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São Paulo, domingo, 22 de junho de 2003

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Entidades favoráveis à paralisação de 8 de julho são na maioria filiadas à central, cujo presidente é contra o movimento

Greve de servidores ameaça rachar a CUT

MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A greve dos funcionários públicos federais, convocada para 8 de julho, ameaça implodir a maior central sindical do país, a CUT, e já começou por dividir a Cnesf (Coordenação Nacional das Entidades de Servidores Federais), entidade responsável pelo comando do movimento que defende a retirada da proposta de reforma da Previdência enviada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Congresso.
Com a Andes (entidade que representa os professores universitários) à frente, a coordenação reúne 11 das entidades de funcionários públicos e representaria, teoricamente, cerca de 800 mil servidores da União. Três dessas entidades -inclusive a mais numerosa, a CNTSS, dos trabalhadores em Seguridade Social- estão contra a greve. A confederação é a entidade da Cnesf com o maior número de ex-dirigentes com cargos no governo Lula.
"Não vamos entrar numa greve nefelibata [que vive nas nuvens]. A greve do dia 8 foi desvirtuada e perdeu o sentido", diz o presidente do Sindilegis, Ezequiel Nascimento, porta-voz dos "dissidentes". Ele acredita que a proposta de greve como foi formulada tem mais objetivos políticos de marcar posição contra o governo Lula do que chances de sucesso.
"Somos contra o fim da aposentadoria integral, o fim da paridade de vencimentos entre ativos e inativos e contra os fundos de pensão, mas não há como imaginar que Lula possa retirar a reforma do Congresso", argumenta. A alternativa, segundo ele, seria negociar mudanças no projeto do governo, a começar pelo cálculo das aposentadorias.
Sem os servidores do Poder Legislativo, os trabalhadores das universidades e em Seguridade Social, a greve teria o apoio dos professores universitários, servidores do Judiciário e fiscais. Detalhe: julho, mês da greve, é também época de recesso dos juízes e de férias nas universidades.
O comando do movimento fala em repetir "a grande greve" de 2001, promovida pela mesma Cnesf. Na época, a greve geral dos servidores por aumento salarial fracassou logo no primeiro dia. Somente os professores universitários levaram à paralisação adiante por outros 98 dias. Parte das concessões feitas pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso só agora começam a sair do papel; o calendário escolar ainda não voltou ao normal.
A proposta votada em assembléia no último dia 14 é de greve por tempo indeterminado. Em carta aos parlamentares, a Cnesf insiste em que não há déficit nas contas da Previdência e diz que a "perniciosa" PEC 40, como é chamada a proposta de emenda constitucional, visa privatizar o sistema de aposentadorias ao gosto do mercado e do FMI.

PSTU
A convocação da greve ganhou destaque durante a semana no site do PSTU, o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado, que lançou José Maria à disputa pelo Planalto no ano passado e agora aposta em atrair os petistas descontentes para crescer e virar referência de esquerda no Brasil.
"Essa reforma é um divisor de águas. Não é possível seguir fiel à nossa classe por dentro do PT, vide os parlamentares ameaçados de expulsão por se contraporem à reforma. Para ficar no PT é preciso abandonar os trabalhadores e colocar-se ao lado dos banqueiros e do acordo com o FMI", diz editorial do PSTU, que tem alguma influência no comando de greve.
A Cnesf não tem diretores fixos. Os representantes das entidades se revezam em sistema de rodízio. Na avaliação dos atuais membros da coordenação, a maioria da cúpula das entidades é integrada por petistas, mas não daqueles ligados à Articulação, tendência majoritária da qual fazem parte muitos integrantes do governo.
"Entre 70% e 80% são petistas, os demais são do PSTU, do PC do B ou independentes", calcula Marcos Raposo, atual representante da Fenajufe (trabalhadores do Judiciário) na Cnesf.
Os petistas do movimento têm um discurso pronto para o descompasso: "Não é o PT, é a cúpula do PT que tem se manifestado assim, quem rompeu com os trabalhadores foi o governo", diz Gilberto Gomes, da Condsef (Confederação dos Trabalhadores do Serviço Público Federal).

"Desdobramentos políticos"
A Cnesf também passou a investir num racha da CUT -em parte, na tentativa de forçar o apoio da central à greve dos servidores do mês que vem.
"Têm havido ruídos, se a direção da CUT mantiver a posição contrária à greve, haverá desdobramentos políticos que não sabemos dizer exatamente quais serão", avalia Antônio Luís de Andrade, representante da Andes. O endereço eletrônico do sindicato dos docentes informa que "uma cisão não está descartada".
Assim como a maioria dos servidores-sindicalistas é petista, a maioria das entidades reunidas na Cnesf é filiada à CUT. O problema é que o presidente da entidade, Luiz Marinho, se opõe à greve. A central tampouco endossa todas as reivindicações dos servidores públicos.
O racha da CUT, se ocorrer, pode tirar da maior central do país uma de suas grandes fontes de receita, "pelo menos 60%", segundo o cálculo de Ezequiel Nascimento, do Sindilegis.



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