São Paulo, quinta-feira, 21 de setembro de 2006

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ELEIÇÕES 2006 / CRISE DO DOSSIÊ

Escândalo repete enredo do mensalão

Apreensão de dinheiro, relação com Valério e envolvimento de pessoas ligadas a Lula aproximam crises

"Isso aí é o dólar na cueca de novo. Qual é a diferença?", questiona Osmar Serraglio, que relatou CPI que apurou as denúncias do mensalão


MALU DELGADO
DA REPORTAGEM LOCAL

"O curioso é como as peças e os atores se modificam. É uma espécie de roda da vida. Não é fácil tentarmos impedir que as contas dos fantasmas sejam vasculhadas. Aqueles que foram exorcistas ontem se abraçam com os fantasmas hoje."
As frases ditas pelo ex-deputado Roberto Jefferson em 30 de junho de 2005, durante depoimento à CPI dos Correios -que investigou o escândalo do mensalão- ilustram bem a sensação de déjà-vu que a crise do dossiê desperta.
Há coincidências intrigantes entre o esquema do mensalão e o caso do dossiê. A primeira é a perplexidade imediata de integrantes do PT com o fato de filiados estarem envolvidos em esquemas ilícitos. A segunda é a rápida estratégia para garantir que nada respingue no presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A crise atual que ronda a campanha de Lula começa com dois petistas -Gedimar Passos e Valdebran Padilha- flagrados pela Polícia Federal negociando a venda de um dossiê por R$ 1,74 milhão.
"Isso ai é o dólar na cueca de novo. Qual é a diferença? Circulam com milhões de reais em espécie. Espero que urgentemente se demonstre a origem desse dinheiro", cobra o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), que relatou a CPI dos Correios. Ele refere-se à prisão pela Polícia Federal, em 2005, do petista José Adalberto Vieira da Silva com dinheiro na cueca.
Em 2005, foi Jefferson quem apontou o dedo para o núcleo do PT. Partiu de um aliado a confissão do esquema do mensalão. Agora, é o petista Gedimar que joga a bomba na campanha de Lula ao citar o nome de Freud Godoy, até segunda assessor especial da Presidência, como um dos interlocutores na negociação do dossiê.
Empresas de Freud receberam recursos das empresas de Marcos Valério e Duda Mendonça, alvos de investigação da CPI dos Correios.
Para Serraglio, "só o fato de imaginar alguém que seja muito próximo ao presidente, há tantos anos, fazendo transações com o sistema Marcos Valério já é muita coincidência. Digno de ser investigado".
Se no mensalão as investigações não chegaram a Lula, no caso do dossiê as ligações são perigosas. Gedimar disse que Jorge Lorenzetti, do setor de inteligência da campanha de Lula e churrasqueiro do presidente, foi um dos mentores da negociação do dossiê.
Lorenzetti é amigo de Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, personagem central do mensalão. Ao lado de Lorenzetti estava Oswaldo Bargas, um dos coordenadores do programa de governo de Lula.
À medida que as investigações se aprofundam e novas provas aparecem, pessoas começam a se afastar da órbita palaciana. Outra semelhança.
Do dia em que foi descoberto o envolvimento de petistas na compra do dossiê até ontem, três auxiliares diretos de Lula na campanha foram afastados e um diretor do Banco do Brasil também deixou o cargo.
Na crise do mensalão, o primeiro a cair foi o ministro da Casa Civil José Dirceu. No PT, caíram o secretário-geral Silvio Pereira e o presidente da sigla, José Genoino, além de Delúbio.
Agora, a bola da vez é o Ricardo Berzoini, sucessor de Genoino, chefe de Lorenzetti e de Bargas. Ele sabia que os subalternos conversariam sobre um dossiê com a Época, mas nega ter conhecimento do conteúdo.
As investigações devem revelar se Roberto Jefferson tem ou não vocação para profeta.


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