvidas no episódio. Disse conhecer Rubem Novaes, apontado em outras versões como o intermediário entre Cacciola, do Marka, e o BC.
Lopes e Novaes se conheceram e mantiveram contatos "esporádicos" ao longo dos anos 70 na Fundação Getúlio Vargas. Mais recentemente, segundo Lopes, só tiveram um contato na delegacia do BC no Rio -o ex-presidente do BC não soube precisar a data.
Com Eduardo Modiano, seu ex-sócio na Macrométrica e que hoje se encontra no FonteCindam, Lopes disse estar com relações estremecidas.
Além da defesa já conhecida do socorro ao Marka e ao FonteCindam e de sua versão para a desvalorização do real, Lopes disse que não soube, durante a sua curta passagem pela presidência do BC, que Cacciola remeteu US$ 13,12 milhões ao exterior enquanto seu banco era socorrido com dinheiro público.
Mas a versão do diretor de Fiscalização do BC, Luiz Carlos Alvarez, para o caso põe a de Lopes em dúvida. Segundo Alvarez, as remessas ocorreram em duas etapas.
Em 14 de janeiro, foram remetidos US$ 2 milhões por Cacciola. Em 18 de janeiro, houve outras duas remessas, somando US$ 11,12 milhões.
Ainda que se admita que Lopes não sabia da primeira remessa, é estranho que não tenha sido informado das de 18 de janeiro, quando as operações do Marka já eram acompanhadas de perto pelo BC.
Uma única frase de Lopes é reproduzida integralmente pelo documento da PF. Sobre a legalidade do socorro ao Marka e ao FonteCindam, respondeu: "Se não tivesse convicção absoluta da legalidade dessas operações, as mesmas não seriam realizadas".
As operações, disse, foram respaldadas pelo Departamento Jurídico do BC, com uma consulta ao procurador Francisco Siqueira e a outros dois procuradores.
Lopes disse considerar que as operações não deram prejuízo ao BC, uma vez que utilizaram cotações superiores às praticadas pela Bolsa de Mercadorias & Futuros.
Lopes voltou a repetir que o presidente Fernando Henrique Cardoso e o ministro Pedro Malan (Fazenda) não foram informados do socorro aos dois bancos.


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