São Paulo, quinta-feira, 22 de setembro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Deputado diz que provará inocência

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DO ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BRASÍLIA


Sete meses e seis dias após assumir a presidência da Câmara de forma surpreendente, Severino Cavalcanti (PP-PE), 74, renunciou ontem, às 16h54, ao cargo e a seu mandato de deputado federal.
Dizendo-se vítima de "empobrecimento ilícito" na vida pública e condenado politicamente pela mídia e por aqueles que querem seu lugar, Severino caiu após 19 dias de pressão resultante da acusação de que recebeu propina em 2002 e 2003, quando era primeiro-secretário da Casa.
Assim como sua ascensão, sua queda foi tumultuada. Num discurso lido ainda na cadeira de presidente, o deputado demonstrou estar bastante emocionado e afirmou, em 33 minutos de fala, que caiu porque lutou contra "uma elitezinha", contra "os donos do Congresso", e que provará sua inocência nos tribunais.
No final, antes que alguém pudesse aplaudir, ouviu-se o grito de uma mulher na galeria: "Vai embora, Severino, seu corrupto!" Depois disso, um grupo do outro lado das galerias começou a entoar gritos de ordem contra o pepista. A sessão foi suspensa, a segurança retirou vários manifestantes à força, momento em que Severino aproveitou para se retirar com forte esquema de segurança e sem falar com a imprensa.
"Repito que as acusações contra mim são inconsistentes; [...] são falsas e mentirosas, e vou comprovar isso nos tribunais", disse no discurso, apesar de não apresentar provas de sua inocência.
Ele assim justificou sua renúncia: "Se continuasse como presidente, iria atravancar o funcionamento da Casa. Entre a Casa e o meu sacrifício, eu prefiro ficar com a Casa", disse, em uma das partes em que improvisou.
No texto lido de seis páginas, acusou imprensa e adversários por sua derrocada: "Meus acusadores [...] não me deixaram alternativa: optei, assim, pela renúncia, porque já me sabia condenado de antemão. Minha culpabilidade foi declarada, sem apelação, antes das provas e mesmo do processo, e minha condenação veio antes de qualquer sentença: veio pela imprensa, [...] veio por aqueles interessados em tornar vaga, o mais rapidamente possível, a cadeira do presidente da Câmara".
A renúncia tem o objetivo de evitar a inelegibilidade até 2015 que uma possível cassação acarretaria. Severino promete se candidatar no ano que vem e retornar à Câmara em 2007. Para isso, citou a Bíblia: "Voltarei. Já anunciava o profeta Jó: "O júbilo dos ímpios é breve, e a alegria dos hipócritas, apenas um momento'".
A queda de Severino se deu devido à acusação de Sebastião Buani, dono da rede de restaurantes Fiorella. Ele diz ter pago propina de R$ 40 mil ao pepista em 2002 e um "mensalinho" de R$ 10 mil durante ao menos nove meses de 2003. Severino teria exigido o dinheiro para atender a pleitos de Buani, que até o início de 2004 gerenciava os três restaurantes e seis lanchonetes da Câmara.
Severino sempre negou a história -que possui contradições-, mas a descoberta de que uma de suas funcionárias sacou um cheque de R$ 7.500 de Buani sepultou suas condições políticas de ficar no cargo. A Procuradoria Geral da República possui documento mostrando que a conta do pepista recebeu depósito de R$ 6.810 no mesmo dia do saque, o que contraria a versão de Severino de que o dinheiro foi usado para a campanha de um dos filhos, em Pernambuco. Severino não fez menção nenhuma a isso em sua fala.

Bancarrota
Como um dos indicadores de que não teria recebido propina, enfatizou a afirmação de que sai endividado da vida pública: "O político levou o bem-sucedido comerciante à bancarrota", afirmou, lembrando ter sido comerciante de jóias e ter possuído lojas de eletrodomésticos.
O fato é que o processo de sucessão já havia sido desencadeado antes do anúncio oficial da renúncia. Pelo regimento interno, a Câmara tem cinco sessões para eleger outro presidente. Hoje ocorre reunião de líderes partidários para definir regras da sucessão.
Severino, que foi deputado estadual por 28 anos e estava em seu terceiro mandato federal, assumiu o comando da Casa em 15 de fevereiro após derrotar o candidato do Planalto, Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP). Pela primeira vez, quebrava-se a tradição de a maior bancada -no caso, o PT- assumir o posto. Com a renúncia, o pepista também entra para a história como o primeiro presidente da Câmara a se afastar do cargo. Ibsen Pinheiro (PMDB), que foi cassado em 1994 acusado de envolvimento no esquema dos Anões do Orçamento, já não era presidente da Casa ao perder o mandato. (RANIER BRAGON, FÁBIO ZANINI, CHICO DE GOIS, LUIZ FRANCISCO, SILVIO NAVARRO E ADRIANO CEOLIN)

Texto Anterior: "Mensalinho" derruba o "rei do baixo clero" após 7 meses
Próximo Texto: Buchada de bode é prato principal no "último almoço"
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.