São Paulo, domingo, 22 de abril de 2007

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JANIO DE FREITAS

Brasilidades em geral


O Judiciário sofre o inconveniente de ser visto como um todo: são "os juízes", "os tribunais superiores", em total barafunda que generaliza tudo

A CARNE É FRACA também no Judiciário, mas, ainda assim, é o filé em termos de moralidade funcional no serviço público. Dois fatores fazem as improbidades no Judiciário ferirem mais a indignação pública, embora muito menos disseminadas, do que os casos equivalentes no Executivo e no Legislativo.
Da chamada Justiça sempre se espera a conduta impecável que torne legítima a autoridade de quem julga o alheio. Cá entre nós, nossa expectativa já se dá por satisfeita quando a conduta, no mínimo, corresponde à pose arrogante do que parece ser ampla maioria dos magistrados. Mas pose, muitas vezes, é só proteção do vazio.
Além da expectativa maior que o envolve -e, no fundo, o homenageia-, o Judiciário sofre o inconveniente de ser visto como um todo. Nem mesmo a imprensa cuida das diferenciações, sobretudo nos casos negativos. São desembargadores para lá e para cá, "os juízes", "os tribunais superiores", em total barafunda que generaliza tudo. E debita o malfeito à Justiça ou ao Judiciário em geral. Tanto faz se o assunto refere-se ao Judiciário federal ou estadual (este, muito mais numeroso e, em grande parte, distante das atenções mais acesas ou menos temerosas). Tanto faz qualquer outra distinção. É o Judiciário ou são os juízes, e pronto.
Já os vereadores, deputados estaduais e federais e os senadores são particularizados como tais, transmitindo-se a idéia de que o malfeito foi constatado só em determinada casa legislativa. A Câmara Municipal do Rio ou de São Paulo, o senador, a Assembléia Legislativa da Bahia. Não o Legislativo, simplesmente. Para os governos, então, a particularização burocrática é total.
A imprensa é, antes de tudo, um serviço de autoproteção. Já que falávamos das generalizações, aí vai a palavra "imprensa" com o sentido de jornais, revistas, rádios e TV. Tanto empresas como seus profissionais. Notícia na imprensa contra empresa de imprensa ou gente de imprensa é raridade. Não por escassez factual. Tive, a propósito, o inglório papel de acabar, como editor de um jornal no Rio, com a norma de que os textos de correção do noticiário não podiam citar o nome do jornal autor do erro. Foi uma das atitudes de que um jornalista brasileiro deveria se arrepender muito, mas, no meu caso, os incontáveis arrependimentos nunca foram inteligentes, sempre tiveram e têm outra direção. Uma lástima.
Por ser a imprensa o que é, antes de tudo, o presidente e o primeiro-secretário da Câmara, Arlindo Chinaglia e Osmar Serraglio, não precisam ocupar-se em acobertar privilégios de jornalistas. No momento, esse privilégio que desde 1992 proporciona serviço médico gratuito ao quase meio milhar de jornalistas, e suas famílias, credenciados na Câmara. A solicitação da lista de 1.800 atendimentos em 2006 não "levaria à violação do sigilo médico". Não foi pedida a relação dos motivos de consulta, que poderia justificar o sigilo. O pedido foi só da relação de atendidos, mesmo que em possíveis atendimentos emergenciais justificáveis. Injusto é deixar centenas e, no decorrer de 15 anos, talvez milhares de jornalistas confundidos entre usuários e não-usuários do privilégio.
Outra presença no rol das generalizações é a polícia. Caso quase sempre incontornável, mas nem por isso menos ruim como jornalismo. Nos últimos dias, a Polícia Federal tanto foi generalizada por trabalho admirável como por atitude atrabiliária e covarde de muitos dos seus. Se representantes da PF fizeram acordos salariais com o governo, que não os cumpriu, é violência e covardia despejar o revide sobre a população alheia ao desentendimento e indefesa diante da prepotência policial. Os passageiros em aeroportos, os necessitados de passaportes e muitos outros foram tratados perversamente por policiais federais, nas filas e horas intermináveis. Quem isso impõe não está à altura de servir ao regime democrático. Os direitos de servidores públicos devem ser cobrados sempre, mas a quem ou contra quem os desrespeita.


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