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PT SOB SUSPEITA
Rosângela, filha do empresário que disse ter sido extorquido, narra detalhes do suposto esquema de corrupção em Sto. André
Empresária confirma pagamento de propina
ANDRÉA MICHAEL
ENVIADA ESPECIAL A SANTO ANDRÉ (SP)
Há um ano Rosângela Gabrilli,
46, está à frente dos negócios da
família em Santo André: as empresas de transporte Viação São
José e Expresso Guarará.
Assumiu o lugar do pai, Luiz Alberto Ângelo Gabrilli Filho, 67
anos, que sofreu aneurisma na
aorta e se recupera de um transplante de rim feito há um mês. No
comando, junto com os contratos
em curso, a empresa, segundo
Rosângela, deu continuidade a
pagamentos de propina -R$ 41,8
mil mensais- ao suposto esquema de corrupção montado na
Prefeitura de Santo André. Ela, no
entanto, diz desconhecer o destino da caixinha.
"A gente só ouvia falar que ia
para as campanhas do PT, mas
não posso afirmar isso."
"No final de cada mês, representantes de Ronan [Maria Pinto"
ligavam e diziam que iam passar
para pegar os documentos [o dinheiro" e acertar a hora", disse
Rosângela à Folha ontem.
Integrante do suposto esquema,
conforme conta a empresária,
Klinger Luiz de Oliveira Souza, secretário de Serviços Municipais
de Santo André, pressionava sua
empresa criando exigências em
contratos e até colocando linhas
concorrentes no sistema operado
pela Expresso Guarará. "Isso
aconteceu quando deixamos de
fazer o pagamento por dois meses", afirmou. Abaixo, os principais trechos da entrevista exclusiva de três horas à Folha. A entrevistada solicitou ao jornal que não
fosse fotografada.
Folha - Desde quando a sra. paga
propina em Santo André?
Rosângela Gabrilli - Quero deixar claro que estou falando em
nome da empresa. Não são declarações pessoais. A propina vem
sendo paga desde 1997, por um
acordo firmado entre as empresas
de transporte de Santo André e o
Ronan [Maria Pinto". Ele se colocava como um porta-voz dos empresários para negociações com a
prefeitura. No meu caso -e só
vou falar sobre ele-, pagávamos
em média R$ 41,8 mil, o correspondente a R$ 550 por ônibus
mensalmente.
Folha - Por que a senhora pagava
a caixinha?
Rosângela - Havia um acordo e
as empresas teriam que participar
desse recolhimento. Não sei detalhes disso, apenas mantivemos o
pagamento. Meu pai falará melhor sobre o caso quando estiver
recuperado.
Folha - Como era feito o pagamento?
Rosângela - Sempre em dinheiro. Tinha uma data certa, sempre
o dia 30 de cada mês. O Irineu Nicolino e, depois, o Luiz Marcondes ligavam um dia antes para
marcar a hora. Aí eles diziam que
passariam para pegar o "documento".
Folha - Qual era o destino do dinheiro?
Rosângela - Pelo que sabemos,
era entregue ao Ronan para chegar às mãos do Sérgio Gomes da
Silva. Só conheço o caminho até
aí. A gente só ouvia falar que ia para as campanhas do PT, mas não
posso afirmar isso.
Folha - Há algum indício de que o
dinheiro chegava ao PT?
Rosângela - Só conhecia o caminho até o Sérgio.
Folha - Como a propina era contabilizada?
Rosângela - Não era. E acho que
isso vai aparecer numa auditoria.
Só tínhamos, para uso interno, na
empresa Expresso Nova Santo
André, que não é mais nossa, um
registro informal com anotações.
Relacionávamos o pagamento da
propina como "despesas administrativas". Era uma forma de incluir o pagamento no nosso planejamento mensal de contas e fazer uma previsão de gastos.
Folha - Que negócios suas empresas têm com Ronan Maria Pinto e
Klinger Luiz de Oliveira Souza?
Rosângela - Com o Klinger, nenhum. Com o Ronan, fomos sócios na empresa Expresso Nova
Santo André. A sociedade se desfez formalmente em março de
2001, quando entregamos nossa
participação de 33% à Projeção
Engenharia, empresa que formalmente pertence a Humberto Tarcísio de Castro, mas, pelo que se
diz no meio, ainda é de Ronan.
Nesta época, estávamos pleiteando um segundo aditamento
de um contrato que tínhamos
com a prefeitura para construir e
operar a Expresso Guarará. Queríamos uma prorrogação do prazo para concluir as obras. Investimos R$ 11 milhões no negócio,
quase o dobro do exigido no contrato [R$ 6,5 milhões", e não poderíamos perdê-lo na reta final.
Para conseguir o aditamento, o
Klinger colocou o negócio nos seguintes termos: "acertem com a
Projeção". A Projeção era nossa
sócia na Expresso Guarará. Tinha
30% da empresa. Para assinar o
pedido de aditamento com a gente, o Humberto, dono oficial da
Guarará, queria R$ 4,5 milhões
em dinheiro ou a nossa participação na Expresso Nova Santo André. A Projeção nunca colocou dinheiro na formação da empresa
nem nas obras civis previstas no
contrato com a prefeitura. Perdemos, então, a Nova Santo André.
Folha - Como Sérgio Gomes da
Silva entrou no esquema?
Rosângela - Não sei. Só sei que o
Ronan levava o dinheiro para ele.
Folha - Quais são as relações da
família com o deputado Duílio Pisaneschi (PTB-SP)?
Rosângela - Duílio foi e é sócio
do meu pai em muitos imóveis,
terrenos e em uma empresa de
ônibus de fretamento. Há muitos
anos, ele foi sócio da Viação São
José. Saiu para se dedicar integralmente à política.
Folha - Sua família tem ligações
com o PT?
Rosângela - Não. Nem com o PT
nem com partido nenhum. Nunca nos interessamos por política.
Só temos contratos com a administração, que é do PT.
Folha - Por que a senhora procurou o Ministério Público?
Rosângela - Logo após a morte
do Celso Daniel, começaram a falar em corrupção na prefeitura. E
aí achamos que era a hora de expor o que estávamos passando. A
gota d'água foi a perda da empresa e a debilidade da saúde de meu
pai. Aí, prestamos depoimento.
Folha - Houve represálias?
Rosângela - Não diretamente
-nem telefonemas, nem abordagens na rua, por exemplo. Mas fomos ao Ministério Público em janeiro e em maio. Por decreto municipal, começou uma fiscalização na empresa Expresso Guarará. É isso o que tenho de concreto.
Folha - Como a senhora soube da
morte de Celso Daniel?
Rosângela - Foi o João Francisco
Daniel [irmão de Celso" que me ligou. Ele é muito amigo da família,
principalmente do meu pai. Nunca existiu, como estão dizendo
agora, um vínculo de negócios entre minha família e ele. João Francisco ligou no sábado [17 de janeiro" para avisar do sequestro e, no
domingo, da morte.
Folha - A senhora acredita que foi
mesmo um sequestro comum?
Rosângela - Não vou falar sobre
isso. Isso é com a polícia.
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