São Paulo, quinta, 20 de agosto de 1998

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JANIO DE FREITAS
O factóide

Há uma simpática e quase promissora mensagem implícita na disputa eleitoral no Rio: "o marketing que elege é o mesmo que arruína".
Cesar Maia aderiu à moda do marketing como nenhum administrador público o fizera antes. Nos últimos cinco anos, senão mais, estudou todos os trabalhos estrangeiros tidos como importantes na matéria, com dedicação especial ao marketing e marqueteiros políticos.
Prefeito do Rio até 97, só agiu e falou em conformidade com as técnicas de marketing. Convicto de que a zona sul funcionaria como alto-falante, Cesar Maia privilegiou-a. Gastou barbaridades em mera maquiagem do que não precisava desses cuidados -e muito mais impressões negativas do que favoráveis às gaiatices decorativas, cujos custos inúteis chegaram a absurdos como postes pagos a US$ 10 mil cada.
Escolhido um ponto estratégico, entrada do túnel de Copacabana para o centro, ali espichou por quase dois anos uma obrinha para fortalecer-lhe a imagem de realizador-modernizante.
Com o engarrafamento resultante, em mais de um ano de alto calor quase ininterrupto, o que o marketing obrou foi muita irritação geral.
Mas TVs e jornais continuaram a dar-lhe o destaque mais promocional. Efeito que atribuiu não só à sua compreensão com certos problemas empresariais, mas, sobretudo, aos factóides. Ou seja, à técnica de marketing, na qual se considera imbatível, que consiste em levar a mídia a tratar como fato real o que é só invencionice, no caso, do próprio Cesar.
Encerrado o mandato, criou todos os casos e todas as bobices ("Vou afastar os que dormem nas calçadas usando creolina") para ter espaços, que não lhe faltaram mesmo, na mídia do Rio. Isso, enquanto levava seu marketing ao interior do Estado.
Era natural que Cesar Maia, para maior suficiência dos marqueteiros, entrasse na disputa eleitoral como grande favorito. Ainda mais que o candidato de Marcello Alencar não mostrava cacife nem para se eleger vereador. E Anthony Garotinho vinha de duas administrações muito elogiadas em Campos, mas não tinha bases no restante do Estado, nem, com seu jeito pacífico e tranquilo, agressividade para conquistá-las na marra.
A inversão do favoritismo de Cesar Maia em provável derrota para Anthony Garotinho já no primeiro turno, como constata o Datafolha, é a superação do ilusionismo do marketing político pelo trabalho consistente e respeitoso com o eleitorado.
Eleição, adverte o lugar-comum, é decidida na urna. Mas o marqueteiro Cesar Maia parece já se considerar batido: seu programa eleitoral é feito só de agressão ao adversário, e isso é suficiente como indicação.
Cesar Maia deve estar se descobrindo um factóide de Cesar Maia. O que é lamentável, lembrando-se que foi excelente secretário estadual e, por certo tempo, bom parlamentar. Mas talvez as ruínas feitas pelo marketing político não sejam irrecuperáveis.



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