São Paulo, domingo, 21 de julho de 2002

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SOCIALISMO FASHION

Nem biquíni de Gisele com Che une esquerda

ARMANDO ANTENORE
DA REPORTAGEM LOCAL

Para que não a acusem de incoerência, a esquerda brasileira sai dividida nas próximas eleições e se conserva assim também quando o assunto é a recente aliança entre Gisele Bündchen e Che Guevara. Uns a reverenciam sem culpa. Outros a tomam por trapaça burguesa.
Fato político mais exuberante da semana, a coligação ganhou corpo (e que corpo) na noite da última segunda-feira, tão logo a top model gaúcha despontou sobre a passarela da São Paulo Fashion Week. Delgada, demolidora, vestia um biquíni repleto de Ches.
O jornalista Elio Gaspari contou 15 só na parte de trás e prontamente anunciou o número em sua coluna de quarta-feira. Como bolinhas ou flores campestres, a face do guerrilheiro argentino -verde, azul, branca- salpicava todo o traje de banho.
Era o mesmo rosto que o fotógrafo cubano Alberto Korda flagrou em 1960. A imagem se converteu, então, num dos principais símbolos da revolução comunista liderada por Fidel Castro. Depois, migrou para a seara dos ícones pop. Nas duas condições, frequenta camisetas, bottons e pôsteres, não raro em companhia do lema "Hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás".
Ternura que o metalúrgico José Maria de Almeida, candidato do PSTU à Presidência, abandonou mal teve notícias do que se passara na Fashion Week. "Um despropósito. Che virou mito porque lutava contra a desigualdade social e a exclusão. Não merecia estar num desfile de luxo, que expressa apenas a futilidade e o consumismo da burguesia. Quantas trabalhadoras poderiam comprar um biquíni daqueles?"
Sem dúvida. A peça, confeccionada pela Cia. Marítima, custa R$ 80. Mas se, por acaso, a trabalhadora ganhasse o biquíni e o usasse? "Não mudaria nada", insiste o candidato. "Continuaria um negócio horrível e desrespeitoso. Nem na Gisele ficou bonito."
Outro presidenciável de orientação trotskista -o tradutor Rui Costa Pimenta, do PCO- prefere ver o episódio como mais um indício de que o socialismo não morreu. "As elites apregoam que a história acabou e que a causa operária já não seduz ninguém. Acontece que a popularidade do Che cresce diariamente, de tal maneira que inventam um biquíni com a cara dele. Não é um artista que aparece lá, não é um roqueiro. É o Che, de boina e barba. O revolucionário."
"Maravilha, maravilha", festeja o deputado Aldo Rebelo, do PC do B. "O Che, ali, só amplia as qualidades da nossa Gisele, moça simpática, muito generosa."
Dizendo-se avesso à política, Benny Rosset, um dos donos da Cia. Marítima, explica que adotou a estampa do guerrilheiro por razões meramente estéticas. "Tanto é que não pus o Fidel. O homem, além de feio, não muda de roupa há 40 anos."



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