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REGIME MILITAR
Para brasilianista, que está no país, a linha dura do segundo presidente do período durou ao menos dez anos
Costa e Silva simboliza ditadura, diz Skidmore
MURILO FIUZA DE MELO
DA SUCURSAL DO RIO
Se a ditadura militar brasileira
tivesse um rosto, seria o do general e ex-presidente Arthur da Costa e Silva, segundo o historiador e
brasilianista Thomas Skidmore,
71, professor de Estudos Brasileiros da Brown University (EUA).
De acordo com ele, Costa e Silva
foi o símbolo da chamada linha
dura, que derrotou os aliados do
primeiro presidente do regime,
Humberto Castello Branco, que
pretendia devolver o país aos civis
em 1965. Em seu governo, de 1967
a 1969, Costa e Silva decretou a
principal peça do arcabouço institucional da ditadura, o AI-5 (Ato
Institucional nš 5), e possibilitou
que suas idéias alimentassem os
militares golpistas por 21 anos.
Skidmore é autor de "Brasil: de
Castello a Tancredo (1964-1985)",
clássico da historiografia do período, e chegou ao Rio ontem para participar de seminário sobre o
golpe de 64, no Centro Cultural
Banco do Brasil. Ele falou à Folha,
por telefone, de Providence.
Folha - Como o sr. avalia o golpe?
Thomas Skidmore - A necessidade maior na época era fazer um
plano de estabilização, e o governo Castello Branco [1964-1967]
conseguiu isso. No governo de
Costa e Silva, os militares também
conseguiram um crescimento
[econômico] muito grande, mas
infelizmente parou por aí. Foi curioso Castello Branco ter sido eleito presidente naquela época de
crise. Era um homem extremamente correto, mas ingênuo.
Achava que poderia entregar o
governo aos civis em 1965. Isso
não foi possível porque havia a linha dura comandada por Costa e
Silva. O grande problema do regime foi a luta entre castellistas e a
linha dura, que começou já no governo de Castello, que tinha Costa
e Silva como ministro da Guerra.
Folha - A marca da ditadura foi
impressa por Costa e Silva?
Skidmore - Castello perdeu em
65. A linha dura fez uma pressão
muito grande sobre o governo e
tomou conta do regime, com a
eleição de Costa e Silva. Esse grupo ficou no poder até, pelo menos, 1977. Quem barrou os militares radicais foi o presidente [Ernesto] Geisel, assessor do Castello
que se colocou contra a eleição de
Costa e Silva. Geisel teve que usar
a força para controlar a linha dura
e iniciar o processo de abertura.
Folha - O historiador Celso Castro
defende a tese de que, na época do
golpe, os militares estavam desarticulados. O sr. concorda?
Skidmore - Concordo. Na época,
as Forças Armas estavam muito
divididas. Castello sabia, por isso
queria entregar logo o governo
aos civis. A divisão nas Forças Armadas permaneceu com a tomada do poder, foi levada para dentro do regime e o minou. O problema é que esses generais perseguiam, desde o princípio, a unidade que só ocorreria no governo
Geisel, com a derrota da linha dura. Geisel permeou todo o regime
e continuou leal aos ideais de Castello Branco. Ele iniciou o processo de retomada da democracia.
Folha - Se havia divisão nas Forças Armadas, por que o presidente
João Goulart caiu tão facilmente?
Skidmore - Havia uma conspiração de caráter continental contra
Jango. Após o levante em Juiz de
Fora, houve certa coordenação de
tropas militares em todo o país.
Jango se recusou a pegar em armas para resistir. Acho que faltou
a ele certo sentimento de bravura.
Não quis lutar, ficou apático.
Folha - Quando o sr. fala em conspiração continental, está se referindo ao apoio dos EUA ao golpe?
Skidmore - Estou mais ou menos
de acordo com o Lincoln Gordon
[embaixador americano no Brasil
na época do golpe]. Houve uma
sinalização muito clara dos EUA
para os conspiradores. Havia uma
pressão forte americana, mas não
no sentido de uma intervenção.
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