UOL

São Paulo, domingo, 21 de dezembro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

NO PLANALTO

Papai Noel de Lula traz a lista do PMDB

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Digamos que você se chama Lula da Silva. Mora num país chamado Brasil. Educou-se na privação. Graduou-se na adversidade.
Digamos que você foi à vida e ao sucesso. Aprendeu um ofício. Embrenhou-se no mundo sindical.
Digamos que, sob seu comando, os trabalhadores cometeram o crime de existir. Pior: começaram a existir em grande quantidade.
Digamos que você liderou greves memoráveis. Vergou a espinha do regime dos generais. Pôs de pé uma central sindical. Levado à cana, ganhou aura mítica.
Digamos que você fundou um partido político. Legenda retilínea, ascética. Que vive a apontar excessos de outras agremiações -sinuosas, inconfiáveis.
Digamos que, politicamente, você se situa à esquerda. Esquerda esclarecida. Do tipo que não come criancinhas. E não deixa a ideologia contaminar o senso prático.
Digamos que você fracassou em três tentativas de tornar-se presidente. Tropeçou no preconceito. Foi vítima de uma farsa (Collor) e de duas decepções (FHC 1 e 2).
Digamos que você sacudiu a poeira. Pôs-se a medir o chão do país em caravanas romanescas. Conheceu por dentro a nação em que vive. Construiu teses, vendeu saídas.
Digamos que você atazanou a administração liberal de FHC. Cobrou escritos esquecidos. Armou barricadas no Congresso. Açulou marchas a Brasília.
Digamos que, escorado na ruína do tucanato, o seu partido elegeu 187 prefeitos e 2.845 vereadores em 2000. Reconhecimento ao hipotético "modo petista de governar".
Digamos que em 2002, caminhando displicentemente por uma rua de São Bernardo, você tropeçou numa lâmpada mágica. O gênio disse que poderia pedir qualquer coisa. A vida eterna, uma noite com a reencarnação da Brigitte Bardot de sua adolescência... Qualquer coisa.
Digamos que você pediu a Presidência da República. Queria o poder para mudar tudo. O gênio ajeitou as coisas. Deu-lhe o Alencar de vice, o Duda para o marketing e o Serra como adversário.
Digamos que você se elegeu presidente. Com tantos votos que está autorizado a fazer o que bem entender. Finalmente no comando, pode impor a nova agenda, fixar os novos rumos, aplicar as receitas originais.
Digamos que você tomou posse sob festa popular. Pronunciou o discurso redentor. Prometeu multiplicar pães e empregos.
Digamos que o gênio lhe apareceu de novo numa noite fria e seca do Alvorada. Pronto a atender-lhe o segundo desejo, perguntou quais seriam as suas prioridades.
Digamos que você coçou a cabeça, cofiou a barba, pediu tempo. O gênio, impaciente, disse que você teve 20 anos de militância para pensar. Cobrou definições.
Digamos que você, meio sem jeito, respondeu: "Quero eleger o Sarney para a presidência do Congresso, manter a política econômica do Malan, aprovar as reformas do tucanato e viajar mais do que o FHC".
E o gênio, abespinhado: "Ora, francamente, mágica tem limites. Você não precisa de mim. Procure o PMDB". Enfiando-se de volta no interior da lâmpada, balbuciou: "Livre-se da Heloísa Helena".
Digamos que você sabe que o gênio não vai reaparecer para o terceiro pedido. Não lhe resta senão esperar pela chegada redentora de Papai Noel.
O bom velhinho bem poderia trazer uma velha revista com fotos de Brigitte Bardot exibindo a garupa juvenil. Porém, guiando-se pelo aroma de doce pragmatismo que impregnou a atmosfera da Brasília petista, o mais provável é que ofereça a lista de ministeriáveis do PMDB. Conterá de indesejáveis Eunícios a impensáveis Garibaldis.
2004 promete.

 

P.S.: Noticiou-se aqui, em 2 de novembro, que Cristovam Buarque retardava providências para fechar o ralo do Cefet/PA (Centro Federal de Educação Tecnológica do Pará). Tem 7.000 alunos. Vem sendo auditado desde 2001. Documentaram-se desvios de R$ 4,5 milhões. Gastos de R$ 7 milhões exalam mau cheiro. O buraco pode atingir R$ 11,5 milhões.
Informa-se agora, com satisfação, que Brasília acordou. Foi demitido Sérgio Cabeça Braz. Dirigiu a escola por arrastados 18 anos. Afastaram-se outras três funcionárias. Cassou-se a aposentadoria de um quarto servidor. Alvíssaras.


Texto Anterior: Elio Gaspari: Um sucesso - as cotas de Lula
Próximo Texto: Em descompasso: Lula tenta pôr fim a crise entre Casas
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.