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QUESTÃO NUCLEAR
Conservação de equipamentos importados para a construção da usina custa cerca de R$ 54 milhões por ano
Divergência no governo paralisa o projeto de Angra 3
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A oposição da ministra Dilma
Rousseff (Minas e Energia) à retomada das obras na usina Angra 3
adiou indefinidamente a decisão
do governo Lula sobre os rumos
do programa nuclear brasileiro.
Com as obras paralisadas há
quase dez anos por falta de dinheiro, a terceira usina nuclear
brasileira custa por ano US$ 20
milhões (cerca de R$ 54 milhões
de reais ou quase um terço do AeroLula) aos cofres públicos só para guardar os equipamentos importados durante o regime militar
e evitar que se transformem em
sucata.
Concluir a usina custará mais
US$ 1,8 bilhão (R$ 4,8 bilhões) ao
contribuinte. Desistir dela significará jogar fora outros US$ 750 milhões (R$ 2 bilhões) já investidos
em equipamentos, além de deixar
no meio do caminho os planos de
domínio da tecnologia de energia
nuclear.
A escolha, difícil, foi transferida
no final do governo Fernando
Henrique Cardoso para a gestão
Lula, que marcou data para anúncio da decisão: dezembro do ano
passado.
Em maio, a ministra de Minas e
Energia criou grupo de trabalho
conjunto com os ministérios de
Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia e Planejamento para estudar
a conveniência de retomar as
obras de Angra 3.
A usina é tida como desejável
em todos os cenários traçados pelo governo para o programa nuclear em trabalho coordenado pela equipe do ministro Eduardo
Campos (Ciência e Tecnologia).
Ao final do prazo de 180 dias,
expirado em meados de novembro, o relatório produzido no grupo e favorável à usina por motivos
econômicos -e sobretudo estratégicos- foi desprezado. Foi como se o grupo de trabalho não tivesse existido.
Dias depois, Rousseff sugeriu
que cada pasta listasse pontos positivos e negativos da obra e encaminhasse separadamente as conclusões ao CNPE (Conselho Nacional de Política Energética), que
assessora o presidente da República. A próxima reunião do conselho está prevista para março.
Segundo o ministro José Dirceu
(Casa Civil), integrante do CNPE,
o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva vai tomar uma decisão, mas
já não há data marcada para isso.
Custo
O principal argumento do Ministério de Minas e Energia contrário à Angra 3 é o custo da energia nuclear. Segundo o ministério,
a energia produzida a partir do
urânio enriquecido sai, pelo menos, pelo dobro do preço de produção da energia hidrelétrica.
Em abril, o governo pretende licitar 17 novos projetos de construção de usinas hidrelétricas.
Juntos, poderão representar 2.830
MW a mais no sistema elétrico do
país no final da década, contra
1.350 MW de potência estimada
em Angra 3. A usina ficaria pronta
em cinco anos e meio.
A ministra também investe nas
recém-aprovadas Parcerias Público-Privadas para tentar levar
adiante os planos de construir a
usina hidrelétrica de Belo Monte,
no Pará, que poderá produzir
mais de 7.000 MW. Para atender à
demanda de energia provocada
pelo crescimento econômico, o
país precisa somar cerca de 3.000
MW de energia por ano ao sistema elétrico, segundo estimativa
do ministério.
Estratégico
Principais entusiastas de Angra
3 no governo, os ministérios de
Ciência e Tecnologia e da Defesa
lançam mão de interesses estratégicos para defender a obra -peça
importante do programa nuclear
brasileiro. O programa nasceu na
Marinha, que ainda hoje desenvolve projeto de um submarino
movido a combustível nuclear.
A terceira usina integra os planos de o país dominar a tecnologia nuclear, dos quais fazem parte
a auto-suficiência no enriquecimento de urânio -minério do
qual o Brasil detém uma das
maiores reservas do mundo e que,
em estado bruto, é a base do combustível nuclear.
Um passo importante no caminho da auto-suficiência será dado
em breve, com a inauguração da
primeira fábrica brasileira de
enriquecimento de urânio, em
Resende, no Rio de Janeiro. O
funcionamento da unidade obteve o aval da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) em
novembro.
O primeiro módulo da fábrica
deve começar a funcionar em
agosto. Nesse módulo, as Indústrias Nucleares do Brasil poderão
enriquecer uma primeira parcela
(menos de 15%) do urânio que
alimenta as usinas de Angra 1 e 2.
Interessada na construção de
Angra 3, a multinacional francesa
Areva mandará no mês que vem
sua presidente, Anne Lauvergeon.
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