São Paulo, sexta-feira, 20 de dezembro de 2002

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"Neonacionalista", Lessa quer BNDES voltado à inclusão

CHICO SANTOS
ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO

O futuro presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), o economista Carlos Lessa, 66, se define como "um neonacionalista". Segundo ele, na concepção histórica do banco, financiar empresa estrangeira é reduzir "o diferencial favorável à empresa nacional". A não ser que o financiamento ao estrangeiro seja para fortalecer a empresa nacional, como, por exemplo, no caso de um comprador da Embraer.
Ex-diretor das áreas social e agroindustrial do banco estatal, de onde saiu em 1989, Lessa deu o conceito, mas preferiu não ser definitivo em relação às empresas estrangeiras. "Vou ter que estudar. Estou fora do banco desde 1989. Foi um período de grandes transformações."
A escolha de Lessa para a presidência do BNDES foi confirmada ontem por meio de uma carta assinada pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva e lida para os representantes do Conselho Universitário da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), instituição da qual ele é reitor.
Lessa destacou três tarefas que considera prioritárias para o BNDES no governo Lula. O ponto que, segundo ele, "pode ser a grande novidade" é investir em setores que contribuam para a efetivação do programa Fome Zero e do projeto geral de inclusão social do novo governo. Segundo o economista, isso pode levar o BNDES a intensificar o apoio a indústrias como a de alimentação e a de cimento, esta no caso de um grande programa habitacional.
As outras duas tarefas não são tão novas: continuar financiando as exportações, conjugada com financiamentos destinados a reduzir as importações; e fazer um diagnóstico e intensificar os financiamentos destinados a melhorar a infra-estrutura do país (estradas, portos, aeroportos etc).

Varig
Questionado sobre a situação da Varig, que enfrenta séria crise e tem dificuldades para obter empréstimo do BNDES, Lessa disse que para o Brasil é muito importante ter uma companhia aérea do porte da Varig, mas acrescentou: "Por outro lado, essa situação excepcional não autoriza essa empresa a exigir uma sucessão infinda de concessões especiais".
Ele disse também que, como presidente do BNDES, não opinará sobre a política macroeconômica, a não ser que venha a ser chamado para fazê-lo em um fórum específico do governo. "Não é função do BNDES falar sobre política macroeconômica. Cada macaco no seu galho."
Segundo Lessa, além de fonte de financiamento, "o BNDES é um notável instrumento de planificação setorial". Mas afirmou que quem definirá os setores prioritários são as instâncias superiores do governo. "O BNDES vai ser uma instância subsidiadora desse debate e executora do seu resultado." Ele confessou não conhecer o futuro ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, que será seu chefe. "Só falei com ele uma vez, por telefone."
Lessa comandará um orçamento de empréstimos que este ano chegará a R$ 30 bilhões, maior, por exemplo, do que os gastos totais do Ministério da Saúde (em torno de R$ 28 bilhões em 2002).

Paul Singer
Ele afirmou ter recebido de Lula a recomendação de formar sua equipe preferencialmente com pessoal do próprio banco. O único nome de fora que Lula disse querer no BNDES é o do economista Paul Singer, especialmente pelo trabalho no campo da "economia solidária".
Ao ser questionado sobre como se posiciona na polêmica entre monetaristas e desenvolvimentistas que já gerou divisões na equipe econômica do atual governo, ele disse que não opinaria e sugeriu que as dúvidas fossem tiradas na leitura dos seus livros. Mas acabou disparando: "Pela minha formação, pela minha natureza, eu não sou um neoliberal. Sou um neonacionalista e minha grande preocupação é a inclusão social e a redução das desigualdades".
O neoliberalismo", continuou, "é uma ideologia paralisante do mercado, por incrível que pareça. Porque o mercado não se auto-sustenta. O mercado exige diretrizes, exige interações, exige articulações, exige protagonismos e, geralmente, exige o Estado como grande protagonista".
Lessa preferiu ser genérico sobre o problema dos juros elevados e o que eles poderiam criar de obstáculos ao BNDES. Após ressalvar que o banco tem fontes de recursos mais baratas que as do mercado para cumprir o papel de financiador do setor produtivo, disse: "Em princípio, juros elevados dificultam os investimentos, públicos e privados".
A primeira conversa pessoal entre Lessa e Lula aconteceu na sexta-feira passada, em Brasília. O futuro presidente do BNDES chegou a ser cotado para o Ministério do Planejamento.
Lessa, apesar de filiado ao PMDB, sempre teve ótimas relações com o PT. É amigo da economista petista Maria da Conceição Tavares. Foi professor de tucanos e ministros de FHC, como José Serra, Paulo Renato (Educação) e Barjas Negri (Saúde).


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