São Paulo, sábado, 22 de abril de 2000


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NA BAHIA
"Essa gente tem mentalidade fascista?", questiona presidente sobre militantes sem terra que o criticam
FHC diz estar cansado de ações do MST

WILLIAM FRANÇA
enviado especial à ilha de Comandatuba (BA)


O presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou ontem estar cansado das ações do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e deixou claro que não quer que o Congresso vote, na próxima quarta-feira, a medida provisória do salário mínimo fixado em R$ 151.
FHC acrescentou que os sem-terra são "uma parte radical da sociedade voltada para o vazio", que "não quer resolver nada, só agravar".
Na sua opinião, há no país "a tolerância necessária" para as manifestações durante as comemorações dos 500 anos, mas ele não aceita ofensas pessoais, à democracia, ao país ou à instituição Presidência da República.
"Essa gente tem mentalidade fascista?", questionou ao comentar a invasão e depredação da Secretaria da Segurança Pública do Pará, quarta-feira passada. "Esse movimento está descambando para a baderna", afirmou, referindo-se ao MST.
Em resposta às declarações de FHC, o coordenador do MST na Bahia, Valmir Assunção, disse que o que o presidente considera baderna é, para o MST, a luta pela vida, pela reforma agrária e pelos direitos humanos.
"Baderna é o que o presidente quer fazer ao impedir o povo de participar de uma festa democrática, ao rasgar a Constituição, ao tentar impedir o direito de ir e vir", afirmou o líder sem terra, em referência aos bloqueios policiais de ônibus com MST.
A seguir, os principais trechos da entrevista concedida pelo presidente FHC, que estava de bermuda e chinelos, ao lado do bangalô em que está hospedado, de frente para o mar, pouco antes de fazer uma caminhada pela praia privativa da ilha de Comandatuba, no litoral sul da Bahia, onde descansa desde quinta-feira à noite.

MANIFESTAÇÕES -
"Elas (as manifestações) são livres. Todo mundo sabe que o Brasil é um país multirracial, cheio de contradições e de ambiguidades e tem a tolerância necessária para essa convivência. Eu pelo menos acho muito bom que haja todo tipo de manifestação, de protestos, também dos excluídos, desde que sejam civilizados. Agora, ofender as pessoas... Eu outro dia vi uma bandeira do Brasil em que tiraram a frase "Ordem e Progresso" e fizeram uma ofensa a mim. Ora, isso não é manifestação, é uma questão de desrespeito ao país, aos demais e à figura do presidente. Acho que passou de tudo que é limite."

OS MANIFESTANTES -
"O acirramento de ânimos é de um setor que, aliás, não acirrou nada, sempre foi assim, que é o MST. Ele às vezes usa a bandeira da CUT, que não sei se é com ou sem a autorização da central. E tem um grupelho chamado PSTU, que às vezes é muito agressivo. Outro dia jogaram uma pedra e, em vez de cair em mim, caiu no presidente da Câmara, Michel Temer. Isso é uma falta de civilidade total, que não tem nada a ver com política no sentido forte da palavra. Tem a ver com visões de pequenos grupos. Eles são um setor radicalizado da sociedade brasileira, só que voltada para o vazio."

SEM-TERRA -
"Eles não me pediram audiência. Quem pediu foram os índios e vou recebê-los. Mas já os recebi. E estão enganados ao afirmar que vão forçar um encontro comigo. Ninguém força um encontro com o presidente da República. Se tivessem pedido... Mas eu não vou entrar nessa, não. De outras vezes que os recebi a conversa foi muito boa. Só que depois eles vão para a rua, dizem outras coisas e só atacam, atacam. E aí, cansa."

VIOLÊNCIA -
"Não diria que parecem atos de guerrilha. Mas em que lugar do mundo já se viu que manifestantes invadem uma Secretaria da Segurança, como aconteceu no Pará? A vida inteira, quando há violência, é o contrário. É na secretaria que se faz a violência, batem nas pessoas, que no passado torturavam. Agora é o oposto? Quer dizer, essa gente tem mentalidade fascista? Claro que isso preocupa. Não é pelo perigo, pois são meia dúzia de gatos pingados, mas é pelo desrespeito aos outros, à democracia, ao país. Em nenhum lugar do mundo isso é aceitável. Esse movimento está descambando totalmente para o lado da baderna."

MÍNIMO -
"Vamos falar um português claro: os R$ 151 representam um aumento real para o salário mínimo. É baixo. Todos os salários no Brasil são baixos. Imagino que até o seu (da repórter que o questionou). Mas salário não se resolve por decreto. Se fosse assim, quem não gostaria de colocar o salário mínimo em R$ 1.000? Eu faria isso na hora. Mas se eu fizer isso, explode a economia do Brasil."

ACM -
"Lógico que nós não vamos discutir acordo nenhum aqui (ACM quer votar a MP do mínimo na próxima quarta-feira). O encaminhamento das coisas é no Congresso. Os líderes é que estão discutindo. São dois anos (ontem) do falecimento do Luís Eduardo. Essa é uma razão que me leva a dar um abraço no senador."


Colaborou a Agência Folha, em Salvador


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