São Paulo, domingo, 21 de junho de 1998

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Publicitários rejeitam contas de governos

da Reportagem Local

Desde 1980, quando criaram a agência de publicidade Talent, Julio Ribeiro e seus sócios nunca aceitaram três tipos de clientes: fabricantes de cigarros, de bebidas alcoólicas fortes e governo.
Isso custou caro à agência. Ribeiro calcula que tenha deixado de faturar algo como R$ 20 milhões, ao recusar convites para trabalhar para esses três grupos de anunciantes.
"Não faço publicidade para governo porque acho que, num país pobre como o nosso, isso é uma grave distorção. A função básica do governo é prover educação, saúde etc. Não está escrito na Constituição que se deve gastar milhões de dólares com propaganda", diz Ribeiro.
O caso da Talent é raro, mas não é único. A W/Brasil é outra grande agência que também não atende contas do governo.
"Já fui até convidado, mas nem sei se saberia fazer campanha para governos. No governo e em campanhas para eleições, as decisões são tomadas com base em critérios políticos, não profissionais", diz Washington Olivetto, presidente da agência.

Ligações perigosas
Olivetto acha que os publicitários que fazem campanha política se beneficiam quando o candidato é eleito.
"Em geral, existe uma identidade entre os dois e a pessoa eleita tende a beneficiar quem ajudou na campanha", comenta.
Para Ribeiro, todas as campanhas bancadas pelo governo acabam sendo eleitoreiras, "mesmo em governos de pessoas consideradas íntegras, como o Fernando Henrique e o Mário Covas".
Ele cita como exemplo de campanha eleitoreira os anúncios da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo). Neles, o governo estadual promete acabar com o racionamento de água, numa campanha veiculada num ano eleitoral.

Mais profissional
Ribeiro acha que as mudanças adotadas pelo atual governo federal na divisão da verba publicitária -com licitações e maior número de agências- tornaram a administração da propaganda oficial mais profissional.
"Antes, o governo pagava comissões três ou quatro vezes maiores que a iniciativa privada. Hoje, o controle sobre os gastos é muito maior. Mas o princípio está errado. Governo não deve fazer publicidade em nenhum país do mundo", diz.
"Não tenho posição messiânica sobre quem atender ou não", diz ele. "Não sou um Enéas, que quer impor sua posição. Só estou fazendo o que acho mais correto", explica esse publicitário, cuja agência é uma das 15 maiores do país.



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