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Para especialistas, júri pode ser anulado
da Reportagem Local
Especialistas em direito penal
ouvidos pela Folha acreditam que
o julgamento dos oficiais da Polícia Militar do Pará acusados de
matar 19 sem-terra em Eldorado
do Carajás pode ser anulado.
Para eles, a sessão do júri que
absolveu os oficiais teve pelo menos duas falhas graves: a manifestação de um dos jurados antes da
decisão final e a apresentação de
perguntas de caráter contraditório para o júri.
Antes da reunião dos jurados
para definir o veredicto, um deles
solicitou que fosse mostrado novamente o vídeo com as cenas do
confronto entre a PM e os sem-terra.
Enquanto via as imagens, comentou que elas indicavam que
os trabalhadores rurais estavam
armados.
Segundo especialistas, essa atitude pode ter influenciado os demais jurados. De acordo com a legislação brasileira, os integrantes
do júri não podem manifestar nenhuma opinião sobre o caso durante o julgamento. Além disso, o
voto deles é secreto.
"Os jurados não podem falar
sobre o caso uns com os outros,
quanto mais externar publicamente sua opinião. Isso implica
prejulgamento e pode influenciar
os demais. O juiz deveria ter impedido que ele opinasse", afirmou
o advogado criminalista Nélio
Seidl Machado, que desde 1973
atua em júris.
O presidente nacional da OAB
(Ordem dos Advogados do Brasil), Reginaldo de Castro, lançou
dúvida ontem sobre a imparcialidade do julgamento e disse que
houve contradição "patente" na
decisão dos jurados.
"A OAB vai se empenhar para
que haja outro julgamento com
absoluta segurança de que seja
realmente imparcial", afirmou.
"Pelo que tudo indica, foi um mero jogo de cena."
"A lei brasileira prevê a incomunicabilidade dos jurados, que jamais podem manifestar sua opinião sobre qualquer aspecto do
processo durante o julgamento",
disse o desembargador da seção
criminal do Tribunal de Justiça de
São Paulo Celso Limongi, ressaltando que falava em tese.
Os especialistas também criticaram a apresentação da seguinte
pergunta aos jurados: "As provas
contidas nos autos são insuficientes para a condenação do réu?".
Os jurados responderam sim a
essa pergunta e também à que tratava da participação dos réus na
morte dos sem-terra.
No entender dos criminalistas,
houve contradição entre as respostas dadas (ver quadro na página 1-4). O advogado Arnaldo Malheiros Filho disse que a proposição desse quesito "não é usual".
"Em princípio, havendo contradição, pode haver anulação do
julgamento."
"Esse tipo de pergunta é supérfluo. Afirmados os quesitos sobre
autoria e materialidade, não há
mais o que perguntar", disse Limongi, integrante da Associação
Juízes para a Democracia.
O presidente da OAB tem opinião semelhante: "Se os jurados
reconheceram a co-autoria dos
acusados da chacina de Eldorado
do Carajás, não havia espaço para
entenderem que as provas não
eram suficientes".
"O júri não é técnico e essa é
uma pergunta técnica. Ele decide
seguindo sua consciência e de
acordo com o que ouviu. Não tem
obrigação de fundamentar sua
decisão", declarou Machado.
Para ele, os erros cometidos pelo juiz foram "elementares". Machado disse não ter dúvidas de
que o julgamento será anulado.
"É inevitável. Não foram observadas as regras do jogo. Caberia ao
juiz, responsável pelo processo,
dirigir o júri", completou.
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