São Paulo, sexta-feira, 23 de abril de 2004

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CAMPO MINADO

Líder do movimento diz que "abril vermelho" foi impressionante e que governo sabe que, sem pressão, não há mudanças

Stedile afirma que há "impaciência" no MST

EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Idealizador do "abril vermelho", rotulado por ele como uma mobilização "impressionante", o economista João Pedro Stedile, 50, da coordenação nacional do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), afirmou ontem que o movimento vai prosseguir "impacientemente" com as suas ações pelo país.
"Não muda nada [após o "abril vermelho']. Nossa missão como movimento social é seguir impacientemente para conscientizar os pobres do campo, organizá-los e mobilizá-los para ter força social suficiente para que haja mudanças de forma mais rápida."
No início da semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva aproveitou seu programa quinzenal de rádio para cobrar responsabilidade dos movimentos sociais e pedir que evitem a radicalização das manifestações.
"Quem quiser fazer suas manifestações, este é um país democrático, é um país livre, as pessoas podem fazer. O que as pessoas não podem é perder o senso de responsabilidade", disse Lula.
Stedile fez um balanço da atuação do movimento, ocorrida entre a última semana de março e o dia 19 deste mês, data em que completou oito anos do massacre de Eldorado do Carajás (PA), quando 19 sem-terra foram mortos por policiais militares durante a desobstrução de uma estrada. A maioria das ações ocorreu por meio de invasões de terra.
"A mobilização social que houve durante todo mês de abril [...] foi impressionante e refletiu o que nós já vínhamos sentindo na base havia algum tempo", afirmou o líder sem-terra. Segundo Stedile, a "herança" do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e a continuidade do modelo econômico na gestão Lula obrigam os movimentos a se "mexer".
"Nós recebemos uma herança perversa de acúmulo de problemas sociais durante oito anos e, agora, com a continuidade da política econômica, os trabalhadores e os pobres estão percebendo que, se não se mexerem, não haverá mudanças." As invasões de propriedades rurais, segundo ele, não são para exigir determinada área de "qualquer maneira", e sim para que "o governo se mexa e faça as desapropriações".
Há um acordo com o Planalto, disse Stedile: o governo assenta 400 mil famílias até 2006, e o MST organiza essa quantidade de pessoas nos acampamentos. "Sem os pobres do campo organizados, não há nenhuma possibilidade de se fazer a reforma agrária."
Até dezembro o governo promete assentar 115 mil famílias, sendo 47 mil delas até junho. No primeiro trimestre, o Ministério do Desenvolvimento Agrário afirma ter assentado cerca de 11 mil famílias. No ano passado, Lula prometeu 60 mil, mas só assentou 36 mil, de acordo com a pasta.
Stedile afirma que o governo tem ciência de que, sem as mobilizações, "não terá força" para promover as mudanças. "Será sempre refém da vontade das elites." Para ele, a "classe dominante" e a imprensa em geral utilizaram a "jornada de lutas" para "criminalizar" os movimentos sociais.


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