São Paulo, sexta, 20 de novembro de 1998

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PRIVATIZAÇÃO
Ministro esclarece dúvidas sobre o leilão
Depoimento revela bastidores da venda

ELVIRA LOBATO
da Sucursal do Rio


Em seu depoimento no Senado, o ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, esclareceu a grande dúvida que ainda pairava sobre o leilão da Telebrás: os motivos que levaram os italianos a comprarem a Tele Centro Sul quando queriam a Tele Norte Leste.
Segundo o ministro, a atitude dos italianos -que até agora intrigava os que acompanharam o leilão- foi motivada pela demora da Previ (fundo de pensão do Banco do Brasil) em formalizar sua adesão à proposta do Opportunity para a Tele Norte Leste.
A Previ (maior fundo de pensão do país, com patrimônio aproximado de R$ 20 bilhões) não concordava com o preço que o Opportunity se dispunha a pagar. Considerava-o muito alto.
Mendonça de Barros referiu-se ao assunto em vários momentos de seu longo depoimento. Segundo ele, até a véspera do leilão -realizado na Bolsa do Rio, no dia 29 de julho-, a Previ não havia assinado o compromisso de adesão à proposta do consórcio. Sem o fundo estatal, o Opportunity ficava em posição frágil para disputar a Tele Norte Leste, cujo preço mínimo estava fixado em R$ 3,4 bilhões.
Diante da indefinição da Previ, segundo relatou, os italianos usaram uma tática defensiva: apresentaram uma proposta para a Tele Centro Sul, cujo preço mínimo era de R$ 1,95 bilhão, para não correr o risco de ficar fora da privatização.
O ministro disse ter sido informado desse bastidor um dia depois do leilão, quando, segundo ele, um diretor da Telecom Italia o procurou para explicar o ocorrido.
O ministro não citou o nome do executivo italiano, mas tudo indica que teria sido Carmelo Furcci, que acabara de assumir o comando da Telecom Italia no Brasil.
Pela versão que Mendonça de Barros apresentou aos senadores, foi nesse encontro que ele teria tomado conhecimento do preço proposto pelo consórcio Opportunity para a Tele Norte Leste. Reafirmou que a proposta era R$ 1 bilhão maior do que a do consórcio Telemar, que arrematou a telefônica por R$ 3,4 bilhões.
A Folha tentou confirmar a informação com Carmelo Furcci, mas sua secretária disse que ele estava fora e que não retornaria para o escritório ontem.
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Traições
Com o depoimento de Mendonça de Barros, está desvendado o quebra-cabeças sobre o leilão das empresas de telefonia fixa: Telesp, Tele Centro Sul, Tele Norte Leste e Embratel. Ele disse que houve "traições" e que, por causa delas, o leilão não seguiu o rumo esperado.
Esperava-se que a Telesp fosse arrematada pela norte-americana BellSouth ou pelo grupo formado por Telecom Italia, Bradesco e Organizações Globo.
A grande favorita para a compra da Tele Centro Sul, segundo o que se cogitava na época, era a Telefónica de España, sócia da telefônica CRT, do Rio Grande do Sul, em parceria com o grupo de comunicação gaúcho RBS (da família Sirotsky) e com a Portugal Telecom.
O favoritismo era explicado até por questões geográficas. Os espanhóis exploram a telefonia na Argentina, no Chile e no Peru. Se vencessem, teriam território contínuo.
Dentro desse raciocínio lógico, a Tele Norte Leste -que cobre 16 Estados- ficaria com o consórcio do Opportunity. O ministro admitiu no Senado que tinha preferência pessoal por esse consórcio.
O esquema desmontou quando a Telesp foi arrematada pela Telefónica de España, que ofereceu R$ 5,78 bilhões pela companhia (ágio de 64,29%) e derrotou as favoritas BellSouth e Telecom Italia.
Até a RBS foi atropelada pela atitude da Telefónica de España, que não revelou suas intenções nem mesmo para o sócio nacional. Sete horas antes do início do leilão, os presidentes da Telefónica de España, Juan Villalonga, e da RBS, Nelson Sirotsky, se reuniram no Rio.
Villalonga informou a Sirotsky que iria participar também do leilão da Telesp. Justificou que a Telefónica era uma companhia aberta negociada nas principais Bolsas do mundo e que não teria como justificar a ausência no leilão da Telesp. Diante do espanto de Sirotsky, afirmou que não seria uma disputa para valer e que o objetivo continuava sendo a Tele Centro Sul. A compra da Telesp acabou levando ao rompimento entre Sirotsky e a Telefónica de España.
Esse episódio, revelado pela Folha logo após o leilão, foi lembrado ontem por Mendonça de Barros. O ministro o citou para explicar porque falara em "traições" nas conversas gravadas pelo grampo.
Com a vitória dos espanhóis na Telesp, os italianos e o Opportunity ficaram sozinhos do leilão da Tele Centro Sul e foram declarados vencedores. Com isso, para surpresa geral, a Telemar, tida como azarão da disputa, levou a Tele Norte Leste com 1% de ágio.



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